Ministério da Cultura, Bradesco e Museu de Arte Moderna de São Paulo apresentam.
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GEORGE LOVE: ALÉM DO TEMPO.
Curadoria: Zé De Boni
George Love: além do tempo inicia a grade de exposições de 2024 do MAM São Paulo. Trata-se de uma mostra retrospectiva de um dos protagonistas da história da fotografia no século XX. A exposição reúne um conjunto significativo de obras do artista, que teve papel relevante no grupo nova-iorquino Association of Heliographers. A associação foi decisiva para a fotografia colorida experimental e de vanguarda no início dos anos 1960. George Love, juntamente com os Heliographers, contribuiu para a consolidação da fotografia autoral e para a sua libertação como representação fiel e literal da realidade.
Afro-americano nascido em Charlotte, Carolina do Norte, Estados Unidos, em 1937, George Love chegou ao Brasil em 1966. Ao lado de sua então companheira, Claudia Andujar, Elizabeth Machado fez viagens pela Amazônia. Ambos realizaram ensaios para a revista Realidade em 1971 e lançaram o livro Amazônia, em 1978. Enquanto Claudia Andujar ficou conhecida pelo trabalho com os Yanomami, George Love se destacou pelas fotografias aéreas num período em que isso não era tão comum.
Com curadoria do pesquisador e também fotógrafo Zé De Boni, a exposição apresenta uma seleção ampla da trajetória do artista, abrangendo não apenas imagens da Amazônia, mas também ensaios fotográficos feitos em São Paulo e no Rio de Janeiro, iniciativas editoriais experimentais e trabalhos comerciais, como a série sobre a construção da Usina de Itaipu. George Love: além do tempo é a primeira grande exposição sobre o artista e lança luz em um trabalho ainda pouco visto, mas cultuado pelos amantes da fotografia. O presente catálogo traz, além de textos do curador, passagens dos diários, cartas e depoimentos do artista, ampliando a compreensão de sua obra e de seu pensamento sobre fotografia.
O MAM São Paulo, que possui um dos acervos de fotografia mais relevantes do país, contribui assim para a difusão da fotografia, em especial de um recorte pouco estudado: a atuação marcante de George Love desde a fase experimental até seu período mais maduro, próximo ao seu falecimento precoce, em São Paulo, em 1995. Em uma época em que a crise climática está cada vez mais evidente, a mostra George Love: além do tempo chama atenção para o olhar visionário e ainda atual do artista, assim como para a diversidade e para questões ambientais urgentes.
Elizabeth Machado
Presidente da Diretoria do Museu de Arte Moderna de São Paulo.
Cauê Alves
Curador-Chefe do Museu de Arte Moderna de São Paulo.
Zé De Boni
Curador.
No despertar da cultura fotográfica brasileira na segunda metade do século XX, um nome figura entre as maiores referências: George Love. Artista carismático, ele sempre foi cercado por uma aura de mistério, que beirava a lenda, de tão conhecido quanto enigmático que era, pelo tanto que ele foi exposto e como ficou escondido.
Atuando em uma era de efervescência intelectual, de questionamento comportamental e de transição de costumes, George exibia um intenso brilho em suas realizações, na interação profissional e no convívio particular. A luz que trazia ao ambiente extravasava paredes e repercutia na atmosfera e nas pessoas, que vislumbravam as infinitas possibilidades de um marcante meio de expressão.
Suas ações no meio cultural, editorial e corporativo expandiam os horizontes da fotografia, abrindo caminhos adiante do seu tempo. Conscientemente ou não, gerações de fotógrafos brasileiros seguem sua inspiração e seu modelo, que se realça entre as raízes de nossa contemporaneidade.
Chamá-lo de gênio também não é hipérbole. George Leary Love nasceu em 24 de maio de 1937, em Charlotte, Carolina do Norte, Estados Unidos. Negro, filho único em uma família simples e culta, concluiu seus primeiros estudos superiores antes dos 20 anos. Adotou a câmera fotográfica também cedo, vislumbrando a possibilidade profissional no segmento de fotografia de viagem, representado por arquivos de imagens, um mercado importante na época, com o qual se manteria ligado por toda sua vida profissional.
Fixando-se em Nova York para mais estudos, logo passou a se dedicar à fotografia como criação autoral, tendo suas primeiras mostras em galerias de Manhattan, dando cursos e palestras. Assim, foi aceito como um dos mais jovens participantes da Association of Heliographers, um grupo restrito de expoentes da fotografia americana que promovia a arte, propunha sua expansão e inovava no uso de impressões coloridas no meio expositivo. George Love se identificava com a proposta, de forma que o ideário dessa associação é chave importante para compreender a obra que desenvolveu por toda a sua vida.
Em pouco tempo, o jovem fotógrafo se tornou vice-presidente e coordenador da galeria da associação. Foram dois anos intensos, entre 1963 e o fim de 1965, até o encerramento da entidade, por carência de recursos.
A perspectiva de um novo rumo lhe foi oferecida por uma rara heliógrafa estrangeira, que o estimulou a se aventurar pelo continente sul-americano. Em janeiro de 1966, George juntou-se a Claudia Andujar em Belém para uma inusitada expedição no interior da Amazônia, verdadeira epopeia até a terra dos Xikrin. Voltaram para Belém, subiram pelo rio até Iquitos, depois Lima e Bolívia, e entraram de volta no Brasil pelo famoso “trem da morte”. Fixaram-se em São Paulo, no apartamento da Avenida Paulista, casaram-se… e, então, o resto é história.
O primeiro grande impacto da presença de George Love no Brasil foi a sensação que ele causou no início de 1967, quando suas fotografias começaram a aparecer em reportagens e ensaios nas publicações da Editora Abril. Entrou no jornalismo com carta branca de Roberto Civita e apoio de editores como Mino Carta para tratar, de forma criativa, assuntos corriqueiros. Eclético e altamente adaptável, inteligente e perspicaz para incorporar a modernidade na ilustração visual, retratou moda e costumes, automobilismo e viagem para publicações como Claudia e 4 Rodas.
George e Claudia eram destaque na revista Realidade, aclamada como um capítulo marcante do jornalismo brasileiro. O sucesso crescente explodiu com o número especial sobre a Amazônia, em outubro de 1971. Amplificados pela transcendência das imagens de uma região ainda mal conhecida, os mitos se consolidaram. O termo então se aplicava aos três: à própria revista Realidade, a Claudia Andujar com os Yanomami e a George Love com a deslumbrante visão aérea da paisagem amazônica.
Essa trajetória em ascensão impulsionou George para outras órbitas. Desligou-se da Editora Abril na sequência, mas ainda persistiu no jornalismo pela também incomum revista Bondinho, do Grupo Pão de Açúcar, com trabalhos memoráveis. Porém, sua passagem foi rápida, como em Novidades Fotoptica. Naquela publicação de Thomaz Farkas, ele se dedicou a promover a arte fotográfica e o ensino da técnica, em continuidade ao que introduzira em Realidade.
Profissionalmente, mudou para o mercado corporativo, que lhe propiciou melhor rendimento econômico, e empregou toda a sua experiência em fotografia aérea e audiovisual para empresas de energia elétrica e tecnologia. Com a receptividade de clientes que reconheceram suas virtudes criativas, como Mário Chamie pela Olivetti, abriu caminho para uma produção visual fora das convenções publicitárias, incorporando a proposta exercida entre seus antigos colegas de Nova York. Entre os 42 fotógrafos que passaram pela 865 Lexington Ave., nenhum levou o conceito tão intensamente no campo comercial quanto George Love, que, por essa fase, pode ser definido como Heliógrafo Corporativo.
Os recursos que colhia da área comercial reinvestia em sua pesquisa e seus projetos fotográficos pessoais, fundamentalmente na continuidade do trabalho na região amazônica, para onde retornaria diversas vezes, sempre explorando uma visão espacial. Sua dedicação à promoção da cultura visual e ao ensino de fotografia encontrou amparo na figura de Pietro Maria Bardi, que abriu o Museu de Arte de São Paulo para o casal. No MASP, que teve atenção à fotografia desde seu início, mas não tinha um departamento de fotografia, Claudia Andujar e George Love instalaram o Laboratório de Fotografia, onde o termo laboratório se referia não à sala de revelação, mas ao trabalho de formação de talentos e de incentivo ao uso do meio. Marcaram época. O museu se tornou um endereço relevante no emergente cenário da fotografia paulistana.
Exposições individuais, coletivas, internacionais, cursos e eventos de vanguarda foram conduzidos pelos dois, que também usaram a oportunidade para exibir as próprias obras em várias mostras e projeções. Foi assim, em dupla, por toda a década de 1970, mas na metade dela o casal já havia se separado.
O respeito mútuo se manteve, como também o grande projeto em comum, gestado por vários anos. A partir de milhares de imagens da paisagem aérea feitas por George e do extenso período vivido por Claudia entre os Yanomami, em 1978 eles publicaram o livro de fotografias Amazônia. Nele, como um coletivo, os autores não sentiram necessidade de identificação individual, talvez até porque esperassem que isso fosse automático, bastando apenas conhecer um mínimo dos dois. Com apoio de seu cliente comercial, o grupo Sharp de Matias Machline, projeto de Wesley Duke Lee, impressão sofisticada da gráfica do célebre Regastein Rocha e acabamento luxuoso para a época, a seleção de imagens, a paginação e o tratamento gráfico tinham forte conotação pessoal, com as marcantes pontas de filme instigando a interpretação do leitor.
Apenas mais tarde, em entrevistas particulares, George revelou a mensagem que esse recurso continha. Censurado, com circulação proibida (apenas uma fração do previsto foi distribuída informalmente e sem publicidade), o livro tornou-se raridade instantânea. Mas, diferentemente do que acontece com a maioria das criações humanas, a repercussão da obra só aumentou desde então, como mais um autêntico mito. Amazônia é aclamado como um dos mais marcantes livros autorais de fotografia de todos os tempos.
Em 1980, George Love se afastou do tema amazônico. Havia um nítido trauma devido ao episódio do livro e um notável distanciamento de Claudia. Seu foco mudou para a compilação de um inventário visual de São Paulo, coletado desde sua instalação na cidade. Apresentou-o na exposição individual Diários e na edição São Paulo – Anotações. O livro pessoal fazia par com São Paulo – Registros, uma coletânea de fotos antigas da cidade, organizada pelo próprio George.
Aqui está o texto revisado, com a formatação ajustada e mantendo exatamente o mesmo conteúdo do texto original:
Ambos foram lançados pela recém-criada Eletropaulo, sob o comando de Lucas Garcez, que também confiou a George a documentação dos últimos dias de Sete Quedas e a construção da Usina de Itaipu.
Sua vida particular após o divórcio foi marcada por envolvimentos fugazes, com atitudes de autoproteção, refratária ao apego mais profundo. Seria fútil entrar no campo da vida sentimental do fotógrafo se ele não tivesse deixado uma evidente mostra de paixão e êxtase registrada em imagens de seu idílio no refúgio em Sarapuí com Rosilis. Mais do que momentos íntimos, o legado dá outra pista para entender a natureza de seu trabalho, egocêntrica – como ele próprio afirmava, pois como se explicaria usar imagens tomadas a tanta distância para figurarem em destaque no trabalho sobre São Paulo? Ao incluir fotografias de assuntos díspares, até mesmo a construção de hidrelétricas, a interpretação que ele próprio fornecia era entender o autor como elo, condutor da obra, assumindo toda a circunstância de sua experiência pessoal.
Como contraste, o conflito pessoal com a cidade opressora mereceu de George uma instalação com projeção no MASP intitulada Ilustrações para os Diários de Kafka, com tônica evidentemente depressiva. Sua inquietação e saúde instável o levaram, na sequência, à opção de mudança para o Rio de Janeiro, onde ficou por um ano e meio. Fotografava a cidade usando a receita do que fizera em Sampa, os mesmos recursos em um universo distinto. Percebe-se nitidamente que era seu plano dar ao trabalho uma relevância equivalente ao que conseguiu com Anotações. Com pouco tempo para maturar, essas impressões permaneceram inéditas.
Retornou para São Paulo sem resolver seu estado de saúde. Retomou o tema que o projetou, produzindo um livro de tiragem limitada para a Pancrom, que representava sua própria identidade visual: Service Order 8696 – The Amazon Basin from the Air. A obra trazia 26 imagens e tinha um sentido místico, resultando em mais um enigma cuja interpretação é guiada pela noção do autorretrato.
George Love ainda teve condição de expor mais uma vez, em 1985, suas Vistas do Alto antes de se retirar para o exílio em seu país natal. Na verdade, ele voltou para Nova York deprimido, desestruturado profissionalmente. Continuou o declínio de sua saúde, que ele se recusou a encarar. Mesmo assim, permaneceu explorando fotograficamente seu mundo com o mesmo brilho de seus melhores momentos. Teve o acolhimento de Barbara, mas vivia um ostracismo angustiante. Faltavam-lhe os interlocutores, que propiciavam espaço para ele desempenhar seu dom sedutor de mestre e mago da imagem. Ele ainda reagiu, retornando ao cenário paulista, onde tentou reativar contatos e reverter a década perdida, mas se viu soterrado pelas ideias e navegando em um deserto de possibilidades. Inevitavelmente, sua saúde chegou a um ponto crítico.
Lutou pela realização de um novo livro, mais um testamento amazônico, que dessa vez seria seu ato final. Ainda contou com o belo gesto de Cida Fontana, apoiadora de seus grandes momentos. Mas, aos 58 anos, não resistiu para cuidar desse trabalho e vê-lo impresso. Restou sua Alma e Luz e toda sua obra além do tempo.
Natural de um estado sulista dos Estados Unidos, George Leary Love passou sua juventude bem próximo dos epicentros segregacionistas. Muito cedo, foi estudar na Atlanta University e já chegou ciente da luta pela integração, pelas histórias narradas por sua mãe sobre a participação heróica de um ancestral distante. Afastou-se desse contexto entre 1958 e 1960 e seguiu com a família para a Indonésia, onde seu pai servia na embaixada. Começou a fotografar nesse ambiente de viagens. Na volta, fixou-se em Nova York para mais estudos e participou do Student Non Violent Coordinating Committee (SNCC), importante movimento pelos direitos civis. Curiosamente, seu arquivo não traz exemplos dessa militância. E, em toda a sua trajetória, ele quase não tocou no tema; é raro encontrar material relevante em sua obra.
O sul dos EUA, anos 1960
O calor, o ar denso, estático – a violência.
A loucura da violência, embutida nas almas imóveis,
nos gestos tensos, pronta para explodir em
instantes de desespero. A agressão é real.
O ato de morte paira permanentemente no ar.
Não existe o orgulho pela raça. Foi aniquilado pelo
ódio entre raças. Não há amor pela vida, apenas a
preocupação com a morte. A estagnação da vontade,
o marasmo, a monotonia. A espera da explosão
do sexo, do êxtase religioso, da violência, sempre.
O sul dos EUA, anos 1970
A lembrança do perfil sofrido, a purificação
do ódio nas muitas mortes. Existe algo que
se espera, indefinido e imensurável.
De mim e minha mãe com muito amor
para o meu pai.¹
Esse texto de George Love mostra um lado escondido, como tantos outros, de sua personalidade. O ensaio fotográfico Uma Raga para o Crepúsculo, revista Iris, novembro de 1979, foi uma rara oportunidade em que George Love se referiu diretamente à questão racial e ao seu ambiente natal. As palavras eram mais fortes do que as próprias imagens, coisa inusitada em toda a sua obra, pois a parte visual guardava um tímido distanciamento dos dramas sociais traumáticos. Boa parte das fotografias era de uma viagem ao estado do Mississippi em 1965, que ele rotulava de Deep South, cujos contatos mostram fórmulas comuns e um George dispersivo. A seleção servia-se também de outras fontes, como o céu de um lugar, uma arma de outro, a própria mãe em turismo e o túmulo de seu pai, que não viveu uma fração do problema que muitos outros sabidamente sofreram.
Apesar de todo seu talento, esse bloqueio aconteceu ao fotografar o Harlem para documentação jornalística em plena época da luta pelos direitos civis. Sob o escudo de suas lentes longas, ele mal se aproximava das pessoas e pouco interagia, contrastando com o exemplo de mestres com quem conviveu.
Em um fotógrafo que demonstrava tanta segurança e altivez, essa limitação parece paradoxal. Mas é coerente com suas palavras, pois ele se definia como um autor focado fundamentalmente em si. Pode-se interpretar que, em seu lamento no entardecer, George Love valia-se de uma questão social para remeter a uma cicatriz interior.
George Love aos 8 anos, 1945.
Abertura do ensaio da revista Iris, novembro de 1979.
¹ LOVE, George. Uma Raga para o Crepúsculo, revista Iris, novembro de 1979, p. 14 a 29.
Nova York, início dos anos 1960. Uma parede amarela e um portão vermelho. Foi o chamado que conduziu George Love à adoção definitiva da fotografia. Logo ele estava expondo trabalhos em cores, novidade no circuito, e dando palestras no coração de Manhattan. Em meados de 1963, juntou-se a destacados nomes da fotografia americana na recém-criada Association of Heliographers. Tornou-se vice-presidente e coordenador da galeria no mesmo ano. Conviveu com Scott Hyde e Syl Labrot, suas referências nas propostas visuais, e adotou definitivamente o ideário do grupo, que pregava a fotografia como uma nova realidade além da representação formal do objeto. Com a dissolução da associação, ao final de 1965, George partiu para novos voos, incentivado por uma colega heliógrafa, Claudia Andujar.
George Love chegou à Indonésia aos 20 anos, já formado na universidade. Era a época em que ele começava a usar a fotografia para colecionar memórias das viagens que fazia pelo país, pelos vizinhos e pela Europa. Ele contava sobre o momento da sua primeira fotografia, de tapumes em Roma, como uma autêntica conversão ao uso da expressão visual. E citava em seu currículo a importância de ter fotografado o templo de Borobudur, no coração de Java, um feito mais significativo na sua memória do que os slides conservados transmitem.
Quando ele chegou de volta aos Estados Unidos, fixou-se em Nova York a fim de estudar filosofia da arte na The New School for Social Research. Dessa fase, guardou duas cartas de seu pai, em fim de vida, preocupado com as escolhas do filho e com a administração de seus recursos limitados.²
Ali, George Love teve sua segunda epifania, a das cores da Kodak, momento em que tomou a fotografia seriamente como instrumento pessoal. A importância desse evento é notada pelo carinho com que conservou aquelas imagens e seus primeiros estudos de percepção abstrata, que ele revia até seus últimos dias.
Foto da série exposta na coletiva da Association of Heliographers, Nova York, 1964.
Imagem citada por George Love como símbolo da sua conversão à fotografia, ca. 1962.
Seu caminho profissional iniciou-se com as mesmas fotos de viagem, que eram uma categoria importante nos bancos de imagem. Muitos cromos de suas experiências anteriores trazem na moldura os carimbos de Rapho Guillumette e Photo Researches Inc. Abasteceu esses distribuidores por um bom tempo, concentrando seus arquivos depois no Kay Reese & Associates. Empreendeu mais viagens e, curiosamente, veio ao Brasil em 1962, parando em Belém, Brasília e Rio de Janeiro, depois de passar pelo Suriname, captando imagens do exotismo para os olhos dos grandes centros. Outros trabalhos em preto e branco daquele período sugerem um contexto comercial, mas não há referência à motivação do conjunto mais significativo, o belo ensaio documental sobre a Vermont Railway.
