Ao falecer, em agosto de 2018, Antonio Dias havia reunido uma coleção das próprias obras que recobria toda sua trajetória artística. O conjunto compunha-se tanto de peças de que ele nunca havia se separado, como de outras recompradas de terceiros para quem tinham sido vendidas. Tratava-se, pois, de uma representação de si mesmo intencionalmente construída, mantida e guardada.
A atitude de colecionar-se manifesta um aspecto essencial do artista: Antonio Dias cultivou uma ética do trabalho que permite compreender seu percurso a partir de posicionamentos claramente formulados por ele. Assim, a escolha dos componentes desta coleção testemunha atenção para com princípios que acompanharam o artista ao longo de sua vida e que deviam ser mantidos próximos a si.
Reunimos aqui parte dessa coleção única. Além de contar com peças emblemáticas, como Nota sobre a morte acidental e Anywhere Is My Land, o conjunto vai desde as primeiras obras abstratas do início dos anos 1960 até a última tela pintada por Antonio Dias. A mostra divide-se cronologicamente. Inicia-se com as obras mais recentes, onde o uso de pigmentos minerais condutores de eletricidade importava ao artista pela presença do material carregado de carga física. A segunda seção reúne obras com o uso de palavras, frequentemente em inglês, em composições áridas em preto, branco e cinza, que parecem colocar em questão seu próprio sentido como arte, pois negam qualquer prazer ao público. O terceiro conjunto é composto por peças dos anos 1960, cujas figuras fragmentadas remetem à violência do Brasil ditatorial, ao sexo e a vísceras extirpadas. Ao longo do percurso, há também obras singulares, como as abstrações do jovem artista feitas logo após seu estudo inicial com o gravurista Oswaldo Goeldi, os filmes realizados em Nova York entre 1971 e 1972, e as diversas representações do corpo. Pontuando todo o percurso, diferentes autorretratos registram o amadurecimento do autor.
A obra, apesar de múltipla, apresenta um aspecto comum: é impossível a experiência de uma compreensão total de cada peça; ao contrário, o público é confrontado com uma construção incapaz de apresentar-se íntegra. Com o método que gera objetos para os quais sempre falta o sentido total, emerge a dimensão ética da obra de Antonio Dias: a incompletude da existência humana. A constância dos temas existenciais garante um sentido testemunhal à obra de Antonio Dias. Portanto, a coleção que ele formou de si mesmo é uma síntese única, tanto pelo percurso que organiza ao longo das várias fases, como pela declaração dos valores éticos norteadores de sua arte.
A oportunidade de exibir parte da coleção nesta mostra, ainda durante período de luto pelo artista, só foi possível graças à generosidade da família; a ela é dedicada a exposição.
Felipe Chaimovich
curador
A exposição integra a 34ª Bienal de São Paulo.
Vista da exposição "Antonio Dias: derrotas e vitórias", na sala Milú Vilela do MAM São Paulo. Foto: Karina Bacci
Vista da exposição "Antonio Dias: derrotas e vitórias", na sala Milú Vilela do MAM São Paulo. Foto: Karina Bacci
Vista da exposição "Antonio Dias: derrotas e vitórias", na sala Milú Vilela do MAM São Paulo. Foto: Karina Bacci
Vista da exposição "Antonio Dias: derrotas e vitórias", na sala Milú Vilela do MAM São Paulo. Foto: Karina Bacci
Vista da exposição "Antonio Dias: derrotas e vitórias", na sala Milú Vilela do MAM São Paulo. Foto: Karina Bacci
Curadoria: | Felipe Chaimovich |
Abertura: | 13 de outubro de 2020 |
Visitação: | até 21 de março de 2021 |
Local: | Museu de Arte Moderna de São Paulo |
Endereço: | Parque Ibirapuera (av. Pedro Álvares Cabral, s/nº - Portões 1 e 3) |
Horários: | terça a domingo, das 12h às 18h |
Telefone: | (11) 5085-1300 |