Em 1962, o nome George Love figurava em convites de exposições coletivas e individuais. Notas de imprensa mostram que ele estava ativo no circuito nova-iorquino quando, no segundo semestre de 1963, se tornou membro da Association of Heliographers. Muito pouco foi publicado sobre essa associação e a importância que teve na consolidação de grandes nomes da fotografia americana. George a mencionava sempre com muito orgulho pela posição que ocupou e principalmente por ter convivido com personalidades como Harry Calahan, W. Eugene Smith e Walter Chappell, que foi o criador do grupo. Era uma cooperativa que tinha sede em local nobre do Upper East Side, onde mantinha um arquivo de imagens e apresentava exposições de seus membros em sua galeria pioneira. Anualmente, realizava grandes coletivas no distinto ambiente da Lever House e figurava com grande frequência na página do crítico de fotografia do New York Times, que destacava sua vanguarda na introdução de fotografias coloridas no mercado de arte.
A associação começou com sete fotógrafos, e, em sua apresentação, Chappell formulava a diretriz que o grupo seguia, ao propor uma fotografia liberta da missão de representação fiel do objeto fotografado.
“Uma HELIOGRAFIA não é apenas o produto do sol externo, visível, mas também do sol interno do fotógrafo, manifestado através da interação entre a máquina e a visão humana. A partir das suas experiências e ideias, os heliógrafos buscam criar propostas que transcendem o mero registro literal de uma cena ou um evento.”³
Era uma justificativa ou ode à abstração, derivada de sua concepção muito particular, expressa previamente no livro Under the Sun, que dividiu com dois futuros heliógrafos.
“… as abstrações capturadas pela câmera fotográfica representam a fusão de dois mundos: o invisível e o visível. Elas são o produto do encontro entre a mente humana e as imagens correlatas da natureza.”⁴
Esse contraponto à fotografia documental é evidente no trabalho de muitos dos associados, e pode-se notar sua marca indelével em toda a obra subsequente de George Love. O princípio se dissipou na associação conforme a rotatividade dos membros, como Chappell se lamentou no artigo de anos depois. Ele relacionou 42 integrantes em sua memória ao longo dos dois anos e meio, mas em nenhum momento o grupo ultrapassou 20 participantes. O próprio mentor mudou-se da cidade nos primeiros meses e deixou a administração do sofisticado espaço, que tinha conseguido por favor de um amigo, nas mãos de membros que não tinham participado da gestação e gestão originais. George Love logo se tornou vice-presidente e administrador da galeria. Juntamente com Scott Hyde, presidente, mantiveram uma atividade pujante, como aparece no arquivo do jornal.⁵
O dinamismo da Association of Heliographers durou até o fim de 1965. George guardou poucos documentos daquela época, que estão hoje na biblioteca da University of North Carolina at Charlotte (UNCC). Em um papel improvisado está a distribuição de vendas de fotografias no ano de 1964. Outras cartas se referem a cobranças de dívidas da entidade, enquanto um comunicado do presidente traçava planos para 1966. Mas, naquele janeiro, a associação se extinguiu, George sumiu de Nova York e se embrenhou pelos interiores da América do Sul.
As exposições coletivas na Lever House foram mantidas anualmente, e é sobre uma delas que aparece uma menção elogiosa do crítico a George, Hyde e Syl Labrot,⁶ justamente os dois colegas que mais o influenciaram⁷ e com quem compartilhou ideias e afinidades visuais por muito tempo depois de se separarem.
² Cartas de George Bishop Love, sem data (ca. 1960), e de 16 de junho de 1961 (dias antes de morrer). Coleção George Love.
³ The Association of Heliographers, catálogo Heliography, Nova York, 1963.
⁴ Entre 1963 e 1965, os Heliographers ou George Love individualmente aparecem em mais de 40 artigos do crítico Jacob Deschin no The New York Times.
⁵CHAPPELL, Walter. “The arising, manifestation, and eventual eclipse of the Association of Heliographers 1960-65”. Revista History of Photography, Nova York, 2000. 24:2. P. 180-182. LABROT, Syl; CHAPPELL, Walter; LYONS, Nathan; BRAZILLER, George. Under the Sun – The Abstract Art of Camera Vision, Inc., Nova York, 1960.
⁶ Jacob Deschin comentou assim: “George Love tem amostras de suas impressões coloridas em uma variedade de assuntos e tratamentos; o monocromo azul é uma ousadia, e suas imagens de janelas à noite sugerem um novo rumo para ele”. The New York Times. “Camera Notes: Heliographers in top photography display”, 26 de julho de 1964 [p. 15].
⁷“Love, a fotografia com amor”, Folha de S.Paulo, 1º caderno, 31 de janeiro de 1971.
Em janeiro de 1966, George Love chegou ao encontro de Claudia Andujar em Belém. Rumaram ao coração do Pará para documentar indígenas isolados. Encontraram a comunidade Xikrin em transformação, conduzida à atividade mercantil por um missionário que abria uma pista de pouso. George fez poucos retratos e cenas, concentrando-se em colher sons para oferecer a instituições. Sua revelação maior ficou guardada em um diário, no qual registrou, com percepção de forasteiro, a epopeia para vencer as corredeiras do Rio Itacaiúnas, a vida na aldeia e o preparo da sua carga de objetos indígenas que exportaria desde o Peru. Ali ele acompanhou os trabalhos arqueológicos nas ruínas de Pajatén, que o marcaram para sempre. Passaram pela Bolívia e, após cerca de seis meses, começaram a dividir projetos e residência em São Paulo.
Uma carta de Claudia Andujar de 1965 sugere que sua adesão à Association of Heliographers foi tardia e que foi lá que conheceu George Love⁸. Desconhece-se a origem de seus planos em comum, como também quando Claudia conheceu Rose, mãe de George, mas é a ela que se dirigiu no Natal daquele ano. Seu breve cartão mostra que já havia um envolvimento sentimental e que a viagem dele ao Deep South era recente. Apesar da sugestão de que os dois trocavam cartas, um recado que pedia para ser transmitido a George mostra que ela buscava estimulá-lo em uma fase de indecisão: “Diga a ele que acho que ainda tem muito a oferecer e a fazer que lhe trará felicidade e recompensa⁹”.
Mais experiente, Claudia chamara George para um projeto de viagem pela América do Sul. George deu alguns detalhes dessa viagem em entrevista:
Eu cheguei ao Brasil… no dia 16 de janeiro de 1966. Então eu estive com a Claudia, e nós fomos viajando pela Amazônia de janeiro até maio. Em maio a gente entrou no Peru, Bolívia, e acabamos voltando ao Brasil através de Corumbá.
Eu cheguei sem nada!… na noite anterior à minha saída, o apartamento foi limpo. Me restaram… 4 ou 40, não sei quantos dólares, uma velha máquina Exakta, uma lente de 40 mm Mikro Kilar, praticamente nenhum filme, uma máquina de gravação Uher 4000 Reporter, que era o velho cavalo de guerra dos repórteres.
Às vezes usava a máquina da Claudia… Basicamente, eu gravei som. Gravei muito som dos índios Xikrin, que a gente visitou, e aquelas gravações estão comigo até hoje ainda¹⁰.
George Love seguia a pé por trilha enquanto o barco vencia mais uma corredeira, 1966.
Claudia Andujar com criança Xikrin, 1966.
Caderno de anotações da viagem ao território Xikrin: George Love, an important American, 1966.
O objetivo principal eram comunidades nativas em locais remotos, que poderiam ser de interesse de publicações, especialmente do exterior. Claudia combinou o encontro em Belém e lá o esperou com apreensão por dez dias, já com todos os planos meticulosamente agendados. O primeiro destino era o território dos Xikrin, no interior do Pará, seguindo a orientação de um pesquisador suíço que estaria na aldeia por período limitado. Para chegar lá, teriam que sair de Marabá em um pequeno barco particular, com data já marcada. Com todos os tropeços pelo atraso do visto consular, George chegou no finzinho de janeiro, a tempo até de ter a experiência de um baile de Carnaval no Círculo Militar de Marabá. Partiram de lá no dia 3 de fevereiro.
Os documentos que ele guardou dão mais precisão e detalhes a essa história. Em seu precioso diário de viagem, ele narrou a dramática epopeia de dez dias para subir um rio com muitas corredeiras em fase de cheia. Na capa do caderno, lê-se George Love – An Important American, o que pode receber várias interpretações. Suas descrições dos lugares e eventos, com comentários e críticas, revelam sua personalidade, deslocado, estranhando tudo e todos. Mas o relato puro e quase ingênuo dos habitantes locais, das questões sociais e das atividades entre os indígenas traz detalhes dessa aproximação dita humanística, com todas as imperfeições e os vícios.
O povo em estado original, que se buscava e se anunciava como tal ao público distante, já estava transformado pelo contato, especialmente com aqueles que diziam estudá-lo e protegê-lo. O missionário que seguiu no mesmo barco para se fixar entre a comunidade revelava planos para abrir uma pista de pouso no local. George não só relatou isso no diário como fotografou a operação de limpeza do terreno, que padre Carón orientava com a participação do dito etnólogo René Fuerst. O suíço, que não tinha formação acadêmica, era na verdade um prospector que coletava objetos e arte de povos originais para alimentar as coleções de museus europeus. Os fotógrafos precisavam de suas informações para também produzir um conteúdo exótico para os mercados consumidores. Formaram-se laços que se mantiveram por anos. A oportunidade foi aproveitada por Claudia e George, que retornaram com o conteúdo almejado em seus filmes e fitas de som. Ele fez alguns retratos formais marcantes e alguma documentação dos Xikrin, respeitando a prioridade dela. Em algumas cenas, percebe-se a atividade coordenada pelos forasteiros, como o resultado da coleta de castanhas destinadas à comercialização ou a produção de peças artesanais, certamente necessárias aos colecionadores.¹¹
Claudia Andujar fotografando as atividades dos Xicrin, 1966.
George Love e Claudia Andujar no Peru, 28 de maio de 1966.
O próprio George, inexperiente na abordagem dos habitantes locais, tanto mais em etnologia, seguiu o exemplo e organizou uma coleção de arte Xikrin, com 73 peças que hoje se encontram no Museum of the American Indian (Smithsonian).¹² Ele tinha uma justificativa nobre, como todos nesse ramo, narrada inclusive em seus currículos. Mas os documentos que ele guardou revelam o mesmo objetivo financeiro do seu orientador. Hoje, suas fotografias nos fazem refletir e questionar o que foi dado em troca por aqueles objetos de confecção sofisticada portados com orgulho pelas crianças indígenas.
O retorno do território Xikrin se tornou outra novela, transportando a carga até o Peru, porque de Belém seria complicado despachar para os EUA. No Peru, George tinha uma tarefa encomendada pela revista Horizon: acompanhar os trabalhos arqueológicos nas ruínas de Pajatén no alto de uma montanha remota.¹³ As imagens foram publicadas, e a experiência permaneceu para sempre em destaque na memória de George. Continuando rumo ao sul, cumprindo outras tarefas programadas por Claudia, o casal chegou a São Paulo já no segundo semestre daquele ano. As cartas guardadas por George mostram que persistiu por um bom tempo a questão dos objetos Xikrin e das suas fitas gravadas. Por meio delas, apreendemos que a gravação de sons não era uma pesquisa casual, mas já tinha sido previamente tratada com a Universidade Yale. Entretanto, no seu retorno, a instituição não cumpriu o acordo, e então George passou a tentar vendê-las a outras entidades, sem sucesso, como se depreende de sua entrevista.
Já os objetos Xikrin viraram um imbróglio, conforme conta a correspondência trocada com Boris Malkin, outro comerciante de arte nativa e amigo do casal.¹⁴As cartas do polonês são divertidamente escandalosas e revelam a competição ferrenha com o rival suíço no mercado que abastecia entidades colecionadoras. Ele advertia George sobre a forma de negociação, depois dava conselhos sobre preços e possíveis clientes, praguejava contra tudo e todos, cobrava de Claudia a entrega da coleção peruana pela qual ele a contratara e dizia para ela não tentar vender as fotos dos Xikrin na Europa, que era domínio de René Fuerst – o mesmo Fuerst que, depois de impedido de explorar esse território, gritou ao mundo contra o genocídio no Brasil.
É fascinante que George tenha guardado esses documentos, que hoje podem ser lidos sob novas perspectivas.
⁸ Carta de Claudia Andujar a Scott Hyde, 23 de setembro de 1965. UNCC – J. Murrey Atkins Library Special Collections and University Archives at University of North Carolina at Charlotte, Charlotte, Carolina do Norte, EUA.
⁹Carta de Claudia Andujar a Rose Leary Love, 22 de dezembro de 1965, e carta de Claudia Andujar a George Love, 23 de janeiro de 1965. Coleção George Love.
¹⁰Entrevista de George Love a Zé De Boni, ca. 1993.
¹¹FRANÇOZO, Mariana. “O colecionismo etnográfico no Brasil (1955-1975): entrevista com René Fuerst”. Boletim do Museu Paraense Emílio Goeldi. Ciências Humanas, v. 12, n. 3, p. 789-800, set.-dez. 2017. FUERST, René. Xikrin. Hommes Oiseaux d’Amazonie – 5 Continents. Milão, 2006.
¹²Disponível em: https://americanindian.si.edu/collections-search/search?edan_q=xikrin.
¹³ “The lost city of Pajaten”, revista Horizon, outono de 1967
¹⁴Correspondência de George Love e Borys Malkin, pesquisadores e instituições, entre as datas de 19 de março de 1966 e 15 de agosto de 1969. Coleção George Love.
George Love não imaginava que iria trabalhar com fotografia no Brasil. Um encontro casual o levou a ser contratado pela Editora Abril. A proposta era atraente: usar seu dom criativo em temas com os quais ele não tinha intimidade. Fez moda, costumes, automóveis, chegando à grande vitrine da revista Realidade. Marcou época com ensaios fotográficos em que explorava mais as possibilidades plásticas e conceituais dos temas do que a documentação dita isenta. Trazia conteúdo significativo muitas vezes não aproveitado nas páginas da revista. Mas não se achava fotojornalista, pois via naquele espaço a possibilidade de promover a fotografia no momento em que sua popularização aumentava. Com Claudia Andujar, fortalecia a parceria intelectual e os laços familiares, como ao receber a visita de sua mãe, no Natal de 1967.
Eu vim para o Brasil realmente sem saber o que eu podia fazer aqui. E eu não tinha, para ser exato, a mínima ideia de que eu ia fazer um trabalho fotográfico. Eu fiz parte de um grupo de fotógrafos americanos, nós tivemos uma galeria de fotografia em Nova York, na Lexington Avenue com a Rua 65, e a gente se dedicou àquilo como artista plástico. Então, fotógrafo como artista plástico não é assim, ou pelo menos naquela época não era, grande coisa, de ganha-pão… Eu pensei noutras coisas e acabei entrando na fotografia porque, uma noite, num coquetel, me encontrei com Roberto Civita.
Roberto me abordou… e falou assim: “Você é fotógrafo? Você já viu jogo de futebol? “. Falei: “Não, nunca na minha vida…”. “Então ótimo! Você está empregado!… Porque por aqui a gente fotografa muito jogo de futebol. Eu acho que os fotógrafos do Brasil têm feito todas as tomadas possíveis e imagináveis, e até inimagináveis, impossíveis, de jogo de futebol. Para uma tomada nova, só alguém que jamais viu o jogo, nem ouviu falar do próprio jogo. “
Aí, ele então me empregou, e eu comecei a trabalhar para a Realidade, e, durante os primeiros quatro, cinco, seis meses no mínimo, eu era um fotógrafo de esporte para a Editora Abril.¹⁵
Revista Realidade, fevereiro de 1968 (p. 28-29)
Rose Leary Love, mãe de Love, em Copacabana, janeiro de 1968.
George Love no estúdio Abril, 1968.
George Love e Claudia Andujar, novembro de 1967.
George Love percorreu algumas das publicações mais populares da editora: 4 Rodas, Claudia e, eventualmente, Manequim. A história da contratação como fotógrafo de esporte serve de parábola para o que fez com moda. Criava imagens que não podiam ser rotuladas de ilustração, nem tampouco de registros, enfatizando o modo e a expressão, em sintonia com as fronteiras que os especialistas do gênero estavam expandindo. De fato, ainda desconhecido do público, ele estreou na revista Realidade em janeiro de 1967 em um portfólio com imagens de alguns fotógrafos, que celebrava a maternidade. George e Claudia Andujar dividiam uma página, ela com a foto de uma prostituta, e ele com a de uma jovem mãe Xikrin, com legendas que ilustravam o preconceito ainda reinante, mesmo em uma publicação considerada de vanguarda. Sua visão excêntrica sobre o futebol apareceu no mês seguinte e novamente um ano depois, a segunda mais mar- cante, pelo foco dirigido aos torcedores/sofredores, indiferente ao que acontecia no gramado. Sempre aclamada, Realidade recebia de George a mesma avaliação:
Na Realidade, nos primeiros quatro ou cinco anos, nós vivemos um dos momentos únicos, não só no jornalismo do Brasil, mas no jornalismo do mundo inteiro.
Ali, ele desfrutou sua liberdade criativa para apresentar soluções expressivas que fugiam da rotina visual. Mas ele também recorria ao modelo jornalístico convencional quando o tema pedia. Enviado aos EUA em 1968, ele reencontrou-se com a questão dos direitos civis, dessa vez com a devida sensibilidade, na matéria “Poder para o povo preto”.
No material que ele conservou dessa fase, percebe-se que ele oferecia muito mais opções do que caberiam nas revistas. Mas isso não o incomodava, já que a profusão de sobras seria o combustível de seu trabalho pessoal em constantes recompilações.
No plano pessoal, George Love adaptou-se muito facilmente ao estilo de vida brasileiro. Sua correspondência mostra a surpresa de seus amigos americanos por seu sumiço e onde fora se estabelecer. A distância, sua mãe se encantava com o sucesso profissional do único filho, valorizava sua parceria com Claudia e se preocupava em mantê-lo em contato com a família. Mesmo em fase de declínio físico, de impulso, Rose usou suas poucas economias para visitá-los, no final de 1967. Celebraram o Natal na casa da mãe de Claudia e passearam pelo Rio. De volta aos EUA, Rose descreveu o voo em uma carta:
Oh! Eu consegui ver Brasília. O avião fez uma escala nessa cidade,e pude ter uma vista aérea do planejamento urbano e de alguns de seus edifícios. Parecia uma maravilha! Fizemos uma escala em Manaus e, depois, sobrevoamos Mato Grosso e a vastidão da floresta. Reuni coragem suficiente para olhar o Rio Amazonas e a floresta lá embaixo. Aquela visão foi incrível?¹⁶
¹⁵Entrevista de George Love a Zé De Boni, ca. 1993.
¹⁶Carta de Rose Leary Love, 11 de janeiro de 1968. Coleção Love.
Para resgatar a atenção do público, a revista Realidade criou edições especiais temáticas, e a abertura da Amazônia foi o primeiro projeto. Uma grande equipe cobriu a região no primeiro semestre de 1971. George tinha a missão de mostrar a paisagem e sugeriu que isso só seria possível com fotografias aéreas, tais a extensão e a diversidade do ambiente. Certamente recordava-se das palavras de sua falecida mãe sobre a sensação de sobrevoar o Rio Amazonas. Com peripécias que ele depois contava, captou uma quantidade de fotos muito além do que caberia na revista. Formou, assim, um rico inventário visual, bem adequado aos bancos de imagens que o representavam e para seus trabalhos pessoais. O número de outubro de 1971 foi um estrondoso sucesso, mas também sua despedida da Realidade e da Abril.
Rose faleceu em junho de 1969; no início de 1971, George realimentava sua memória, voando sobre o Amazonas a serviço da Realidade. Pode-se imaginar que as palavras daquela carta ficaram gravadas no seu subconsciente, se não na sua lembrança viva.
A revista havia passado por mais ou menos um ano de perder tiragem. E surgiu uma polêmica, tipo “como salvar a Realidade? “… Isso foi muito discutido. Aí, um jornalista, amigo meu, de nome Raimundo Pereira, tinha uma ideia bastante simples, bastante clara. Ele achava que a revista precisava ir mais a fundo em determinados assuntos. Então ele propôs a formação de uma revista produzida por duas equipes. Supõe que a revista sai 12 vezes por ano, e que oito revistas são chamadas revistas normais, ou rotineiras, e que quatro fossem edições especiais. Então a turma das edições especiais ia trabalhar em separado, porque teria mais tempo para ir minando a fundo o assunto de cada revista especial. Enquanto a turma das revistas mensais, rotineiras… seria também uma turma que trabalhava por menos tempo para ir pouco menos a fundo. Raimundo idealizou o primeiro assunto a ser abordado por uma revista especial como sendo a abertura da Amazônia. Ele, por isso, montou um esquema envolvendo uma equipe de no mínimo 50 pessoas. Eu acredito que fomos além disto, que a memória me sirva, 70 pessoas… O trabalho foi combinado na segunda metade ou talvez nos últimos três meses de 69 [1970] e ocupava a equipe desde janeiro até maio ou junho de 70[19711. A gente teve, por exemplo, Luigi Mamprim, que era muito veterano de contato com índios, novas caminhadas na mata etc., ficou de fazer este tipo de coisa; o Jean Solari ficou de fotografar a matança de uma onça; Claudia foi atrás de índios, assim mais na intimidade, et cetera, et cetera. A mim caiu a parte de paisagem e o Raimundo me perguntava se eu achava possível ou como que eu podia fotografar a paisagem da Amazônia. Eu disse que, para mim, isto apenas podia ser feito do ar, por causa da imensidão do assunto, da necessidade de deslocamentos dentro de uma área muito grande em um espaço de tempo relativamente curto, a necessidade de colecionar uma certa variedade de imagens deste assunto e a necessidade de poder ver este assunto. É um pouco como perguntando assim: como que você ia fotografar o planeta Terra? Bom! Sabendo o que sabemos hoje, seria do espaço o único meio de fotografar o planeta Terra, com certeza. Aí eu fui lá, era no começo de abril, acredito, de 1970 [1971], e fiquei até junho.
Revista Realidade, edição especial “Amazônia”, fotos de Claudia Andujar (à esq.) e George Love (à dir.), outubro de 1971.
Fiquei voando e fazendo isso, em toda parte, e tinha dinheiro da revista. Mas o dinheiro da revista se esgotou, eu pedi mais. Aí se esgotou, pedi mais. Vieram telex, porque naquela época não existia fax, tinha um velho telex em Belém do Pará. E eu fiquei de operador de telex. Então subiu um telex de São Paulo: “Porra, não dá mais! Vocês já gastaram, não sei, 14 bilhões de cruzeiros só de táxi-aéreo! Impossível! Parem imediatamente com isso! Cadê o George?” E eu no telex falando assim, por exemplo: “Sei lá onde anda o George Love! A última vez que eu o vi faz umas duas semanas e ele estava indo para… Sei lá, acho ele estava bem a oeste de Manaus, mas só Deus sabe onde”. Ou por exemplo: “Ouvi que a Claudia Andujar vai atrás de mais uma tribo de índios. Fala para ela voltar, porque o custo disto, o custo disto, o custo disso… “. “Ahhh! Lamento que ela saiu ontem. Agora… Não há como localizar uma pessoa já em viagem pela Amazônia! Lamento muito, mas fazer o quê?” E daí para a frente. ¹⁷
George guardou amostras de telex, pautas, anotações e roteiro de voos.
Quando a gente voltou com isso tudo da Amazônia, nós fizemos reunião após reunião. Nosso intuito era que tudo devia ficar enxuto e fiel àquilo que a gente havia visto. Para minha parte caiu o fato ingrato que eu não tinha feito uma só fotografia da estrada Transamazônica rasgando a selva, que a Manchete já havia ficado famosa por publicar isso de todos os jeitos imagináveis. E eu nunca havia fotografado.
Conversa telex entre Love, em Belém, e Raimundo Pereira, na Editora Abril, São Paulo, 1971.
Caderno de notas de George Love durante o trabalho para revista Realidade na Amazônia, 1971.
Lista de voos de táxi aéreo de Santarém, 1971.
Capa da revista Camera, janeiro de 1973.
Que é mentira! Eu fotografei, mas eu disse que havia perdido isso na névoa ou qualquer coisa assim. Até quando as fotografias foram analisadas, eu recebi um telefonema: “Porra! Como? Não tem nada da estrada Transamazônica?”. “Não! Ahh, sei lá, sumiu… Não sei onde, nem vou procurar.”
O tempo passou. A revista saiu. Com muita trepidação, a editora resolveu publicar mil exemplares de uma revista que [no passado] havia vendido 500 mil exemplares, batata! Essa revista tinha, se não me engano, 304 páginas. Sumiu das bancas no fim do segundo dia. Estava no mercado negro sendo vendida por três vezes o preço da capa no terceiro dia. No quarto dia, a editora já entrou em conferência para determinar se seria preciso reimprimir a revista.
Agora, isto é mais um exemplo daquilo que eu falei: quando isso que podia ser chamado de impulso criador, impulso jornalista, age à altura, com seriedade, vira, entre outras coisas, comercialmente viável. Mas, na minha experiência, a maioria dos empresários não gosta deste fato. Eles gostariam, e isso devia ser entendido como uma necessidade humana, de imaginar que a revista sai, é comprada, que as matérias são acreditadas, por causa do trabalho deles.¹⁸
Existe a história, repetida por muitos, de que, após essa edição, toda a equipe foi demitida por razões políticas, censura, ditadura… O romântico relato que George Love fez ingenuamente permite imaginar mais motivos, ao menos para seu desligamento. Quando consultamos seu conjunto de fotografias da Amazônia, vemos, pelos carimbos das molduras dos Kodachrome com a data “MAI 1971” e pelas indicações dos voos marcadas a caneta nas molduras brancas correspondendo às anotações em seu caderno, que ele produziu uma quantidade imensamente maior que o necessário para a editora. São dessa empreitada a maioria das imagens da Amazônia que usou em trabalhos pessoais. Percebe-se ainda que a revista não tinha aquelas fotografias icônicas que o celebrizaram, mas não se pode garantir que isso foi por decisão dos editores ou porque eles não teriam visto aquela parte da produção. Claro é, até pela escolha diferenciada dos filmes, que George usou o próprio material e cuidou pessoalmente do processamento, como era comum ele fazer.
Passou pouco mais de um ano, e ele era destaque na conceituada revista Camera, onde contava ter feito mais uma viagem por conta própria e o plano para um livro com Claudia Andujar. Relata o fotógrafo:
Escolhi focar principalmente vistas aéreas. Considerando que esse tipo de fotografia na Amazônia exige extensos períodos de voo e, consequentemente, um alto custo, o projeto só foi possível graças ao apoio da Força Aérea Brasileira, que forneceu aviões e pilotos, praticamente sob pedido.¹⁹
Sua extraordinária produção de plásticas imagens e registros ambientais alimentou o acervo de seus representantes em Nova York e consagrou George Love como sinônimo de fotografia aérea da Amazônia.
¹⁷Entrevista de George Love a Zé De Boni, Ca. 1993.
¹⁸Entrevista de Love a Zé De Boni, ca. 1993.
¹⁹Revista Camero, janeiro de 1973, p. 14 a 22.
Além da Editora Abril, George Love participou de algumas iniciativas editoriais que surgiam ainda no início dos anos 1970. Eram vitrines que davam visibilidade a seu trabalho e onde ele incentivava o uso da fotografia. Foi editor de fotografia e fotógrafo da revista Bondinho, publicação de um grupo de supermercados, um espaço limitado, mas com grande penetração. A experiência foi marcante, porém curta, como foi na direção de duas revistas especializadas, Fotografia e Novidades Fotoptica. Como referência para a crescente comunidade de amadores e profissionais, George pôde explicitamente tratar da técnica e da linguagem que dominava e exibir-se naqueles espaços com a excentricidade da vanguarda da época.
O boom da fotografia no início dos anos 1970 refletia a evolução industrial de equipamentos e processos, bem como as transformações socioculturais desde a década anterior. Nesse contexto, praticar fotografia era um ato de liberação, e ostentar o equipamento representava glamour e jovialidade. As normas austeras dos fotoclubes eram superadas, e via-se a proliferação dos cursos informais. Os iniciantes inspiravam-se nas publicações inovadoras.
Capa da revista Fotoptica, março de 1971.
Página da revista Novidades Fotoptica, março de 1971, com trabalho desenvolvido na própria gráfica no momento da impressão.
“Ensaio St. Paul”, revista Novidades Fotoptica, 1979, prova de velo.
Além de George Love ser um dos destaques de Realidade, suas surpreendentes soluções visuais podiam ser seguidas na revista quinzenal Bondinho, que surgiu no final de 1970 no cenário paulistano. Ali ele era o próprio editor de fotografia e gozava de liberdade para exercitar sua pesquisa formal, adicionando importantes tijolos na construção de sua visão pessoal da cidade. Sua função como influenciador nas duas revistas era complementada por iniciativas que estimulavam o uso da fotografia, orientando os primeiros passos, como no curso que preparou para Realidade, publicado enquanto ele voava pela Amazônia. Assim era sua apresentação:
A fotografia deixou de ser uma técnica complicada e está ficando cada dia mais fácil entendê-la. Hoje, na maioria das vezes, não é preciso mais profundos conhecimentos técnicos para fotografar: é preciso saber apenas certas regras básicas — isso é bom, pois qualquer coisa que deixe a pessoa mais livre para criar é automaticamente a mais certa. Para começar, é importante você saber que uma boa foto pode ser feita com uma máquina comum e barata. Se eu falo: “É bom ter uma máquina de lentes intercambiáveis”, evidentemente é porque acredito nisso. Mas você pode, sem nenhuma lente intercambiável, conseguir uma expressão fotográfica lindíssima, bem melhor do que a minha. Digo expressão fotográfica porque a ideia de fotografia muda de dia para dia, permitindo formas de expressão e ver as coisas das maneiras mais variadas e imagináveis. Tudo depende de sua criação — a máquina pode substituir o homem somente até um certo ponto. Espero que, lendo este roteiro, você comece a se interessar pela fotografia, mesmo que nunca tenha tirado uma.²⁰
Revista Bondinho, capa e páginas internas, 22 de janeiro de 1971.
Curiosamente,a revista Bondinho abordou o assunto quase simultaneamente. Já na curta vida da Revista de Fotografia e na sua breve passagem por Novidades Fotoptica, foi explícita essa veia didática de George, sempre abordando as fronteiras técnicas e a multiplicidade de soluções expressivas. Atuou como editor, antenado com o que acontecia internacionalmente e valendo-se do espaço para mostrar o próprio trabalho. Em Novidades Fotoptica de março de 1971, ele se aproveitou do acesso privilegiado à gráfica para criar o produto final na imagem impressa – isto é, as páginas traziam não meras reproduções, mas aquilo que ele considerava a própria obra. Seguia a tendência de usar a impressão offset como suporte, aproximando-se do que faziam seus colegas Scott Hyde e Syl Labrot. Mas, em alternativa a um trabalho metodicamente controlado, dava chance ao acaso participar do processo. Assim ele era apresentado por Roberto Freire:
Para George Love, seja qual for o assunto fotografado, é o seu mundo pessoal, sua própria pessoa o que procura descobrir e compreender… acredita que o mundo e as pessoas estão em permanente evolução, que nós criamos e concebemos a realidade, e assim esta será captada e mostrada nas fotografias com o registro de coisas mais interiores do que exteriores. Daí pode-se dizer, talvez, que este ensaio é um autorretrato do artista envolvendo as pessoas mais intimamente ligadas a ele no plano afetivo e emocional.²¹
Ali ele mostrava seu completo amadurecimento, no momento em que se desdobrava entre múltiplas atividades e projetos, gozando da plenitude de sua competência. Há uma notável coerência com o que ele contaria mais de 20 anos depois em entrevista. George construía conscien- temente seu universo de imagens sob uma óptica eminente- mente narcisista, segundo as próprias palavras, sendo mais uma chave para nos aprofundarmos no entendimento de sua obra e sua trajetória.
Essa passagem pela direção de veículos especializados foi marcante, ainda que tenha durado tão pouco. Já fora do expediente, em 1979 ele apareceu novamente em Novidades Fotoptica com o trabalho St Paul, baseado em contraposições gráficas de natureza introspectiva. Era o piloto de um projeto pessoal de livros de artista, e aquela apresentação mostrava imagens que ele já ordenava em sequência para a projeção sobre o mesmo tema: “O esforço que teve que fazer para se localizar numa cidade como São Paulo?²²
²⁰Revista Realidade, “Aprenda a fotografar. É simples”, março de 1971, p. 105.
²¹Revista Novidades Fotoptica, ano 14, n. 48, março de 1971.
²²Revista Novidades Fotoptica, “Ensaio St. Paul”, 1979.
Vanguarda e excentricidade são termos que melhor se aplicam à atuação de George Love no MASP, sempre em parceria com Claudia Andujar. Caindo nas graças de Bardi, eles coordenaram o Laboratório de Fotografia do museu, uma oficina para o ensino de técnica e expressão muito concorrida. Por pouco mais de uma década, organizaram exposições individuais e grandes mostras coletivas. Destaca-se a Semana de Fotografia, em 1974, evento pioneiro e fruto do esforço pessoal de George na época da separação do casal. Ainda mais marcantes foram suas próprias mostras individuais, em que empregava projeções com trilhas sonoras e desenho do espaço surpreendentes, criados pelo próprio George. Um show musical com projeções no vão livre e uma jam session visual tomaram-se lendas que um público limitado presenciou.
Em 1969, George Love realizou seu primeiro “show” no MASP. Dois anos depois, ele fez um evento experimental, como ele definia, usando um potente projetor e prismas que espalhavam suas imagens por tecidos pendurados em torno da grande sala do mezanino. O calor da fonte de luz queimava e furava os slides,e as pessoas interagiam com as projeções, de forma que nada se repetia.²³ E em 1973, ele dirigiu uma projeção equivalente com fotografias de Claudia Andujar. George elaborava também as trilhas sonoras e cuidava de toda a produção dos acessórios necessários às suas criações, conforme relata Dan Fialdini, responsável pela montagem de exposições no museu na época. Para a mostra A Família Brasileira (1971), que reunia retratos de antepassados e contemporâneos coletados entre a comunidade, George montou uma projeção ambientada com som, a que o visitante podia assistir acomodado em bancos de igreja. Dan conta que foi uma das coisas mais comoventes que viu no museu: as pessoas saírem daquela projeção às lágrimas.
O Museu de Arte de São Paulo deu atenção à fotografia desde seus primórdios, mas não tinha um departamento especializado nem um curador até que a figura centralizadora de Pietro Maria Bardi abrisse o espaço para Claudia Andujar e George Love. Ainda como gestão informal, eles coordenaram grandes eventos, em dupla ou individualmente, sempre oportunos e pioneiros.
Projeto da instalação feito fotógrafo no verso de uma caixinha de filme, 1971.
Cartaz de no MASP, ca. 1969.
Documentação da instalação de 1971 feita próprio George Love; sua sombra ilustra a interação que o público poderia ter com a obra.
Projetor na sala da exposição da Semana de Fotografia do MASP, 1974.
Slide furado pelo calor do projetor da instalação no MASP em 1971.
Documentação da exposição Eletropaulo Ano I, MASP, 1982.
Um fotógrafo de importância na época, o Ray Metzker, que surgiu nos Estados Unidos depois de eu já viajado, eu o vi pela primeira vez no MASP O mesmo pode-se dizer do trabalho do Lee Friedlander. Durante anos e anos o MASP teve uma frequência de exposições fotográficas assustadoras. Quando foi 74, produzimos lá a Semana de Fotografia. Bardi, eu, Luís Osaka, basicamente nós três e mais algumas pessoas também, tivemos a ideia de uma exposição assim um pouco reminiscente da Semana de 22, com fotografias de todo o mundo dentro do museu, que era uma ambição abertamente impossível de ser realizada. Na época, o Brasil era muito fechado, problema de importação, exportação de obras de arte… Fomos empurrando aqui, puxando ali, no fim éramos 65 fotógrafos, todo o leste da Europa foi representado, algo da União Soviética… Japão… Itália foi representada pelo próprio Bardi. E era uma semana! Conseguimos… trazer dois fotógrafos americanos importantes, o Syl Labrot e a mulher dele, Barbara Labrot, para dar palestras, mostrar também. Houve uma série de palestras ao longo da semana sobre assuntos os mais variados… E a semana de 1974 foi uma coisa que pode ser lembrada até hoje.²⁴
O evento, realizado em novembro, começou a ser produzido cedo naquele ano, quando Claudia estava em Roraima com o compromisso da bolsa que recebera. Por cartas, George tratava do apoio ao trabalho dela e acompanhava os problemas que ela ia encontrando. Ainda em agosto, ela comunicou sua opção pela separação. E não voltaria até o final do ano, mas ainda assim teve ao menos uma foto sua na mostra: George Love em pose sensual na casa que os dois dividiam em Sarapuí.
Claudia coordenou Grande São Paulo 76, onde George era apenas mais um entre dezenas de fotógrafos. Em 1977, foi dele a direção do ciclo de exposições A Paisagem Brasileira. O último grande evento que realizou foi Eletropaulo Ano l, em 1982, com o acervo de imagens históricas da antiga Light.
Enquanto as realizações de George Love no museu eram plenas de criatividade, vanguarda e competência, seus documentos revelam uma carência no rito protocolar que a atividade pede. As fotografias que fazia das exposições montadas eram mais ensaios plásticos do que relatórios documentais. As falhas na devolução de trabalhos usados ou a documentação técnica precária não foram obstáculo para ocupar aquele espaço. Talvez tenha sido uma grande virtude do MASP estar indiferente a isso e propiciar terreno para George exercer livremente sua marcante influência tanto nos visitantes casuais como naqueles que frequentaram suas oficinas.
A experiência do workshop, o Laboratório de Fotografia do MASP, foi de importância extrema. Foi ali nesse workshop ou oficina que foi conhecido por mim, acho também pela Claudia, todo mundo, a sensação de aprendizagem como participação. Não levou muito tempo a partir da hora quando isso começou, quando eu comecei a falar para as pessoas: “Bom, a oficina do MASP é de altíssimo valor a mim porque é lá que eu aprendo”. Eu achava que aprendia sempre muito mais do que qualquer pessoa que integrava a turma. Quando eu entrava lá, seja que eu falasse, seja que uma outra pessoa falasse, representando um ponto de vista, inclusive, até antagônico ou coisa assim aos meus pontos de vista, mesmo assim eu estava aprendendo barbaramente.
…Os conceitos de fotografia que foram formados nos recintos da Oficina do MASP eram tão importantes quanto a confecção do livro Amazônia e a própria experiência de ter passado na Amazônia. Aqui eu devo dizer uma coisa que vai ficar óbvia, que naquela época o Museu de Arte de São Paulo era dirigido por Bardi. O Bardi deu um impulso genial a este negócio daqui. O Bardi jamais era uma pessoa fácil e jamais deixou de ser um gênio. E acredito que esta oficina e as coisas que a oficina conseguiu realizar foram uma coisa que não teria sido possível sem a ajuda inicial; semente!
…A gente teve uma atitude para com a fotografia… essa atitude teve mais tarde uma influência sobre as pessoas, no sentido de abrir as pessoas para novas opções… Eu particularmente diria que isto aí é a frase: descobrir a fotografia como forma de expressão, descobrir, ainda mais, a fotografia como forma da sua expressão… Ser ajudado nisso, numa certa abertura de cabeça. Agora, o que eu chamo, porém, uma abertura de cabeça é uma coisa que surgiu no mundo mais ou menos assim de forma simultânea…
Eu sempre tive respeito pelo olho e pela ideia do brasileiro na fotografia.²⁵
²³ MARQUES, Hernani. “A magia da foto chinesa”, Folha de S. Paulo, 24 de junho de 1971.
²⁴ Entrevista de George Love a Zé De Boni, ca. 1993.
²⁵ Entrevista de George Love a Zé De Boni, ca. 1993.
Das atividades culturais de George e Claudia, apenas os esporádicos cursos rendiam alguma receita. Mas seu sucesso abria as portas para o trabalho comercial no segmento de imagem corporativa. Calendários, relatórios anuais, folhetos e livros veiculavam trabalhos que mantinham sua assinatura. George assumia tarefas mais convencionais, como documentação de fábricas e obras, nas quais se empenhava até seu limite físico. Mesmo nessa área rígida, fazia valer a criatividade de um autêntico heliógrafo. De sua autoria saíram um projeto de estande e projeção para a Olivetti, o relatório anual da Eucatex de 1981, o audiovisual Les Barrages, sobre o sistema elétrico brasileiro, e uma exposição da Eletropaulo. A construção de Itaipu e o adeus a Sete Quedas correspondem ao declínio de sua atuação comercial.
Paralelamente ao seu envolvimento na promoção cultural da fotografia, George Love fazia trabalhos comerciais, o que era mais que um meio de sustento próprio e de seus projetos. Em boa parte, era uma atividade criativa sobre temas corporativos. Sua empresa, Lovisual, em parceria com Claudia, foi criada em 1970 e tinha como alvo peças institucionais de grandes empresas. Muitas vezes o material empregado era derivado do trabalho pessoal dos dois. Progressivamente, George foi se destacando na criação visual sofisticada, em um nicho de mercado refinado.
Em analogia ao que recebeu nas editoras e no museu, seu trabalho corporativo tinha o suporte de certos visionários, que confiavam na sua capacidade de surpreender o público-alvo, a ponto de deixar em suas mãos toda a concepção, que ia além do visual. Foi assim no audiovisual Les Barrages, quando Lucas Nogueira Garcez era diretor da Companhia Energética de São Paulo (Cesp); no pavilhão da Olivetti.com Mario Chamie; nos perfis do Grupo Sharp, de Mathias Machline; no relatório anual de 1981 da Eucatex, onde estava Guido Santi. George lidava diretamente com os altos escalões, conforme suas anotações revelam.
Autossuficiente, ele trabalhava praticamente só, coisa incomum e problemática nesse mercado. Nunca mencionou assistente. Isso fica claro nas fitas²⁶ que gravou como relato da viagem ao Sudão, em 1975, fotografando para a Mercedes-Benz. Naquele trabalho, George teve uma série de problemas e não tinha o suporte de alguém de sua confiança. Talvez, se tivesse, não passaria pela experiência em outra ocasião, que contou de forma divertida em entrevista:
Certa vez, eu tentei fazer um trabalho industrial aqui no Brasil. Foi para uma agência, um cliente que tinha oito fábricas grandes no sul do Brasil para serem fotografadas em sete dias. E eu disse: “Ah! Vou fazer!”. Então eu realmente fotografava oito fábricas em sete dias impulsionado basicamente por cerveja e vinho de Rio Grande. No sétimo dia, eu desmaiei. Pronto!… fui levado para não sei onde e acordei num quarto de hotel, e as pessoas ao redor da cama! Eu estava pensando: “Puxa vida! Eu acho que eu me ferrei, eu acho que vou morrer!”. Loucura, né? Babaquice pura e simples! Mas foi o que passou pela cabeça naquele instante. E as pessoas saíram do quarto para me deixar dormir. E eu, o que fiz? Eu vi que, ao lado, na mesinha de cabeceira da cama, era a minha máquina! Eu pegava a minha máquina, levantava sobre a minha cabeça e fiquei fotografando o meu rosto. Imagina! Eu estava morrendo! O doido imaginava registrar as últimas gotas de suor para quê? Mas, também, fazer o quê? Um esforço de autoconhecimento.²⁷
Essa é apenas uma de suas várias narrativas do recurso do autorretrato para se reposicionar, atribuindo ao processo o poder de resgatá-lo das grandes pressões ou “quase mortes”. Foi Lucas Garcez quem o levou à Eletropaulo, onde ele produziu dois livros e uma exposição no MASP em 1982. Depois, Nelson Garcez propiciou a ele acompanhar a construção de Itaipu e o adeus a Sete Quedas. Pelo seu arquivo de imagens, nota-se um George Love menos eficiente, disperso e redundante. Seu ciclo nas empresas de energia logo se encerrou, outras portas foram se fechando, e George Love sentia mais forte a pressão interna pela mudança.
Pavilhão da Olivetti com projeção desenhada por George Love, 1970.
Relatório anual da Eucatex, projeto de Love, 1981, UNC Charlotte J. Murrey Atkins Library.
Brochura de institucional do grupo Sharp, ca. 1978.
Calendário PEM Engenharia, com imagens da Amazônia, 1980.
Calendário Mercedes-Benz, em parceria com Claudia Andujar, texto de Mário Chamie, 1976.
Autorretrato de uma das “quase mortes” de George Love, data indeterminada.
²⁶ Material arquivado na biblioteca da UNCC.
²⁷ Entrevista de George Love a Zé De Boni, ca. 1993. A mesma história foi relatada no artigo “A magia da foto chinesa”, de Hernani Marques, na Folha de S. Paulo, de 24 de junho de 1971.
Logo após a edição especial de Realidade, George revelava a intenção de editar um livro com as fotografias da Amazônia juntamente com Claudia. O projeto arrastou-se, mas foi mantido mesmo com a separação do casal. Finalmente, em 1978, reunindo as ideais do projeto de Wesley Duke Lee, da gráfica de Regastein Rocha e de um texto especial do poeta Thiago de Mello, o livro Amazônia foi impresso. Um grande revés os abalou: a censura do texto, excluído da encadernação, e a edição reduzida a uma fração do previsto. A relíquia que poucos conservaram traz a paisagem de George Love na primeira parte, seguida do mundo indígena de Claudia Andujar, com ar de mistério que suscita várias interpretações. Na explicação do autor, é revelado com clareza e simplicidade esse sopro de genialidade.
A ideia de publicar um livro com imagens da Amazônia com Claudia Andujar apareceu em uma carta de George Love a sua tia Fannie, ainda em novembro de 1971, em que ele relembrava sua mãe.
A viagem à Amazônia faz parte de um grande projeto de livro sobre a preservação da natureza e as culturas de povos originários. Nós dois investimos praticamente tudo o que tínhamos na expedição, que se revelou extremamente custosa (você tem que alugar uma aeronave e tal, e viajar na floresta é difícil e caro do ponto de vista do equipamento), mas estamos confiantes de que o resultado será uma rica colheita e um bom livro. Já acertamos a publicação no Brasil e, em seguida, esperamos lançá-lo nos Estados Unidos. Durante o trabalho, me recordo de alguns temas que discutimos em nossas conversas relacionadas aos desejos de Rose. Uma parte do dinheiro que ela me deixou vai ser usada nisso, e acredito que ela ficaria satisfeita em saber disso.²⁸
Dois meses depois, ele escreveu sobre o resultado da viagem, otimista de que o livro seria publicado muito em breve. A carta relatava o primeiro contato com a aldeia Yanomami e a missão Catrimani, onde Claudia mais tarde realizaria o trabalho fotográfico que a consagrou e se dedicaria à causa daquele povo. Trazia também uma curiosa descrição do hidroavião Catalina e seu delírio de fotografar do posto de atirador de traseira. É possível ver a silhueta daquela janela no quadro em algumas fotos importantes que ele usou.
Acho que a viagem foi um enorme sucesso; fotografamos mais do que prevíamos; pensando bem, o livro já está bem encaminhado. Vai levar de duas a três semanas para completar a revelação dos filmes. Nós fomos daqui até a foz do Amazonas, onde cobri enormes bandos de aves e reservas naturais ao norte, enquanto Claudia fotografava cachoeiras no Jari, um importante afluente do Amazonas, a noroeste do delta. Então, cobrimos a construção de rodovias e cidades ao sul dessa região, e depois eu fui até um ponto cerca de 600 milhas rio acima e fiquei por algum tempo voando sobre vários afluentes no Amazonas central fotografando do ar, enquanto a Claudia ia atrás da fauna selvagem a oeste de Manaus, mais ou menos a 1.000 ou 1.200 milhas rio acima. Então, um grande hidroavião da Força Aérea Brasileira me buscou e me levou até Manaus e depois subindo o Rio Negro, que é o maior afluente do Amazonas e muito bonito (a água é vermelho- -escura e transparente ao mesmo tempo). O avião dispunha de um tipo de túnel na cauda e com o piso removido (não é realmente um piso, mas um tipo de porta grande triangular). Eu deitava no chão dessa área e tinha um perfeito ponto de vista de tudo para fotografia aérea. Percorremos mais ou menos 5.000 milhas ida e volta a Manaus, o que levou uns três dias (hidroaviões são lentos e precisam aterrissar várias vezes). Durante esse tempo, Claudia estava em Manaus, ainda fotografando vida silvestre, e eu a reencontrei na volta e seguimos juntos para Roraima, onde ela planejava entrar no interior para estudar algumas tribos indígenas. Sobrevoamos uma bela cadeia de montanhas entre o Brasil e a antiga Guiana Britânica (esses voos são feitos em pequenos aviões monomotores com as portas retiradas para permitir a fotografia, e são frequentemente frios e ventosos) e tiramos o que eu penso serem as primeiras imagens de certas regiões — uma cachoeira muito espetacular e mais ainda. Depois, fomos até o sudoeste na mesma área, que já é floresta, e fotografamos os índios — ali era mais Claudia que eu em relação à fotografia, e eu consegui gravar algumas das músicas desse povo. Combinei com um padre/cientista que está com essa tribo para enviar microfones e uma grande quantidade de fitas magnéticas para ajudar no trabalho de gravação das músicas. Então de volta a Manaus e para casa; levou cerca de dois meses, muito mais do que esperávamos.²⁹
Apesar do ímpeto inicial, o livro ficou gestando por muito mais tempo. O casal fez a última viagem junto em maio de 1974 e separou-se quando Claudia passou a se dedicar integralmente ao seu trabalho com os Yanomami. Somente no final de 1978, com o empenho especial de George e o patrocínio de seu cliente de Manaus, a Sharp, Amazônia finalmente teve sua produção concluída. Mas não foi sem mais tropeços, que contribuíram para alimentar seu mistério.
Este livro surgiu de convicções que eram tanto da Claudia quanto minhas sobre a natureza da própria fotografia, sobre a experiência na Amazônia. E era um esforço de reconciliar ideias que nós tivemos com respeito à fotografia com ideias que nós tivemos com respeito à Amazônia. Não era exatamente o que você chamaria de uma abordagem muito tradicional, onde, por exemplo, eu vou querer montar um livro dos meus retratos de pintores… Mas, aí, o que acontece? Se fosse uma coisa assim, a importância do assunto seriam os pintores. E o desejo na época foi que a importância do assunto fosse Amazônia: um. Dois: era preciso, isso andava muito na cabeça de todo mundo, quebrar de uma vez por todas com essa ideia de que uma fotografia é uma chamada fiel representação do assunto…
Eu, particularmente, ensinando fotografia, cheguei a afirmar, coisa que eu afirmo até hoje, que… toda fotografia assim chamada boa conseguiu ser um autorretrato, puro e simples. E era através desse egoísmo, a ideia do autorretrato, que o fotógrafo tentava chegar a um termo de entendimento com o mundo. Como embora tem aqui um espelho, vou me retratar no espelho, curiosamente, para poder ver melhor aquilo que está atrás, que está sendo um pouco longe da minha vista. Eu quero me envolver com o mundo, então eu vou fotografar este mundo. Esse ato não é de retratar o mundo, mas eu mesmo. E nesse espelho de eu mesmo talvez eu vou poder ver aquilo que eu chamo meu mundo, ou “o mundo”. Maior que eu.
Se você for passear neste livro, tem essa dupla. Ocorre o seguinte: isto aqui é a fotografia… [p. 39]. Aqui [p. 38] eu mandei mudar o carregamento de cor nas chapas e até a sequência de rotação dos fotolitos para que isso virasse uma outra coisa de forma artificial. O olho devia então olhar e perguntar: “Mas qual é a verdade?”.
Tem outras coisas. Aqui, isso é a foto [p. 10]… e aqui foi somente impressa a chapa preta [p. 11]. Isto é a foto [p. 71], e isto faz parte do líder do mesmo filme [p. 61]. Ou seja, aqui você vê, como esperávamos, com muita clareza, trata-se aqui de filme! Não se trata do céu, trata-se do céu gravado em filme. Portanto, este livro não é um livro da Amazônia. A Amazônia vive aqui [aponta para a cabeça] e ali [aponta para a frente]. Isto é um livro de filmes. Como é um livro de filmes, entre outras coisas, vamos reproduzir filmes… E vamos abrir o livro, a primeira chapa… É um filme [p. I]. Isso não existe na Amazônia… Então, do início até o fim é assim.
E o livro obedece a um cronograma. A entrada é para ser misteriosa, vai ficando aos poucos mais claro. Quando está ficando claro no plano de paisagem, se entra, através desse mesmo dispositivo [p. 701, na floresta, simbolizada por uma semi-indecifrável folha [p. 71]. Depois, de novo, entrando no mundo indígena, este mundo indígena sumindo, mexendo, desaparecendo, virando abstrato. Finalmente, a última fotografia, o próprio ser humano se dissolve nas estrelas [p. 145]. Gravados… sobre… filme! [p. 144] Só o filme. E depois disto… mas o que é isso? [p. 146] Preto [p. 1471 isso é o início impresso de cabeça para baixo [p. 148]. Fecha o ciclo.
[Isso] nunca foi entendido por causa da maneira com que o livro foi tratado. Sabe-se que este livro jamais saiu para o público. Uma das coisas que foram retiradas dele foi todo o texto explicativo. Isso matou a charada: sem o texto explicativo… Tchau! E, ainda por cima, ele simplesmente nunca saiu. Você tem isto hoje porque, na época da censura, não tem outra palavra, por diversos motivos era resolvido encadernar um certo número de livros apenas com as folhas das imagens. Na pressa, eu já vi isso aqui no seu livro, folhas de mala… o papel que a gráfica gasta à toa, que joga fora.
Está vendo isso aqui? Isso é mala! Isso é coisa que jamais teria sido encadernada normalmente… E se você olhar aqui [a encadernação], está vendo como joga? Porque o texto especial tinha esta espessura. Que estava justamente aqui.
…O texto foi escrito por Thiago de Mello. E, quando eu falo em texto explicativo, isso em si merece uma explicação. Porque não é nada de texto explicativo das imagens. É um texto poético que visa à recriação da experiência da Amazônia. Isso nós achávamos o suficiente, e acredito inclusive que teria sido o suficiente, para que o leitor, uma vez tendo lido este texto poético, de poesia e recriação de atmosfera, onde atmosfera e não o assunto era o problema, então teria sido adequadamente preparado para se lançar nessas imagens onde atmosfera e não fidelidade a um assunto imaginário, qualquer que fosse, teria sido o problema. Então, quando eu falo texto explicativo, isso não quer dizer uma série de legendas. Mas o texto dele foi tirado, a tiragem do livro, também cortada. Um certo número de livros foi encadernado. A massa de folhas, etc. e tal, foi jogada fora. Os fotolitos, também, sumiram, o texto sumiu, os livros que foram encadernados foram poucos, e foi feita na época uma proibição de circulação deste livro dentro do território nacional. Este livro, por assim dizer, é proibido… Uma relíquia.³⁰
Vista de pista de terra através da de atirador de traseira do hidroavião Catalina, 1971.
Livro Amazônia, de Claudia Andujar e George Love, Editora Praxis, São Paulo, 1978.
Estojo, p. 38-39, p. 10-11, p. 70-71, p. 48-49, p. 6-7, p. 8-9, Capa
²⁸ Carta de George Love para sua tia Fannie, 4 de novembro de 1971. Coleção George Love.
²⁹ Carta de George Love para sua tia Fannie, 30 de dezembro de 1971. Coleção George Love.
³⁰ Entrevista de George Love a Zé De Boni, ca. 1993.
Artista que usava a fotografia, segundo sua própria definição, George Love buscava uma interpretação pessoal de seu mundo. Tinha na base a formação convencional de fotógrafo.Com o domínio dos equipamentos, técnicas elementares rendiam resultados incomuns em suas mãos. O que chamava de fotografia experimental era mais baseado na experiência do que em experimentos, de forma que tudo podia ser resolvido apenas em um clique. Ou fascinava-se pelos “desacertos do acaso” que ele colecionava. É o caso das malas, folhas gráficas impressas aleatoriamente que ele encadernava em tiragens exclusivas. Tudo era aproveitado como obra: provas e chapas de impressão, filmes gráficos ou as tão faladas pontas de filme. Criava projeções, projetava espaços, usava som, fazia eventos, desenhava impressos. Era livre.
George Love era autodidata em fotografia. Seu processo de trabalho partia dos modelos da época, baseado no controle de equipamentos ágeis e na escolha de materiais sensíveis diversos. A seleção na mesa de luz era tão importante quanto a percepção da oportunidade visual na sua captura. Assim ele descreveu em seu livro:
De hábito, uso máquinas motorizadas ajustadas ao ritmo máximo de fotogramas por segundo — há muita pré-visualização, frequentemente em termos de sequências e não de fotos únicas, e às vezes não olho através do visor se tenho a certeza de captar o que quero.³¹
Não era uma questão de tentativa e erro, já que ele comandava atleticamente sua reação, baseado na experiência com um processo que dependia de horas, dias ou semanas para conferir o resultado. Servia-se das sequências nas projeções, as quais concebia como instigantes instalações — um pioneiro artista multimídia. Usava as falhas e os acidentes quando esteticamente atraentes ou pertinentes, fazendo uma grande coleção de pontas de filmes e entradas descontroladas de luz. Tudo era aproveitado para potencializar beleza ou estranheza.
Raras impressões em silkscreen feitas por ocasião da Semana de Fotografia do MASP, 1974.
Prova de prelo assinada, data indeterminada.
Pôster em offset assinado, 1980.
Com liberdade de criação, recorria ao que ele chamava de fotografia experimental, mas que seria mais bem rotulada de não convencional. Eram o uso de filmes incomuns, como o Ektachrome Infrared, ou alterações no processamento, ou ainda reproduções das próprias fotografias para acrescentar efeitos. Explorava com maestria processos elementares descritos em livros básicos da Kodak, que podiam ser obtidos em laboratórios terceirizados. George não era um printer e não fazia do laboratório sua estação de trabalho, ao contrário da tradição americana mantida por seus colegas heliógrafos. Tinha muita afinidade com a produção de Scott Hyde e Syl Labrot, cultuando as múltiplas realidades estampadas em uma obra. E conseguia esse efeito com um único clique por meio de reflexos e sobreposições, sem precisar do extenso trabalho técnico. Uma exceção raríssima dessa regra são as gravuras em silkscreen que ele fez durante o workshop de Syl no MASP, quando este veio para a Semana de Fotografia.
Seus dois colegas seguiam uma tendência da época de produzir obras impressas em offset como produto final George achou um modo de aderir à ideia de maneira direta pelo seu acesso às gráficas, desde sua época editorial. O livro Amazônia teve essa preocupação, de forma que os exemplares produzidos são as peças de tiragem limitada e não funcionam como simples reprodução. Associando esse princípio à sua fascinação pelo resultado acidental, ele colecionava, emoldurava e vendia filmes de fotolitos, folhas de prova, chapas de impressão, como ele contou a uma revista em 1979:
George Love divide a percepção das imagens em várias gerações e consegue identificar cada uma delas: a imagem vista pelos olhos,a imagem vista através da máquina, a imagem impressa no filme, a imagem impressa no papel, no fotolito, na chapa de impressão, no papel onde ela é impressa, as transformações através da própria impressão, e assim vai. Então ele se aproveita de todas essas fases, ou gerações, como ele gosta de chamar, e utiliza isso no seu trabalho. Segundo ele, todas essas fases são bastante aproveitáveis, tanto que deverá lançar quatro livros até o fim do ano, utilizando-se apenas de folhas impressas de outros trabalhos seus, mas que serviram para acerto da máquina de impressão. São tiragens limitadíssimas e executadas quase que como um artesanato.³²
Essa brilhante ideia poderia ser um capítulo à parte. A verdade é que George conseguiu fazer alguns volumes, que vendeu a clientes particulares. Como muitas coisas que ele deixou, esses livros de autor ficaram sem registro: não se sabe quantos foram feitos, quem os comprou nem se estão conservados. Mas sua fascinação pelo processo ficou gravada em entrevista.
Eu estava hoje falando com uma pessoa aqui em São Paulo, e essa pessoa estava fazendo observações sobre uma série de fotografias que eu realizei em 1983. Eu estava falando: “É! Inclusive eu gostava daquilo, era muito bom. Mas o melhor mesmo de ter feito aquilo e de ter inclusive publicado aquilo era a mala da máquina”. Mala é quando, na gráfica, o fulano está acertando a máquina, cor, registro e tal, ele faz passar muitas folhas de papel que têm desacertos de registro, de cor etc. e que são jogadas fora. Quando ele acerta, finalmente, então ele roda as folhas. Eu ficava lá colecionando a mala, que eu achei mais bonita. Então eu havia feito aquele trabalho, aquele trabalho foi impresso… Eu ia lá na gráfica, não para controlar a fidelidade da reprodução da fotografia, mas para colecionar a mala, que não tinha picas que ver com a fotografia. Eu colecionava e depois montava livros, encadernava à mão. E vendi para clientes meus. Vendi que nem eu falei em vender installations de retratos. Então, por que não vender um livro encadernado à mão de mala? Então eu falei: “Olha! Dá na mesma! A gente podia até rodar aqui, só que o que vai prestar depois é a mala. Então vamos fazer uma agenda, calendário, livro ou sei o que diabo, inteiramente de mala. Desacertos do acaso!” ³³
Chapa de impressão, provavelmente provas, de imagens de Amazônia, que foi exposta na Semana de Fotografia do MASP em 1974.
Chapa de impressão com imagens de gatos, data indeterminada.
³¹ TOLEDO, Benedito Lima de. Paulo Anotações. São Paulo: Eletropaulo — Eletricidade de São Paulo S.A., 1982.
³² RODRIGUES, Zeca -Clic!”, revista não identificada. Arquivo UNCC
³³ OLIVEIRA, Moracy R. de. *Novas e projetos. Na volta de George Love”, Jornal da Tarde, 26 de julho de 1979, p. 17.
George Love abdicou de Amazônia em 1980 para mostrar o produto de sua interação com a cidade de São Paulo. A mostra Diários, na galeria Album, resumia em 25 ampliações em Cibachrome o ensaio que ele publicaria dois anos depois. O livro São Paulo – Anotações funcionava como par contemporâneo de São Paulo – Registros, que tinha fotos do antigo arquivo da Light selecionadas e trabalhadas pelo fotógrafo. Mas, em contraste com as imagens documentais do passado, Anotações trazia uma visão particular, com contexto fortemente pessoal, alimentado por emoções e memórias. Reunia fotografias de suas fases editorial e corporativa, de eventos familiares e íntimos. E a geolocalização não correspondia necessariamente à metrópole, mas ao coração de George Love.
A mudança de foco no fim da década não era o encerramento de um ciclo, mas o retorno à sua forma tradicional de criar manifestações a partir da seleção de fotografias feitas nos mais diversos contextos, desde observações casuais até trabalhos técnicos. A metodologia não se alterava, pois foi dessa maneira que produziu sua primeira mostra no MASP.
O elo era sempre sua presença e sua percepção interior. O trabalho na mesa de luz, ressaltado por ele em palestras da época, era uma quase terapia de resgate das impressões pessoais e de eleição dos tijolos importantes na construção de uma mensagem que brotava de seu íntimo. O assunto poderia ser um gato, um cachorro ou qualquer outro animal, mas o gato teria prioridade pela afinidade de George com essas criaturas. O momento, também, dizia respeito a um fato intimamente importante. Do cenário, chão ou poste, só o autor sabia o significado explícito, mas seus sentidos refletiam no observador que convivia com os mesmos ícones. O que prendia a atenção não era o tema em si, que poderia ser trivial, mas a sua transposição em fotografias carregadas de mistérios, que seriam interpretadas conforme a experiência particular de cada observador. George Love era explícito, não era documentação, mas expressão pessoal.
Pouco depois da exposição Diários, ele foi trabalhar com o acervo documental da companhia de energia elétrica. As chapas de vidro e os velhos filmes receberam um tratamento moderno, que não poderia ser chamado de restauração, como ele dizia por conveniência. Ele não tinha formação e retaguarda para tal, mas suas recriações em laboratório e na gráfica eram únicas e exclusivas e resultaram no precioso livro São Paulo — Registros.³⁴
Livro São Paulo – Anotações, capa e contracapa, 1982. p. 82-83, p. 70-71, p.100-101
Como complemento contemporâneo harmonicamente elaborado, um segundo volume reuniu uma seleção mais extensa dos Diários de George Love, sob o título São Paulo – Anotações.³⁵ Eram dois livros além do seu tempo, que extrapolavam o rígido plano documental. Essa percepção é notória ao se comparar a parte visual com o texto de abertura do livro pessoal. O belo ensaio de Benedito Lima de Toledo descreve São Paulo da época e dá uma pincelada em sua curiosa origem, mas sua forma convencional contrasta com a seleção de fotografias, que não seriam meras ilustrações. Sua inclusão seria mais um exemplo do recurso a um ensaio literário para dar suporte a um trabalho fotográfico, o que era certamente dispensável. Mais sintonizado com a parte visual está o texto do próprio George, que aponta para a sua experiência particular como orientador da edição. É esse o melhor caminho para interpretá-lo.
Este livro representa uma seleção de fotografias tiradas entre setembro de 1966 e os primeiros dias de fevereiro de 1982; atravessando o tempo desde o momento em que, pela primeira vez, tentei um contato com esta cidade – para mim estranha e intimidadora ainda hoje – até quando ela e eu fizemos as nossas pazes, embora não sem alguma estranheza mútua. Usando uma velha expressão americana, diria que concordamos em discordar.
As fotos cruzam o espaço de quatro fases; não em ordem cronológica, às vezes em paralelo, mas nem por isso deixando de definir quatro facetas da vida que tive aqui.
A primeira é de formalismo, abstrações planas e exposições múltiplas, nas quais percebe-se a preocupação com o sentido da passagem do tempo. Tal é a primeira, onde a cidade nasce debaixo de uma pintura de si mesma.
A segunda é jornalística: enfrento desconhecidos, quase brutalmente. Típica é a sequência de pessoas andando perto da Praça do Patriarca, ou as famílias no Brás.
A terceira é de introspecção, talvez não muito acessível ao observador, pois, na hora, o observador mais interessado fui eu, e não tinha interesse em traduções. Uma foto de águas claras, com uma sombra mal definida, retrata minha própria sombra, e naquela hora pensei que estava fotografando pela última vez na minha vida. É melodramático, mas verdade.
No fim, algo mais simples, casual: um desejo de falar com outros e de escutar. Na noite de Ano-Novo de 1982 fotografei um presépio numa sala escura tendo ao lado uma televisão com o rosto de um menino. Juntos, a tradição e o transitório: a passagem do tempo. Depois, os meus gatos brincam e brincando assinam para mim o meu trabalho. Gatos brincando falam muito da minha filosofia do momento. Mais uma página, o dia termina, e com ele o livro. Fecha.³⁶
A intimidade com a obra de George Love permite-nos identificar imagens de trabalhos da sua fase editorial, da corporativa e mesmo de vários momentos particulares. São muitas referências pessoais, de importância exclusiva, que remetem às experiências de mais um cidadão entre milhões, incógnito e camuflado na metrópole, esta também com identificação sutil. Sua força principal está na forma usada para compor seus diários e anotações. Poderia ser de qualquer lugar e teria sentido equivalente, porque empresta este termo da tradição que remonta a Stieglitz.³⁷ Mas é São Paulo, a São Paulo de George Love, alimentadora de seus conflitos internos e provocadora de seus reflexos fotográficos. Por ser a sua cidade, seus eventos privados são importantes. E, como ele é a referência, desfruta a liberdade de incluir imagens de locais distantes da própria cidade. A namorada em seu refúgio aparece no portfólio da exposição. Seus gatos estão também ali e no livro. E as fotografias que assinam o trabalho nas capas de São Paulo – Anotações são da piscina e da vista do entardecer de sua casa em Sarapuí. ㅤ
Palestra durante sua exposição na galeria Album, de Zé De Boni, abril de 1980.
³⁴ LOVE, George; TOLEDO, Benedito L.; PONTES, J.A.O. Vidigal. São Paulo – Registros. São Paulo: Eletropaulo – Eletricidade de São Paulo S.A., 1982.
³⁵ LOVE, George; TOLEDO, Benedito L. São Paulo – Anotações. São Paulo: Eletropaulo – Eletricidade de São Paulo S.A., 1982.
³⁶ Ibid
³⁷ Alfred Stieglitz (1864 –1946), fotógrafo americano que influenciou gerações de artistas e cunhou o termo “equivalent” para identificar fotografias ou outras obras que remetem mais à percepção interior do autor.
“Life w Rosi + Gatão – Puí”: duas caixinhas de slides assim marcadas contam muito do lado emocional de George Love. Puí é Sarapuí, cidadezinha a duas horas da capital onde ele e Claudia construíram uma casa. Na separação, George ficou com o refúgio, onde imaginava seus “estudos do céu”, sua “floresta” particular, e desfrutava um cantinho de natureza com horizonte livre. Gatão é referência a um dos tutores filosóficos do fotógrafo, todos com nomes próprios, mas sempre chamados por esse apelido. Rosi é Rosilis, a jovem namorada, profissional de laboratório fotográfico que cuidou de todos os seus Cibachromes. As imagens, somadas a outras espalhadas em seu arquivo, revelam momentos de êxtase e a forte fonte de inspiração. Gatão, Rosilis e Sarapuí, todos aparecem em Diários e Anotações.
Sarapuí era uma vila com 1.200 habitantes em seu núcleo urbano quando foi descoberta por diversos artistas e profissionais criativos, incluindo George Love e Claudia Andujar. O casal construiu uma casa para desfrutar seu retiro da tensão metropolitana. Na separação, o espaço ficou para ele, que continuou usando-o como fonte de inspiração e recarga de energia. Uma série de fotografias experimentais, que ele chamava de “Sarapuí – A Floresta”, trazia variações sobre o tema da vegetação de um bosque local, que usou esporadicamente em apresentações. Ele também mencionava seu desejo de explorar mais seus “estudos do céu”, e era lá o local onde ele podia passar o tempo contemplando as nuvens.
Mais do que o espaço, a intimidade era o suporte motivacional para quem nunca absorveu direito suas perdas, de sua mãe e da sua grande parceira intelectual. Uma nova namorada trouxe de volta esse alento e a liberdade de traduzir em imagens toda a sensualidade de sua convivência. Essa fase com Rosilis acontecia no auge da carreira de George Love, entre a produção dos livros Amazônia e Anotações. E foi tão importante para ele que teve menção especial no segundo.
Após as edições para a Eletropaulo, ele exacerbava em confundir a importância de seu mundo particular com o coletivo, chegando a propor um trabalho que seria desenvolvido ali mesmo em Sarapuí, como notável centro de atenção. Em carta a Cornell Capa, do International Center of Photography (ICP), ele mencionava:
No ano passado, foram apresentadas duas propostas independentes. Uma delas propunha residir em uma pequena cidade, situada a uma distância moderada de São Paulo, por um período determinado, a fim de examinar as mudanças ocasionadas pela proximidade com a metrópole. Esse estudo envolveria a utilização tanto de fotografias antigas da área quanto de abordagens pessoais…³⁸
O encanto com Sarapuí e Rosilis terminou com sua mudança para o Rio, mas não por esse motivo. Mais tarde, ele sugeriria em suas anotações que todo o seu declínio seria decorrente da “perda de Pu픳⁹ . É comovente encontrar as tiras de um filme com imagens tão sem graça, guardadas em um envelope de laboratório assim rotulado: “The last pictures of Sarapuí” [As últimas imagens de Sarapuí].
Fotografia da série Life with Rosi + Gatão – Puí. ca. 1981.
Fotografia da série Sarapuí – A Floresta.
³⁸ Carta para Cornell Capa, 18 de junho de 1983 (aprox.). Coleção George Love.
³⁹ Anotações gravadas em computador, tópico número 115, 29 de maio de 1994. Coleção George Love.
George Love era asmático e dizia que a poluição de São Paulo o sufocava. Vivia ameaçando mudar-se. Certa vez, pediu a uma amiga para usar um apartamento vago no Rio de Janeiro, porque ia fazer um trabalho lá por um mês. Ficou um ano e meio. Ao lado de fotos aéreas comuns em formato 6×6, pode-se perceber que ele buscava uma aproximação visual com a Cidade Maravilhosa ao estilo de Anotações, com a vida anônima deslocada das ruas para as praias. Ficaram apenas suas impressões superficiais. Certamente, ele carecia de interlocutores e faltavam-lhe as pautas que garantiriam penetrar nas diversas esferas do ambiente urbano. Embora mantendo o domínio da percepção e reação aguçadas, o trabalho inacabado não ultrapassou o patamar de plágio de si próprio. Suas imagens transmitem solidão.
Nos relatos sobre sua chegada a Belém e depois a São Paulo, George Love empregava a palavra “horror”. Para uma pessoa com muita experiência internacional, talvez houvesse uma explicação escondida. Hoje, com a leitura de suas anotações particulares, podemos interpretar melhor certa tendência depressiva, surpreendente em um personagem tão carismático.
Outro lado pouco conhecido era sua permanente insatisfação com o lugar em que estava. Rosilis, em entrevista particular, lembrou uma frase do fotógrafo David Zingg: “O melhor lugar do mundo para o George é o lugar onde ele não está!”⁴⁰ . Seria inquietação, insatisfação ou dificuldade de adaptação? Ele sofria de asma, e a poluição urbana não lhe fazia bem. Mas isso não o barrou de viver longo tempo em São Paulo, amparado por corticoides e a providencial bombinha. A doença respiratória era um problema real não ocultado, mas beiram a ficção as histórias que construíram, dizendo que ele fotografava do ar devido a essa limitação. Essa lenda ignora que, para cada hora de voo, ele passava dias no solo, fosse em Belém, Santarém ou em uma aldeia, desconsidera o patente deslumbramento estampado em suas imagens e não tem correspondência em suas anotações. No início dos anos 1980, ele já apresentava sintomas da síndrome de Cushing, mas não conseguia desmamar a cortisona. A alternativa de mudança de ares era cada vez mais vista por ele como solução. Em carta para seu agente em Nova York⁴¹ , ele sugeria que poderia ser correspondente em outras cidades sul-americanas, como Lima ou Buenos Aires. Então, ele aproveitou a oportunidade oferecida por sua amiga e apoiadora Anna Carboncini⁴² para montar sua base no Rio de Janeiro. Seu arquivo daquela cidade tem muitas vistas aéreas em formato médio, outras panorâmicas, que sugerem trabalhos comerciais. Ele já tinha participado de um livro turístico⁴³ sobre o Rio na década anterior, mas essa fase, segundo ele, foi mais contemplativa e menos fotográfica. Seus cromos 35 do Rio mostram uma tentativa de se entender com a cidade, na terapia cotidiana bem ao estilo do que desenvolvera em São Paulo.
Ficou o embrião de um trabalho nunca usado em suas edições. Desconhecem-se suas agendas da época, mas certamente não tinha lá a rede de contatos, amigos, clientes e apoiadores. O Rio foi um isolamento, uma fuga que durou até que ele sentisse falta do chão que o sustentava. Em São Paulo a realidade já se alterava desde antes de sua partida. As fontes de trabalho e, especialmente, os grandes patronos de sua produção vinham progressivamente se dissipando.
Fotografias do Rio de Janeiro, data indeterminada.
⁴⁰ Entrevista gravada em vídeo no estúdio de Zé De Boni em 11 de abril de 2022. Arquivo Zé De Boni.
⁴¹ Carta para Kay Reese, 28 de junho (1981, provavelmente). Coleção George Love.
⁴² História contada pela própria Anna em conversa informal com Zé De Boni em 2022.
⁴³ Segundo anotações de George Love, foi um livro da editora Kosmos (Rio de Janeiro, 1976), informação pendente de confirmação.
A última exposição de George Love no MASP, em 1984, foi um delírio. Era uma linha de argumento pichada nas paredes, acompanhada de exemplos. A grande elocubração era propor o uso de câmeras de formato muito pequeno, filme 110, para criar trabalhos fotográficos de forma acessível, com um quarto do valor do salário mínimo. A tese revelava sintonia com a proposta do colega Scott Hyde de criar fine art a preços módicos e uma busca pelo acesso popular ao uso da fotografia como expressão, muito antes dos celulares com câmera. Incluía explicações sobre a quantidade de informação capturada em um fotograma minúsculo, pouco sustentáveis ainda na época. Mas, em sua defesa, encontramos imagens interessantes de filme 110 em seu arquivo, que não foram usadas naquela exposição.
A genialidade de George Love era sempre enaltecida por Bardi em suas cartas de apresentação. E, quando algum de seus projetos agradava ao mentor, ele tinha praticamente carta branca para a realização no espaço do MASP. Os temas que lhe vinham à mente apontavam para todas as direções, a exemplo da mostra sobre antigas farmácias e medicina popular, que está relacionada em seu currículo.⁴⁴ Outras propostas nunca saíram do papel, como uma exposição sobre as antenas da cidade, lembrada por Dan Fialdini,⁴⁵ com nítida implicação filosófica do florescer da era da comunicação. Outro evento que não vingou seria uma projeção e ambientação propostas para 1984, cuja descrição trazia este trecho:
A exposição se desenvolve contra um pano de fundo de imagens que não as são; luz pura, projetada e às vezes intercalada “a esmo” com determinadas imagens de hoje; com uma trilha sonora tirada do Pink Floyd; e com paredes ou divisórias, sobre as quais são intercalados “quotes” do Platão e do OrwelI (nem sempre do livro 1984, pois ele escreveu bastante, embora em geral deste). Tais “quotes” são pintados à mão em cores.
Cria-se, portanto, o clima de uma conversa inédita: uma conversa a três, entre Platão, Pink Floyd e George Orwell, sobre a possibilidade de o homem conhecer o futuro do seu mundo, e onde conceitos como a linha entre essa realidade e a ilusão, a possibilidade de realmente perceber a realidade e até mesmo a utilidade dessa tentativa entram e são, de forma alegórica, examinados.⁴⁶
Entretanto, ainda em 1984, ele fez o que seria sua última exposição no MASP. Em Metade da Metade, ele propunha meios de explorar as virtudes da fotografia de forma acessível. Assim descrevia o press release:
Dois aspectos justificam este evento e seu respectivo nome. O primeiro deles é o fato que se tenta mostrar a possibilidade extremamente à mão de se fazer fotografia (atividade de custo extremamente alto) gastando algo bem abaixo do imaginável. Uma justificativa pragmática, portanto. Outro aspecto é o comportamental, na medida em que a necessidade de expressão é flagrantemente intensificada em épocas de circunstâncias tão adversas como a presente. Da realização dessa necessidade de expressão depende a própria sobrevivência do indivíduo enquanto ser humano, e Metade da Metade, aplicável a qualquer outra arte, mostra como isso se liga unicamente à criatividade.⁴⁷ Plano geral da exposição Orwell, 4 de abril de 1984. Coleção George Love. O que George Love pretende neste evento é proporcionar um entrosamento educacional que, ao resgatar os princípios (até mesmo físicos) fundamentais da fotografia, possibilite a criação de novas alternativas de produção a custos muito reduzidos e de realização literalmente doméstica… Por outro lado, existe a preocupação de participar sua pesquisa com fotografia de baixo custo, desmistificando a aura que emana por trás de todo trabalho ou exposição apresentado de forma acabada e, portanto, fechada.⁴⁸
Era uma apresentação absolutamente insólita no museu, com uma análise informal escrita nas paredes, acompanhada de exemplos de simples retratos e imagens de seu portfólio ali pregados, sem cerimônia, com alfinetes. O argumento tinha pontos frágeis e circunstanciais, mas a intenção era autêntica, refletindo a crise econômica e o próprio declínio. Vale reproduzir sua tempestade cerebral:
É a Ângela. Ela é importante.
Comecei assim 13×18 cm; 10×12 cm. Pesada.
Mudei para 6×6; também.
Mudei para 35 mm. Ainda pesou; demais, às vezes, pensei de 110 (12,5×17 mm).
Logo disseram: Louco! 110 é pequeno demais!
Fiquei rindo… Pesquisei. Fazer pesquisa, na pesquisa, terá falhas. Aprende delas, quem teme a falha nada faz; pior, faz mal e finge que é bom (formato novo, criatividade idem).
O 110 baixo custo, poder criar; mostrar o seu que existe. Aí a Ângela. (no fim) sempre pesquisei. Todo feito é aprendizagem.
Este estranho jogo tem nome: packing density… Como por + sinais de informação. …Informática (non digital, pois dígito tem limites, e a gente joga aqui sem limites) em menos espaço. Que começou isso e isso, que não deram certo! Aprende, repensa. Dá um tempo.
Agora, menos filme, menos dinheiro. Comecei uma pesquisa (a mais!), de alegre, com o MASP + o laboratório Procolor para: com Cr$ 25.000 – 1 máquina, 1 filme, revelar, e fazer 1 ampliação 30×40 cm.
Um pouco duro, né? No começo era… Falhou… Idem… De novo.
Invert signal increase size of negative.
Da Cris… Michelle 3×5,5 mm… Zizi.
Aqui 1ª geração… 2ª geração… Tudo veio daqui.
Veio um novo filme. O Fuji HR100 em 110, 24 chapinhas. Eu os chamei “micro-chips”. E novas ideias.
3ª geração…
E Ângela… Da metade do negativo no 12.
Dá para ampliar um pouco mais: 1m x 60, por aí. Não há limite inerente… 3 mm.
O tamanho dá 1/2 do mínimo. 4 a 12 mm… Um outro tipo de chip com bastante informação. Informática especial… Não precisa computador: anda junto com ele.
Interesse para pesquisar. Computadores às vezes eram; sou – digo, não bonito, mas sei lá, feio assim (?)… Não era “erro”. Tentou jogar s/ limite, mas tem. +/- 300 mm… É 8 ou 80.
Hoje, dia 10-9-84; 10 meses 10 dias mais tarde 1 máquina + 1 filme + revelação e 1 30×40 = 35 a 40 mil (posso mostrar). A nossa inflação é m/m 5,5% por mês. Ok?
Fotografe: conforme reduz o espaço, reduz o custo. Cinema, vídeo… Mas buscar sua linguagem! Age. Faz o seu mundo!
George Leary Love.
George reforçava ali, nas paredes e em palestras, o mote de sua dedicação aos cursos que conduziu por anos no próprio MASP e em outros locais. Fascinado pelo poder da imagem, ele vislumbrava um mundo não de consumidores passivos, mas onde cada cidadão pudesse ativamente fazer uso dessa ferramenta para sua expressão. Isso muda radicalmente a carga do termo egocêntrico, empregado na definição de seu próprio trabalho. Com toda a fragilidade de sua análise tecnológica, que à luz dos anos seria contradita, Metade da Metade era uma celebração e uma antevisão do uso disseminado da fotografia, muito antes dos celulares, do Instagram e de outras redes de distribuição de imagens pessoais, para transmitir impressões particulares e, consequentemente, as mais variadas expressões.
Documentação feita por George Love da exposição Metade da Metade (MASP, 1984).
“É a Ângela. Ela é importante.” Fotografia que abria a exposição Metade da Metade (MASP, 1984). Ampliação original em transparência.
Claudia Andujar fotografando jovem Yanomami, ca. 1974. Imagem em filme 110 da Coleção George Love.
⁴⁴ Currículo escrito em 1o de setembro de 1986, documentado em seu acervo de imagens. Coleção George Love.
⁴⁵ Conversa informal com Zé De Boni, maio de 2023.
⁴⁶ Plano geral da exposição Orwell, 4 de abril de 1984. Coleção George Love.
⁴⁷ Press release da exposição Metade da Metade. Coleção George Love.
⁴⁸ Documentação feita por George Love da exposição Metade da Metade, 1984.
Ensinando fotografia, cheguei a afirmar que toda fotografia assim chamada boa conseguiu ser um autorretrato puro e simples. E que era através desse egoísmo, ideia do autorretrato, que o fotógrafo tentava chegar a um termo de entendimento com o mundo.
Essa explicação de George Love é fundamental para compreender sua obra, especialmente o livro de 1985. Em Service Order 8696 – The Amazon Basin from the Air, ele retoma a Amazônia, reconhecendo-a como imagem de si próprio, elevando a importância dessa edição limitada. A impressão digital mimetizada pelas águas de um rio entre as primeiras fotos dá combustível a essa interpretação, enquanto a citação bíblica demonstra que ele se dirigia à posteridade. Já o título é mais um enigma sobre o qual só nos restou especular.
Contrapondo seu questionamento feito no ano anterior sobre trabalhos acabados, George Love voltou ao tema amazônico em 1985, selecionando uma sequência de imagens para uma publicação exclusiva de tiragem limitada da gráfica Pancrom. Era um resumo da sua obra maior, de que emanava uma aura de mistério, como seu primeiro livro, acrescentando um enigma embutido no título: Service Order 8696.⁴⁹
Os poucos textos que trazia potencializavam essa impressão. Eram alguns versículos de São Lucas (11/33-35 e 12/2-3), uma parábola escorada na luz e no olho. Uma frase de seu amigo Charles Capelle interpretava a realidade como projeção do imaginário:
Você vê o que você pensa que vê. E o que você pensa que vê é real.
E, nas palavras do próprio autor, seu trabalho transcendera do plano real para o onírico.
Tal infinitude não pode ser fotografada. Logicamente, é permitido ter sonhos. Eu não fotografei. Eu devo ter cochilado e sonhado.
A nostalgia das palavras é sentida na edição. Não são apenas favoritas, cada foto escolhida era simbólica de seu envolvimento em todos os planos, do profissional ao sentimental. Em apenas 26 fotografias suas grandes fascinações estavam presentes: as dunas submersas do Rio Negro, as praias e os bancos de areia do Tapajós, a incrível maré verde, a visão sobre as Anavilhanas, um rio tortuoso e as corredeiras, sua favorita, chamada Chuvisco. Ainda incluiu referência à publicação na revista Camera e à memória da janela do Catalina. Seu domínio daquele território era representado pela escolha de uma cruz virtual formada pelos pontos-limite, simetricamente posicionados na sequência, do Marajó até a fronteira com a Colômbia, e do norte de Roraima, que abria a série, até o sul do Pará, no encerramento. Ele chegava do céu e finalizava em busca da luz.
O epílogo são duas fotografias sobre o Rio Xingu tomadas desde muito alto em avião de carreira, uma típica visão de despedida de um local intimamente explorado. O autor contempla uma vista equivalente à narrada por sua mãe, mas o que ele vê é o filme de uma vida intensa naquele mundo lá embaixo em busca da imagem primordial. A Amazônia vista do alto é a sua assinatura, sua identidade, seu autorretrato irretocável.
Para completar esse sentido místico, a abertura da sequência inclui a figura de uma impressão digital magicamente esculpida pela luz nas águas escuras de um rio. Se isso parece uma interpretação forçada, George usaria a mesma imagem como assinatura no início e fechamento de um PhotoCD que fez anos depois, com sua última escolha da Amazônia.
Service Order teve tiragem pequena e distribuição limitada. O número 8696 aparece em algumas pastas de fotografias que George Love deixou, sugerindo que ele imaginava repetir a ideia. Também em suas anotações o número estava eventualmente listado entre seus projetos possíveis, como uma reedição ou mesmo sob um novo tema. Faltaria apenas decifrar seu significado para completar a interpretação e um caminho estava em uma gaveta sob o computador que ele usava em Mamaroneck.⁵⁰ Uma pequena carteira com suas fotos de identidade feitas no Brasil tinha o tradicional aviso no final, algo como: “Se precisar de mais fotografias deste trabalho, peça pelo número – OS: XXXX”. OS é Ordem de Serviço. Seria a última peça do quebra-cabeças, que se encaixaria perfeitamente no conceito do autorretrato de George Love. Entretanto, o número não foi anotado, todo o material que estava lá foi entregue à Universidade da Carolina do Norte em Charlotte, mas em sua coleção não consta a carteirinha de PVC, apenas seus retratos de diversas fases museologicamente acondicionados. A falta de confirmação não anula a interpretação proposta, porém permanece indecifrada a origem daquele número mágico. Mas por que explicar tudo de um autor que primava pelos mistérios e era eminentemente enigmático?
Livro Service Order 8696. O estojo trazia um caderno com 26 imagens e uma fita cassete com sons captados por George Love na Amazônia. UNC Charlotte J. Murrey Atkins Library
⁴⁹ LOVE, George. Service Order 8696 – The Amazon Basin from the Air. São Paulo: Pancrom, 1985.
⁵⁰ Zé De Boni hospedou-se no mesmo quarto na casa de Barbara Livesey em 1997, quando seu objetivo não era tanto pesquisa, mas relatar à ex-companheira de George os episódios de seu último ano no Brasil, de que ela pouco tinha conhecimento.
A exposição Vistas do Alto foi um complemento ao livro Service Order. Funcionava como a afirmação derradeira de quem estava prestes a seguir novos caminhos. Logicamente, podemos chegar a essa conclusão depois que os fatos a tornaram evidente, pois em pouco tempo George Love se retiraria de volta para os Estados Unidos. Reprocessando a sequência de imagens, com reminiscências do trabalho em Pajatén e na revista Realidade, foram feitos internegativos para produzir as ampliações em papel fotográfico colorido. As novas cópias feitas para esta retrospectiva usam o mesmo processo da época, a partir dos internegativos originais.
Era despedida de fato, explícita, que dava mais sentido ao livro que estava sendo produzido quase simultaneamente. Pela primeira vez, George Love incluía abertamente imagens de destruição, ainda que exploradas esteticamente. Talvez mais correto seria interpretar como uma rendição da sua insistência pela pureza, considerando seu argumento na apresentação de sua exposição Vistas do Alto:
Para mim este século é o último onde ainda há uma interrelação entre o homem e a natureza na Terra. Essa interrelação traz grande benefício aos homens mas, aqui, parece que os beneficiados não ligam muito para isso. Já que a gente não pode fazer quase nada contra a destruição, foi para registrar, para ter uma memória desse momento e dessa interrelação que eu fotografei a Amazônia.⁵¹
As palavras contrastavam com todo seu discurso anterior, como um remorso de abdicar do seu egocentrismo e pensar no valor documental do trabalho. E a escolha das imagens parece também diferir da sua linha tradicional. Sua tese se decompunha e, a partir daí, sua busca era por se mostrar útil, realizar coisas reconhecidamente importantes, qualquer que fosse a direção. Mas a fotografia se apresentava como decepção, como ele revelava na mesma exposição:
Esgotei tudo sobre fotografia. Já explorei tudo que ela tinha para me oferecer. Agora tenho que expandir. E para expandir, no nível da fotografia, me restou a comunicação.⁵²
Vistas do Alto foi realizada em local conveniente, mas deslocada do grande circuito. A exposição no Salão Fuji lhe garantia o apoio da produção das ampliações, em uma fase que ele gradativamente se sentia desarticulado. Com grandes pretensões para seu arquivo de imagens não só da Amazônia, ele ainda tinha que provar para o público o mérito que, em um ambiente culturalmente maduro, dispensaria apresentações.
É dessa exposição a descrição romântica que ele faz da experiência de fotografar a imensidão desde pequenos aviões, a qual nunca nos cansamos de relembrar:
As portas são retiradas do avião. O vento entra direto. Não tem jeito de conversar… Você conversa com o piloto, que está lá na frente, por sinais. Você sobe. Meus ouvidos começam a doer por causa da altura. Doem tanto, por tanto tempo, que eu esqueço que estão doendo. Você entra e sai de nuvens. A chuva bate nos apoios das asas do avião e faz um som estranho. Você escuta este som e de repente não sabe mais onde está, porque tudo é branco ao redor. Você está numa nuvem. Daí você sai da nuvem, olha para baixo e vê só árvores. De repente está numa outra nuvem. Você sai dela e vê mais árvores. De repente, chuva. A chuva, naquela velocidade, dói quando bate no rosto. Você protege a máquina, mas a si mesmo não pode. De repente você lembra que os seus ouvidos estão doendo. Aí, você está dentro de uma outra nuvem, e a noção de tempo já não existe mais. Agora você está verdadeiramente na sua. Não existe mais tempo nem espaço. Não se sabe bem se está voando alto ou baixo. Naquele instante, você começa a fotografar aquilo que é somente e particularmente seu. O piloto sente o mesmo. Ambos agem como um time. São dois corpos com uma cabeça. Um bom piloto lhe coloca no ângulo certo, e aí você vai disparando… clack… clack…⁵³
Se parece penoso e arriscado, mais crítico era investir tudo o que ganhava naquele empreendimento. Mas, por isso mesmo, na Amazônia ele foi livre, sem o compromisso de satisfazer quem quer que o bancasse. Sua desistência acontecia quando novas oportunidades surgiam com a criação de leis de incentivo à cultura. Mas, da mesma forma, o mercado estava mais povoado por uma geração nova, pela qual ele tanto batalhou, que impunha uma concorrência mais adaptada ante o seu romantismo centralizador. Sem muita formalidade, pouco depois do livro e da exposição de 1985, George Love saiu da cena paulista e brasileira, retornando à sua velha Nova York.
Cartaz da exposição Vistas do Alto, Salão Fuji, São Paulo, maio de 1985.
⁵¹ OLIVEIRA, Moracy R. de. “A Amazônia bela e irreal, pelo alto”, Jornal da Tarde, 14 de maio de 1985.
⁵² LOVE, George. George Love: Imagens entre a Realidade e a Ilusão, Momento Fuji, maio de 1985.
⁵³ Ibid
Em 1986, George Love voltou para Nova York e dependeu de amigos para se acomodar com a mudança trazida do Brasil. Reescreveu seu currículo, mas estava desarticulado do mercado local. Apresentado a Barbara Livesey, instalou-se em um dos quartos que ela alugava em sua grande casa em Mamaroneck, cidade da periferia. Envolveu-se com essa professora de história do tecido e recebeu o apoio de que tanto necessitava. Ali ele tinha uma vida doméstica, dividindo computador e telefone, e continuou fotografando bastante. Entretanto, não demonstrava atividade profissional, passando longo tempo em seu quarto. Produziu um documentário para a TV comunitária com comparações entre fotos do Amazonas e de um rio da região, que citava no currículo como grande realização. E fotografava sua intimidade, evidenciando o contraste com seu passado em São Paulo e Sarapuí.
Havia algo muito estranho quando George Love falou que estava parando de explorar a fotografia. Seus admiradores, colegas e amigos não compreenderiam, assim, no condicional, porque a declaração passou batida. Autossuficiente e altivo, ele não tinha o hábito de repartir decisões ou receber conselhos. Desfez-se de equipamentos, deixou alguns pertences com amigos, em geral parte de seu acervo, reuniu o máximo que podia e mudou-se para os Estados Unidos.
Barbara contou que ele estava muito mal instalado quando ela o conheceu. Logo ele se alojou em um pequeno quarto da casa dela na Beach Ave.⁵⁴ O galante fotógrafo era atração entre os inquilinos da mesma casa, especialmente do sexo oposto. Mas foi com Barbara que criou laços, e a partir daí ele desfrutou tranquilidade e acolhimento. Seu quarto era lotado com as coleções, livros, fotos, equipamentos. Passava longo tempo lá trancado e usava o Macintosh disponível na sala principal. Seu arquivo mostra que ele continuava fotografando e ainda tinha interesse por pesquisar processos fora do eixo. Explorou as características do Polachrome, seguindo seu princípio de extrair de cada material suas possibilidades em vez de tentar imitar tecnologias antecessoras. Assim ele via a fotografia eletrônica, incipiente quando ele a testou:
Eu fiquei um consultor para a Sony um tempo lá, fazendo o trabalho da fotografia eletrônica. Vou te falar uma coisa, que pelo menos até agora eu acho que daqui a pouco este panorama vai mudar, mas até agora a fotografia eletrônica fede! Porém, dá para fazer coisa boa. Porque coisa boa sai quando ela é usada para ela e não em um esforço para imitar os resultados do filme.⁵⁵
Como bom ilusionista, ele lançava mão de uma sabedoria para mascarar a precisão da informação, em exemplo claro das armadilhas em que historiadores podem cair quando seguem literalmente afirmações categóricas de promoção pessoal. O uso da palavra consultor é um exagero para quem fez apenas um teste de um equipamento específico, e todo profissional de fotografia sabe como essa relação funciona. Uma publicação de marketing da empresa trouxe uma entrevista sobre o teste com a opinião de dois fotógrafos e, na apresentação, George dizia que ele estudou para ser físico nuclear, uma “novidade” então. ⁵⁶ Em seus últimos currículos, George incluía essa consultoria e dava destaque à produção de um documentário para uma TV comunitária local. ⁵⁷ Mas aquele vídeo não gerava um espectro da repercussão que ele tivera nos bons tempos; era uma obra particular para audiência limitada, e a própria emissora não conservou a peça. Restou apenas a memória oral da descrição de sua criação, em que comparava a foz do Amazonas com um pequeno rio local: The Mouth of the Amazon Is in Rye.
O contraste entre a significância desses tópicos de currículo com as grandes realizações que o projetaram revela o estado de desalento que abatia alguém que sempre teve necessidade de ser importante. De fato, com a saúde comprometida, vivendo de uma pequena pensão e sem perspectiva, ele tinha consciência de estar iludindo a si próprio. Retomou contatos no Brasil em busca do tempo perdido e apareceu por aqui em 1992, aproveitando a cortesia que ainda tinha para passagens aéreas. Vem, vai, vem, vai e, de surpresa, especialmente para Barbara, no início de 1994 juntou todas as coisas que conseguiria despachar e voltou definitivamente para São Paulo.
Momentos da vida doméstica com Barbara Livesey, ca. 1988.
Pesquisa visual em Nova York, entre 1986 e 1994.
⁵⁴ Entrevista de Barbara Livesey a Zé De Boni em maio de 2013.
⁵⁵ Entrevista de George Love a Zé De Boni, ca. 1993.
⁵⁶ Recorder, volume 1, number 3, verão de 1988, publicação da Still Image Systems, Sony Information System Company.
⁵⁷ LMTC, Larchmont, Mamaroneck Community Television. Boletim e programação de junho de 1993.
Na mesma época em que mostrava seus Diários e Anotações sobre São Paulo, George Love realizou no MASP uma instalação chamada Ilustrações para os Diários de Kafka. Citações ao escritor circundavam um projetor que exibia imagens angustiantes, representando seus conflitos na mesma metrópole. Os slides foram preservados, mas sem a marcação de sequência e o som. Sua exibição é, portanto, uma recriação não fiel ao projeto original. Analisando seu acervo e seus documentos, ficam evidentes outros dramas fotográficos que George deve ter sentido, e assim foram elaboradas três projeções complementares. Os textos na parede são extraídos dos diários e das anotações do próprio fotógrafo e revelam questões existenciais que sua altivez escondia. A entrevista gravada em 1993, época de suas maiores crises, mostra a personalidade eloquente e radiante de George Love.
Projeções:
Ilustrações 1 é a série original dedicada a Kafka.
Ilustrações 2 é sobre a degradação da Amazônia, que George raramente mostrou. Era sem dúvida doído, mesmo para quem um campo queimado podia ser igualmente fotogênico.
Ilustrações 3 é o conflito da destruição de Sete Quedas para a construção de Itaipu, ainda que George se anestesiasse com explicações lógicas.
Ilustrações 4 é o seu drama na volta para os Estados Unidos, onde presenciava uma natureza muito mais pobre que seu alter ego amazônico.
Os diários e anotações de George Love, escritos à mão ou datilografados, são muitas vezes difíceis de decifrar.
Apontamentos de conversas telefônicas, rascunhos de cartas, agenda de encontros, receitas médicas, listas de compras, trabalhos e projetos, tudo se mesclava. Elencados em tópicos geralmente numerados, chegavam a dezenas de coisas para lidar concomitantemente, às vezes inseridas em uma mesma data. Propunha trabalhos sobre coisas de seu interesse, que ele imaginava poder ter receptividade entre clientes determinados em um leque de assuntos que ia além do campo da fotografia, como sugestões para o desenvolvimento de um carro para a Volkswagen.⁵⁸
Em um momento, sua lista de projetos editoriais tinha 38 itens, dos quais somente um vingou, The Amazon Basin from the Air. Vivia esse turbilhão nos anos antes de sua partida para os Estados Unidos. Quando retornou a São Paulo, retomou de onde parou e intensificou mais ainda sua busca quase desesperada por sustentar-se com trabalhos de grande relevância. Suas listas, ainda em cadernos ou já no computador, só aumentavam, incluindo fotografar o eclipse solar em Itaipu e uma viagem pelo Trópico de Capricórnio ou pela América Latina para promover o carro a álcool. Falava de levar à ONU essa solução energética, item anotado em seu currículo, bem como uma tal “vermiculita”!
Incorporando novidades tecnológicas como a fotografia digital, teve o sucesso ocasional de realizar para uma revista de erotismo o primeiro ensaio distribuído em disquetes de computador no Brasil.⁵⁹ Motivado por esse evento isolado, tomou a iniciativa de propor a transformação das revistas da editora em produtos de mídia eletrônica a serem distribuídos em CDs ou pela rede (network). Antevia o tipo de equipamento necessário para a produção e para o consumidor, como também os assuntos de matérias e novas publicações, sempre relacionando temas que lhe eram familiares e de seu interesse pessoal. Essas propostas eram dirigidas a executivos da editora, a quem George garantia que ele próprio poderia dar conta de cuidar da programação editorial: “… dado o equipamento necessário… eu podia montar uma publicação sozinho”.⁶⁰
A convicção em sua competência o faria criar a empresa Tiragem Limitada⁶¹ , projetando abordar aqueles mesmos assuntos em listas de desejos ou sonhos, que mais parecem delírios. Mas, aos interlocutores, isso talvez não transparecesse, pois exteriormente ele mantinha a postura altiva e o discurso empolgante, que pode ser testemunhado na entrevista gravada em vídeo nesse mesmo período. Ele disfarçava também o declínio físico acentuado, sofrendo silenciosamente, com a cumplicidade de sua nova companheira.
Seus diários revelam esse drama e ainda expõem a tendência depressiva de que mesmo as pessoas mais próximas não suspeitavam:
Estou me sentindo muito mal. Estou extremamente desidratado e não consigo me recuperar da gripe. Minhas glândulas estão muito inchadas, e estou enfrentando depressão intermitente, acompanhada de oscilações de humor… Alguém que sofre muito de alergias e vive em um ambiente repleto de poluição e estresse não pode esperar coisa melhor, nem afastar a crise. A única solução é partir. Minha convicção: a maioria dos meus problemas é alimentada pela neurose; a conexão neurótica não pode ser rompida na solidão. Como argumento em O Eco Humano, a solidão leva à perda de si mesmo, a um eu perdido. O ponto de partida é, evidentemente, a sensação esmagadora da incapacidade de fazer qualquer coisa. Existem infinitas coisas a fazer, mas a única coisa que me ocorre é passar mais tempo deitado no quarto de despejo de Marcos.⁶²
A afinidade com a literatura kafkiana fazia muito sentido e já era descrita no caderno da sua primeira viagem com Claudia Andujar ao Brasil. A própria mensagem de estímulo que ela enviou em dezembro de 1965 ganha outro sentido e combina com os episódios registrados por George em seu caderno. A manifestação parecia totalmente contida em seus dias de glória, mas, mesmo nessa fase, a separação de Claudia foi um trauma que o abalou a ponto de citar essa decepção até bem tarde na sua vida. No seu declínio econômico e físico, as inserções depressivas cresceram em número e drama nas suas notas, juntamente com a carência de percepção da dimensão do mundo exterior. Ao organizarmos sequências de imagens conflitantes em temas que eram tão importante para ele, é pertinente usar seus próprios textos como acompanhamento, conforme a fórmula que ele empregou na exposição dedicada a Kafka.⁶³ Ilustrações para os Diários de George Leary Love é uma homenagem ao gênio criativo e visionário que nos encantou quando a vida o traía.
Imagens das quatro sequências audiovisuais (Ilustrações para os diários de George Leary Love) preparadas para exposição no MAM em 2024. Os temas são: São Paulo, Amazônia, Itaipu e Nova York.
⁵⁸ Série de cartas dirigidas a Mattias, na Volkswagen do Brasil, 1984. Coleção George Love.
⁵⁹ Revista Playboy, outubro de 1994.
⁶⁰ Série de cartas a Thomas Souto Correa, 1994. Coleção George Love.
⁶¹ Minutas de contrato, janeiro e março de 1995. Coleção George Love.
⁶² Anotação de George Love, escrita originalmente em inglês, datada de 9 de abril de 1994, quando ele havia se reinstalado recentemente em São Paulo. Coleção George Love.
⁶³ LOVE, George. Ilustrações para os Diários de Kafka, MASP – Museu de Arte de São Paulo, São Paulo.
Após cerca de oito anos escondido, George Love retornou ao cenário paulista, tentando reativar contatos. Tinha muitas ideias profissionais que mais faziam sentido em sua cabeça do que aos seus interlocutores. Retomando a série amazônica, sua seleção definitiva foi digitalizada e transposta em um PhotoCD, assinado no início e no fim com a mesma impressão digital usada em Service Order 8696. Teve o apoio para viabilizar mais um livro, de inspiração mística, com imagens da mesma edição. Porém, sua saúde severamente comprometida não lhe permitiu cuidar de mais esse projeto, como sempre fizera, e tampouco ver o exemplar impresso. Pela forma como foi concebido e pelas circunstâncias da publicação, Alma e Luz – Sobre a Bacia Amazônica é o testamento final de George Leary Love.
Em meio às diversas tentativas visando a sua recuperação profissional e econômica, um caminho se abria em 1992. Ainda fazendo a ponte aérea entre os dois hemisférios, George Love tratava da produção de uma nova edição do trabalho pessoal da Amazônia. A proposta do livro era oferecida a possíveis clientes, e ele já imaginava várias opções de veiculação por mídias eletrônicas, traçando antecipadamente as possíveis sequências com a diversidade de assuntos de seu interesse.
Fica claro, lendo suas anotações, que, se ele tivesse campo livre para produzir obras em assuntos tão diversos, dificilmente teria sacramentado o forte vínculo de sua personalidade com a Amazônia. A história de George Love é um grande exemplo da consolidação de uma imagem construída pela percepção e receptividade de interlocutores, apoiadores e do público. Enquanto tentava abraçar o mundo com temas tão espalhados, ele era conduzido de volta ao seu assunto mais relevante, pelas circunstâncias oferecidas por sua rede de contatos. Se ele sofreu por não tirar proveito financeiro das mirabolantes ideias – que, afinal, não emplacaram na sua última década de vida –, seu sucesso ocorreu justamente com aquele tema que tocava de fato seu âmago, sua filosofia e o percurso de sua existência. Não era a Amazônia que seria mostrada no novo projeto, mas as reflexões místicas de George Love.
O trabalho tomava forma nas suas anotações, esboçando o estilo épico que artistas comumente adotam. Ensaiava inicialmente o título: “Every soul hungers after the light/All souls hunger for the light/Toda alma anseia para a luz… pela luz”.⁶⁴ Passou a se referir a ele como Toda Alma, ou mesmo TA.
Chegou a sugerir A Bacia Amazônica e a Mente Humana, ensaiando o discurso: “Este livro, bem como o texto nele contido, não é uma documentação da Bacia Amazônica. É uma obra de alcance universal.”⁶⁵ Esses conceitos amadureciam em 1994:
Toda Alma
O peso do texto é uma jornada pelo pensamento, da rejeição à integração + o meio ambiente, à aceitação. A Bacia Amazônica é escolhida somente – “somente” – como o veículo para essa viagem. Assim, o texto é trabalhado mais cuidadosamente do que inicialmente pensado… sendo em parte poético… da vida como um todo, sem falsa dualidade.
Parece correto que as referências derivem da “ciência nobre”. A ciência tem sido parte do problema da dualidade. Ao estabelecer uma aparente oposição entre o objetivo e o subjetivo, ela cria confrontos como ciência versus arte, versus religião ou fé, assim como uma desvalorização do desconhecido. Isso a opõe à aceitação do místico e cria o conflito entre mente e cérebro, entre outros.⁶⁶
Ali George Love mostrava sua contrição pelo que declarara em seu caderno na sua primeira viagem amazônica. Entre muitas passagens que citam depressão e sentimento de solidão, ele escrevera logo no começo uma pesada observação sobre as pessoas que se embrenhavam pelo sertão ao encontro de habitantes remotos: “As motivações dessas pessoas… continuam a ser um mistério… Sou uma criatura da cidade…”.⁶⁷
Entretanto, após tanto tempo amargurando a solidão em núcleos com milhões de habitantes, apesar de todo o seu sucesso e círculos de relacionamentos, ele elegia o ambiente amazônico como sagração de sua filosofia, sua fé e sua persona. Em um de seus últimos cadernos, ele ensaiou o argumento de seu novo produto:
Viajei durante 20 anos, mais longe do que qualquer distância, para ver um felino dourado revelar as lições gravadas aqui, uma por uma, e para perceber que absolutamente tudo é a única mesma coisa. O que denominamos meio ambiente é o Cosmos, e o Cosmos é Deus.
[…] Todo rio desemboca no mar, e o mar não enche; nem os rios param. Todo estudo, todo grito, toda prece leva ao Deus, e o Deus é infinito.⁶⁸
O projeto de publicação foi acolhido pela editora de Isabel Duarte, que passou a lutar por sua viabilização. George enviou a ela um rascunho do argumento:
[A Amazônia] é o cenário de diálogos onde a escuridão de águas repentinamente lembra o vazio, o caos, o princípio de tudo da Bíblia ou o buraco negro da física. Tais associações vêm da experiência de alguém que aborda a magia e força de Deus na criação, registrando com sua lente os movimentos, as cores e texturas da natureza e relacionando-os com o anseio da alma humana em sua trajetória em busca da luz.
(Estudo da física = leva a Deus Bel acho que pirei!!!!)
(Qualquer real estudo, levado às últimas consequências, nos deixa perante o mistério do divino. Não pirei; nem sô Rasputin [sic]).⁶⁹
Na prospecção por financiadores do livro, assim a obra era apresentada pela editora:
(O autor) conta como aprendeu, através de uma aproximação contínua, a respeitar e admirar esta natureza, chegando em certos momentos a reverenciá-la. Assim sendo, a aversão provocada pelo seu primeiro contato com a floresta foi sendo modificada e lapidada ao ponto de se tornar adoração, contribuindo para sua própria renovação e transformação pessoal… a preocupação foi manter a unidade cromática e a fidelidade ao conceito – “a busca incessante do homem para a luz”.⁷⁰ Infelizmente, embora ele tenha proposto essa concepção filosófica, George Love não se dedicou a escrever especificamente o texto para o livro como desejava. Com sua saúde se deteriorando rapidamente, ele não conseguiu seguir o cronograma proposto. O livro foi finalmente adotado pela Sadia por meio de sua grande apoiadora Cida Fontana, mas George não chegou a ver a sua concretização. Outro texto crítico foi providenciado, e o compromisso, cumprido, pela publicação post mortem de seu autorretrato definitivo: Alma e Luz.⁷¹
Livro Alma e Luz – Sobre a Bacia Amazônica, 1995.
⁶⁴ Anotações e correspondência do artista. Coleção George Love.
⁶⁵ Ibid.
⁶⁶ Ibid. Original em inglês.
⁶⁷ Caderno Diário da Viagem ao Território Xikrin, fevereiro de 1966. Coleção George Love.
⁶⁸ Ibid. (1).
⁶⁹ Ibid. (1).
⁷⁰ Ibid. (1).
⁷¹ LOVE, George; KLINTOWITZ, Jacob. Alma e Luz – Sobre a Bacia Amazônica. São Paulo: MD Comunicação e Editora, 1995.
1º de setembro de 1986
Introdução
Eu me formei tanto nas artes quanto nas ciências, na medida do possível, simultaneamente. Na época, não foi completamente intencional, mas acabou sendo benéfico.
Desde então, meu trabalho tem focado na união de objetivos técnicos e culturais. Escolhi a fotografia como minha ferramenta, evoluindo, posteriormente, para a comunicação, principalmente visual, o que exigiu o estudo tanto de disciplinas técnicas quanto de abordagens artísticas.
Por sua vez, isso despertou meu interesse pelo mundo ao redor, motivando-me, constantemente, a observar e registrar, novamente dentro das minhas possibilidades, o ambiente em que vivo.
É essencial comunicar essas observações a outros. A comunicação que carece de fundamentos estéticos ou culturais se torna estéril e, muitas vezes, é ignorada. Como a pura estética também é frequentemente desconsiderada se não estiver associada a um conteúdo com relevância ambiental, a integração desses dois interesses foi fundamental no meu trabalho. Esse esforço, somado ao meu desejo de me comunicar, evolui para um interesse em informar e não apenas transmitir mensagens. Passei a maior parte da minha vida fora dos Estados Unidos, meu país de origem, em locais onde os recursos eram frequentemente limitados. Isso obriga a pessoa a aprender a fazer mais com menos e, geralmente, a compartilhar esses conhecimentos com os demais. Para evitar a reinvenção da roda, é necessário também estudar um pouco da história. Considerando que, em muitas áreas, ainda estamos coletando dados, busco usar minha visão para reunir essas informações e preservá-las. Esses dados relacionam-se ao ser humano e ao seu ambiente. Essa abordagem é a única maneira de explicar meu interesse em temas aparentemente tão distintos como a cidade de São Paulo e a Bacia Amazônica.
Esta jornada pode levar muito além, se permitir; atualmente, por exemplo, estou interessado nos custos sociais da poluição, mas esse é apenas um interesse incipiente compartilhado por muitos pensadores mais avançados.
De qualquer modo, tomando emprestada uma frase, se todo gasto é gasto de energia, e se gasto de energia é gasto humano, o que já observei me leva a crer que todo gasto humano é, em última análise, um gasto de tempo.
George Leary Love
Nascimento
Estados Unidos da América, 24 de maio de 1937. Nacionalidade: americana
Estudos
– Universidade de Atlanta (Programa de Iniciação Precoce da Fundação Ford) [entre 1953 e 1956] – The New School for Social Research [Nova Escola de Pesquisa Social], Nova York [entre 1960 e 1962]
Formação
Matemática, filosofia, filosofia da arte, economia, informática
Entre 1957 e 1959, trabalhei como auxiliar no Programa dos Estados Unidos de assistência a universidades na Indonésia, com sede em Jacarta e atuando em todo o país. Em 1960, viajei para a Índia, Tailândia e Malásia.
Durante esse período, desenvolvi um fascínio pela fotografia, tendo registrado especialmente o monumento Borobudur, no centro-sul de Java. Após deixar o serviço governamental dos Estados Unidos, viajei pela Europa e, finalmente, me estabeleci em Nova York.
Nessa época, comecei a estudar fotografia e me tornei membro, chegando a ser presidente [vice-presidente] da Association of Heliographers [Associação dos Heliógrafos], um grupo americano que estabeleceu uma galeria de fotografia – eu diria uma das primeiras – durante o renascimento do interesse pela fotografia como forma de arte nos anos 1960.
Durante o mesmo período, organizei uma pequena equipe de campo de fotógrafos para o SNCC [Comitê de Coordenação dos Estudantes Não Violentos], um grupo americano de direitos civis, com o objetivo de documentar as mudanças sociais nos Estados Unidos, operando a partir de Atlanta, Geórgia.
Entre 1961 e 1965, dividi meu tempo entre Nova York e Atlanta, organizando e montando exposições para a Associação de Heliógrafos (o grupo incluía nomes como Paul Caponigro, Minor White, Wynn Bullock, Walter Chappell, Larry Clark, Syl Labrot, entre outros) e apoiando o SNCC na produção de filmes educacionais sobre direitos eleitorais, no desenvolvimento de um arquivo de fotografias e entrevistas gravadas, entre outras atividades. Esse trabalho de campo envolveu muito treinamento pontual e apoio logístico com laboratórios de campo. Um dos frutos desse esforço foi a organização da exposição Now, na Escola de Estudos Visuais em Nova York, da qual também participei.
Em 1962, viajei para o Brasil a fim de observar a construção de Brasília e, a partir dessa experiência, desenvolvi um interesse crescente pela América Latina.
Em 1966, mudei-me para São Paulo, Brasil, e continuei trabalhando tanto na América Latina quanto em outras regiões. Meu trabalho se dividiu entre projetos editoriais e corporativos para publicidade. Pessoalmente, comecei a me concentrar no centro da cidade de São Paulo e na Bacia Amazônica. Durante quase dez anos, dediquei-me a documentar a bacia através de fotografia aérea de baixa altitude e também registrei o crescimento urbano de São Paulo.
Frequentemente, faço muita experimentação com imagens fotográficas em espaços construídos, explorando transparência, movimento, óptica e fotoquímica, com especial interesse na durabilidade do processo colorido.
Como era meu costume supervisionar qualquer trabalho de impressão pessoalmente na gráfica e, às vezes, me envolver no design da diagramação, na encadernação, entre outras atividades, passei a considerar a durabilidade tanto do material impresso quanto da impressão fotográfica.
Por volta de 1981/1982, consegui colaborar com o Studio 5, em São Paulo, na produção de imagens impressas de alta durabilidade. Embora seja difícil estimar com precisão, uma durabilidade de mais de 200 anos parecia ser alcançável.
Em 1981, iniciei meu trabalho para a companhia de energia elétrica de São Paulo, que, na época, possuía um extenso arquivo fotográfico, iniciado nos anos 1890 e que continuou até cerca de 1950. A partir desse ponto houve um hiato na documentação, que estava ficando cada vez mais longo com o passar do tempo. Fui convidado para “preencher” essa lacuna com trabalhos meus produzidos entre 1966 e 1982 e para treinar um grupo documental na empresa, que se encarregaria de registrar o desenvolvimento da cidade até o ano 2000. Esse objetivo foi alcançado com a publicação de dois livros: um com meus trabalhos e outro no qual fui responsável pelos métodos de restauração utilizados. Para minha grande satisfação, o grupo documental continua a trabalhar até hoje, recebendo apoio crescente, mesmo após minha saída da empresa, no início de 1983.
O presidente da companhia acreditava que esse arquivo contínuo e bem documentado seria extremamente útil para o estudo da energia e da sua interação com o meio ambiente e com o desenvolvimento, especialmente porque o arquivo cobria todos os aspectos do crescimento urbano. Essa visão foi, em parte, intuitiva e instintiva, não solicitada; mas parece bastante plausível.
Desde 1983 até o presente, trabalhei em diversas áreas, focando principalmente em aumentar a versatilidade e reduzir os custos da fotografia e da comunicação visual em geral. Além disso, desenvolvi um interesse incipiente nas interações entre texto e imagem e também nas ciências físicas. Exemplos do meu trabalho nessa área incluem uma exposição que ilustrava trechos dos Diários de Franz Kafka e pesquisas extensivas no uso de filmes de pequeno formato e baixo custo, como o 110.
Projetos especiais
1. Três calendários institucionais para a Mercedes-Benz no Brasil, focando na Bacia Amazônica, na arqueologia brasileira e no povo brasileiro, para os anos de 1973, 1974 e 1975. Os projetos sobre a Bacia Amazônica e a arqueologia brasileira foram particularmente interessantes. No caso do segundo, desenvolvi técnicas ópticas inovadoras para aprimorar as imagens de arte rupestre em cavernas que foram posteriormente dinamitadas.
2. Editor de fotografia para a revista O Bondinho (São Paulo) e como editor da revista Fotografia (São Paulo). Experiência considerável em gestão editorial entre 1969 e 1973.
3. Fotografias no Chile, Colômbia e Argentina para filmes de TV animados para a Braniff World Airlines.
4. Fui responsável pelo design do pavilhão da Olivetti do Brasil em 1970 e 1972. Esse trabalho envolveu um conceito total, abrangendo arquitetura, expografia, supervisão da construção e acompanhamento durante feiras industriais. Em ambos os projetos, usei imagens projetadas e, no primeiro, elas se moviam em ambas as direções sobre um telão de 360 graus que cercava o pavilhão.
5. Realizei o treinamento do grupo documental do SNCC (de direitos civis) para registrar a mudança social nos Estados Unidos com o progresso do movimento de direitos civis. Forneci laboratórios de campo, frequentemente improvisados, realizei uma organização rudimentar de arquivos e gravei uma grande quantidade de fitas de áudio.
6. Trabalhar na organização do grupo, em conjunto com profissionais altamente qualificados, foi o aspecto mais enriquecedor dos anos que passei na Heliography Gallery [Galeria Heliografia]. Em 1977, organizei e montei uma exposição póstuma dedicada a Syl Labrot, um dos destaques do grupo, no Museu de Arte de São Paulo.
7. Portfólio Hileia Amazônica para a coleção FormaEspaço, em São Paulo. Essa obra, realizada diretamente sobre as separações coloridas pelos diretores de arte, foi um processo especialmente fascinante: cromos impressos foram modificados, duplicados e reintegrados de maneira que o impacto visual ficasse inalterado. Embora hoje isso possa parecer trivial, naquela época representou um aprendizado prático significativo no tratamento de imagens.
8. O audiovisual Les Barrages, para a exposição Imagens do Brasil, de 1973, em Bruxelas. Esse trabalho consistiu em um ensaio fotográfico sobre quatro represas ou usinas hidrelétricas, acompanhado de música clássica japonesa. O objetivo não era tanto mostrar o caráter industrial das represas, mas, sim, destacar a sua potência plástica.
9. Organizei a Semana de Fotografia, com a participação de, aproximadamente, 65 fotógrafos de vários países. Embora a Ásia tivesse uma representação limitada devido a questões logísticas, a maioria dos outros países, incluindo os da Europa Oriental, esteve presente. O Serviço de Informações dos Estados Unidos (que ainda existia na época) trouxe pessoal e facilitou a entrada de fotografias no Brasil. A mostra foi acompanhada por uma série de palestras ministradas por convidados, que foram transmitidas pela televisão.
10. Gravei cerca de 50 horas de fita magnética, documentando cerimônias e músicas de índios brasileiros no sul do Pará e na parte oeste de Roraima, entre 1966 e 1974. Além disso, enviei uma coleção da cultura material do povo Xikrin para o Museu do Índio Americano [Smithsonian].
11. Entre 1966 e 1984, colaborei intensamente com o Museu de Arte de São Paulo Assis Chateaubriand na realização de seu programa de exposições fotográficas. Essa parceria sempre foi um dos meus principais interesses no Brasil.
12. Participei de uma ampla gama de programas de televisão e rádio sobre a fotografia brasileira, conteúdo que variava desde o fotojornalismo policial até debates sobre as diferenças entre imagens televisivas e fotográficas. Achei lógico utilizar uma linguagem visual para discutir outra, e, graças à generosidade de alguns produtores, foi possível superar as limitações habituais da televisão na maioria das vezes.
13. Em uma linha de ação um pouco diferente, acompanhei uma expedição arqueológica no sítio peruano Pajaten, descoberto pelo americano Gene ou Eugene Savoy, em 1966. Esse local foi considerado pelos arqueólogos profissionais presentes o único do seu tipo em toda a história peruana. As fotografias da expedição foram publicadas numa edição de 1966 [1967] da revista Horizon. Destaco essa experiência porque a cidade foi “redescoberta” – por inteira coincidência – por uma expedição americana em 1985, que a classificou como um dos mais significativos achados na história da arqueologia latino-americana. Informei a equipe sobre a descoberta anterior de Savoy, por uma questão de cortesia. Pessoalmente, tenho o desejo de revisitar o sítio, construído por uma civilização que quase não utilizava linhas retas, com cada linha imaginável na construção sendo curva.
14. Em 1974, organizei um concerto experimental que combinou imagens projetadas com uma orquestra de câmara, em homenagem ao músico americano Henry Schumann.
15. Durante 1976, fui editor de fotografia do jornal semanal Aqui São Paulo, dedicado a uma análise aprofundada da cidade. Apesar de enriquecedor, o trabalho foi cansativo, pois, além de editar a produção dos outros fotógrafos, eu tinha que realizar a maior parte do trabalho de laboratório e algumas coberturas pessoalmente.
16. Em 1977, criei fotomurais em impressão Ciba para o Museu do Telefone, no edifício-sede da Telesp, em São Paulo. Essa foi minha primeira experiência com murais de tamanho considerável – aproximadamente 3 x 4 metros –, ampliados a partir de cromos de 35 mm. A realização desse projeto foi possível graças à imensa paciência dos técnicos de laboratório, que, em alguns casos, foram desafiados a fazer o que parecia impossível.
17. Iniciei o processo de organização dos meus trabalhos sobre a Bacia Amazônica para serem preservados por uma entidade mais capacitada para catalogar e conservar os cromos do que eu. Meu objetivo é criar uma memória viva, com atualizações regulares de bancos de memória, microfilmes etc. As gravações de som também fazem parte desse projeto.
18. Em 1981, numa iniciativa pessoal – e, portanto, em menor escala –, comecei a enviar alguns artefatos de índios brasileiros para o exterior com o objetivo de preservá-los. Isso se deve ao fato de que a expansão na Amazônia frequentemente envolve conflitos que podem ameaçar a sobrevivência desses materiais.
19. O projeto “Metade da Metade” surgiu da ideia de comprar uma câmera fotográfica, um rolo de filme, tirar fotos, revelá-las e realizar uma impressão colorida de 30 x 40 cm (12 x 16 polegadas), gastando apenas um quarto do salário mínimo da época. Esse objetivo foi alcançado após cerca de 60 dias de experimentação com câmeras compactas de formato 110 e novas emulsões de alta resolução. As experimentações subsequentes revelaram uma série de possibilidades criativas com o formato 110, facilitando a fotografia sequencial e possibilitando a produção de impressões maiores do que se consideravam possíveis anteriormente. Realizei palestras e apresentei uma ampliação do negativo nº 112, com tamanho aproximado de 50 x 80 cm (20 x 32 polegadas). Essa experiência e as exposições que se seguiram foram projetadas para ajudar a superar o receio dos custos elevados normalmente associados a uma iniciação na fotografia no Brasil e atraíram atenção considerável. Além disso, demonstrou-se que a capacidade de armazenamento de informações em filmes era maior do que se pensava anteriormente. Um retrato em vídeo digitalizado mostrou-se notadamente inferior, resultado que era esperado, mas sem certeza até então.
20. A exposição Eletropaulo Ano I começou como uma simples mostra para o lançamento dos livros do arquivo da companhia elétrica. No entanto, à medida que se desenvolvia, transformou-se em um espaço para exibir uma pequena parte desse acervo e para incentivar o novo grupo documental com uma exposição coletiva informal do trabalho deles. O crescente interesse público fez com que a exposição fosse ampliada, levando as divisões operacionais a contribuir com equipamentos pesados para improvisar um parque público de diversões no pátio embaixo e atrás do museu. O interesse gerado ajudou a envolver o grupo documental em projetos de filmagem para televisão e outros meios. É bem provável que essa mostra, apesar de seus modestos objetivos iniciais, tenha contribuído significativamente para a consolidação do conceito de documentação, atraindo a atenção pública para o fato de que uma companhia elétrica pode ser responsável por preservar uma parte da memória da própria cidade.
21. Para as Nações Unidas, tentei disponibilizar dados sobre o programa brasileiro de combustíveis alternativos, incluindo informações relacionadas a engenharia, amostras de combustíveis e relatórios sobre testes de veículos realizados com a colaboração da Volkswagen do Brasil. Um tópico particularmente relevante é o controle das emissões para carros movidos a etanol, que será uma questão central nos próximos dois anos, visto que tais controles agora são obrigatórios. É importante, porém, notar que os poluentes encontrados no álcool têm uma composição diferente daqueles da gasolina. Ademais, há uma discussão em andamento sobre a possibilidade de ir além do etanol e explorar o uso de óleos vegetais em pequenos motores a diesel. Estão planejados esforços para testar essa hipótese. Além disso, a instalação de usinas hidrelétricas na Bacia Amazônica já está em andamento, e um novo sistema, composto de duas represas, está sendo construído. Esse sistema promete ser quase 20% maior do que a Usina Hidrelétrica de Itaipu.
Publicações tardias
LOVE, George Leary – The Mouth of the Amazon River Is in Rye [A Foz do Rio Amazonas Fica no Rye], documentário para TV comunitária | 1993 | LMC-TV | Mamaroneck, NY.
LOVE, George Leary – Alma e Luz – Sobre a Bacia Amazônica, livro | 1996 | MD Editora | São Paulo.
DE BONI, Zé – Verde Lente – Fotógrafos Brasileiros e a Natureza, livro e exposição | 1995 | Empresa das Artes | São Paulo.
Verde Lente – Fotógrafos Brasileiros e a Natureza, exposição coletiva | 1997 | MAM São Paulo.
Amazônicas, exposição coletiva | 1998 | Itaú Cultural | São Paulo.
⁷² Original escrito em inglês por George Love
Deep South, 1965.
Harlem, Nova York, 1968.
Vermont Railway, ca. 1963
Fotografia de viagem, 1959-62.
Comunidade Xikrin, 1966.
Futebol, revista Realidade, 1967-68.
Moda, revista Claudia, 1967.
Revista 4 Rodas, 1970.
“Viva as cores”, revista Realidade, 1970.
“É explosivo”, revista Realidade, 1968.
“Poder para o povo preto”, revista Realidade, 1968.
Imagens para edição especial da revista Realidade, 1971.
Capa da revista Camera, 1973.
Ensaios em revistas de fotografia, 1971-79.
Revista Bondinho, 1971.
Imagem de geração eletrônica para Sharp, ca. 1977.
Imagens do audiovisual Les Barrages, 1973.
Imagens de Sete Quedas e construção de Itaipu, 1978-84.
Trabalhos corporativos em formato médio, déc. 1970.
Imagens do livro publicado em 1982.
Imagens do livro Amazônia, publicado em parceria com Claudia Andujar em 1978.
Imagens do livro Service Order 8696 – The Amazon Basin From the Air, publicado em 1985.
Imagens da exposição Vistas do Alto. São Paulo, 1985.
Imagens do livro póstumo Alma e Luz – Sobre a Bacia Amazônica, publicado em 1995.
Imagens da Amazônia que fazem parte da seleção definitiva do fotógrafo, déc. 1970.
Imagens do livro póstumo Alma e Luz – Sobre a Bacia Amazônica, publicado em 1995.
Retrato de George Leary Love, autor desconhecido, déc. 1970.
realização
Museu de Arte Moderna de São Paulo
curadoria
Zé De Boni
colaboradores
Amanda De Boni
Fábio Jara
João Salgado
Rodrigo Lins
produção executiva
Elenice dos Santos Lourenço
Ana Paula Pedroso Santana
projeto expográfico
Pedro Mendes da Rocha
Bianca Yokoyama
projeto gráfico
Paulo Otavio – POG arte design
coordenação editorial
Renato Schreiner Salem
fotos
George Love
Coleção George Love
ampliações fotográficas p&b
João Salgado
ampliações fotográficas coloridas
Gibolab
digitalização das matrizes originais, restauração digital, impressões em jato de tinta
Zé De Boni
retoques digitais, reprodução de documentos e obras de época.
Zé De Boni
João Salgado
audiovisual Estúdio Preto e Branco adesivação fotográfica
Giclê
molduras
Capricho Molduras
execução do projeto expográfico
Secall Cenografia
conservação
Fabiana Oda
Kika Landi
Tamine Gesualdi
Thalita Noce
montagem
Ck Black Art Handler
KBedim Montagem e Produção Cultural
Luiz83
MReneé Arte Produção e Montagem Phina
transporte
ATM Janus
tradução para o inglês
Paul Webb
revisão de texto
Marca-Texto
assessoria de imprensa
a4&holofote comunicaçãoㅤㅤ
realização
Museu de Arte Moderna de São Paulo
curadoria
Zé De Boni
produção executiva
Elenice dos Santos Lourenço
Ana Paula Pedroso Santana
textos
Cauê Alves e Elizabeth Machado
George Love
Zé De Boni
projeto gráfico
Paulo Otavio – POG arte design
coordenação editorial
Renato Schreiner Salem
assistência editorial
Gabriela Gotoda
tradução para o inglês
Paul Webb
revisão de texto
Marca-Texto
fotos
George Love
Coleção George Love
impressão
Ipsis ㅤ
Anita Malzoni Anna Carboncini (in memorian)
Barbara Livesey
Dan Fialdini
Dina
Fabio Calvoso
Fausto Chermont
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Molducenter
Rosilis Staubㅤ
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presidente de honra
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David Ades e [and] Andrea Ades
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núcleo contemporâneo
coordenação
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Ana Lopes
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Ana Paula Vilela Vianna
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Cristina Canepa
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Daniela M. Villela
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Isabel Ralston Fonseca de Faria
Janice Mascarenhas Marques
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Juliana de Souza Peixoto Modé
Juliana Neufeld Lowenthal
Karla Meneghel
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Maria do Socorro Farias
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Maria Júlia Pardo Almendra
Maria Teresa Igel
Mariana de Souza Sales
Marina Lisbona
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Paula Regina Depieri
Paulo Setubal Neto
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Renata Paes Mendonça
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de Queiróz Visconde
Rosana Wagner Carneiro Mokdissi
Sabina Lowenthal
Sérgio Ribeiro da Costa Werlang
Silvio Steinberg
Sonia Regina Grosso
Sonia Regina Opice
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superintendente executivo
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técnico em manuseio
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assistência à presidência, curadoria e superintendência
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biblioteca
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bibliotecária documentalista
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assistente
Felipe de Brito Silva
comunicação
coordenação
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analistas
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Rachel de Brito Barbosa
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produção e edição de vídeo
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fotógrafo
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especialista em acessibilidade e ações afirmativas
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analista de curadoria
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educativo
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educadores
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Amanda Silva dos Santos
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Leonardo Sassaki Pires
Luna Souto Ferreira
Maria da Conceição Ferreira da Silva Meskelis
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Ana Flávia dos Reis
Daniel Oliveira Ribeiro Mascarenhas da Cruz Pereira
Gabe Nascimento
Pedro Henrique Queiroz Silva
administrativo financeiro
coordenação
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comprador
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analistas
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Janaina Chaves da Silva Ferreira
Renata Noé Peçanha da Silva
assistente
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auxiliar
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estagiários
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estagiária
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relacionamentos e negócios
coordenação
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analista
Marcio da Silva Lourenço
relacionamentos
analistas
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Mariana Saraceni Brazolin (Programas Institucionais)
negócios
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analistas
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Juliene Campos Braga Botelho Lanfranchi (Eventos)
Tainã Aparecida Costa Borges (Loja)
assistentes
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parcerias e projetos incentivados
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parcerias
analistas
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projetos incentivados
analistas
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patrimônio
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assistentes
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manutenção predial
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Venicio Souza (Formata Engenharia)
bombeiros civis
Ajuilton Gonçalo Soares (Tejofran)
André Luiz (Tejofran)
limpeza
Tejofran
segurança patrimonial
Power Segurança
bilheteria
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monitoramento e orientadores de público
Power System
produção de exposições
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produtoras
Ana Paula Pedroso Santana
Elenice dos Santos Lourenço
Erika Hoffgen (PJ)
Marcela Tokiwa Obata dos Santos
recursos humanos
coordenação
Karine Lucien Decloedt
analista
Débora Cristina da Silva Bastos
tecnologia da informação
coordenação
Nilvan Garcia de Almeida
suporte técnico
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Gabriella Shibata (INIT NET)
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BMA
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DoubleTree by Hilton
Editora Cobogó
Editora Ubu
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MAM São Pauloㅤㅤ
Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP) (Câmara Brasileira do Livro, SP, Brasil)
George Love : além do tempo / realização [production] Museu de Arte Moderna de São Paulo ; curadoria [curatorship] Zé De Boni ; tradução para o inglês [english translation] Paul Webb ; projeto expográfico [exhibition design] Pedro Mendes da Rocha. — São Paulo : Museu de Arte Moderna de São Paulo, 2024.
Exposição de 29 de fevereiro a 12 de maio de 2024. Ed. bilíngue: português/inglês. ISBN 978-65-84721-14-2 1.
Fotografia contemporânea 2. Love, George, 1937-1995 3. Livros de artistas I. Museu de Arte Moderna de São Paulo. II. Boni, Zé De. III. Rocha, Pedro Mendes da.
24-189631 CDD-770
Índices para catálogo sistemático:
1. Fotografia : Artes 770
Eliane de Freitas Leite – Bibliotecária – CRB 8/8415ㅤㅤ
O Museu de Arte Moderna de São Paulo está à disposição das pessoas que eventualmente queiram se manifestar a respeito de licença de uso de imagens e/ou de textos reproduzidos neste material, tendo em vista que determinados autores e/ou representantes legais não responderam às solicitações ou não foram identificados ou localizados.
Nota da Curadoria MAM São Paulo
O MAM tem conhecimento da complexidade e sensibilidade em exibir imagens de pessoas indígenas não identificadas, sobretudo quando tais registros foram realizados por pessoas não pertencentes à etnia ou cultura. O museu emprega esforços para identificar as pessoas indígenas retratadas por meio de pesquisas e o setor de Curadoria MAM São Paulo está à total disposição de quem eventualmente queira se manifestar a respeito da identificação e/ou direitos de uso de imagem dessas pessoas
O catálogo impresso foi composto nas fontes PT Sans e PT Serif, impresso em papéis Master Blank 270 g/m2 (capa), Alta Alvura 120 g/m2 e Eurobulk 130 g/m2 (miolo), em fevereiro de 2024, pela gráfica Ipsis.