Tarik Kiswanson nasceu na cidade de Halmstad, na Suécia, em um bairro habitado por muitas famílias imigrantes de primeira e segunda geração – um limiar espacial entre a Europa e outras partes do mundo. Sua mãe e seu pai, palestinos, haviam escapado da guerra em Jerusalém e passado por Trípoli e Amã antes de chegar ao escritório de imigração sueco, que adaptou seu sobrenome original, Al Kiswani, para Kiswanson – um limiar temporal do exílio.
Sem se decidir por estar definitivamente de um ou de outro lado de seus limiares – e sem se reconhecer inteiramente em uma só língua ou um só país –, Tarik Kiswanson cresceu na Suécia, estudou em Londres e vive em Paris desde 2010. Na capital francesa, trabalha como artista e escritor, em busca de linguagens que lhe permitam refletir sobre vidas em errância, histórias desenraizadas, traduções impossíveis e modos de abrigar subjetividades em horizontes de espera e suspensão. Autor de poemas e vídeos, Tarik realiza esculturas como linguagens em que formas, objetos e espaços se articulam para tornar noções temporais e corpóreas algo sensível. Elementos recorrentes nessa prática são seus Nests [Ninhos]: obras de superfícies lisas e alvas, cuidadosamente trabalhadas, lixadas e pintadas, que estabelecem relações de apoio, suspensão e contraponto com a arquitetura e com objetos impregnados de memórias.
Na instalação que dá nome a esta que é sua primeira mostra individual em São Paulo, o artista propõe uma intervenção arquitetônica que subverte a percepção usual do espaço. A fluida circularidade da sala é contraposta a um volume suspenso, que só revela seu interior estreito e alto após a caminhada pelo espaço. Nessa passagem-limiar penetrável pelo olhar, convivem três elementos. Um deles é uma cadeira produzida em meados do século passado pela fábrica Móveis Cimo, exemplo de uma linha de mobiliários essencial para a modernização do design brasileiro por ter sido adotada como produto básico para diversos órgãos estatais; esse modelo, especificamente, corresponde ao que se encontrava nas salas de espera de escritórios de imigração brasileiros, acomodando os corpos de quem vivia um momento de transição entre tempos e espaços.
Outro elemento é um cadeiral de igreja católica produzido por volta da metade do século 19. Se a própria religião foi um veículo estrutural do ciclo colonial de exploração do Brasil, incluindo-se o trânsito da arquitetura e do mobiliário sacro – seja pelo traslado marítimo, seja pela reprodução de modelos europeus na colônia –, esse banco é parte dessa história. Produzido na Bélgica ou na Holanda, ele foi trazido ao Brasil na época de sua produção, depois retornou à Europa e agora volta a São Paulo. Preparado para acomodar o corpo em repouso durante a liturgia dedicada ao louvor de uma divindade invisível, esse objeto agora flutua fora de alcance.
O terceiro objeto levitando no espaço é Cradle [Berço], a mais recente das esculturas de Kiswanson em forma de casulo, presença cuja escala e forma aponta para o que está ausente. Os corpos e subjetividades passaram por limiares institucionais – como a igreja e o escritório de imigração – estruturalmente preparados para dar nome e destino a vidas em transição, indiferentes ao estado sempre inacabado de tais limiares. Como é da natureza de sua poética, Tarik Kiswanson não explica nem representa o estado vigente de um mundo marcado por imigrações, exílios, diásporas, colonizações, guerra e genocídio; em vez disso, ele desenvolve uma linguagem escultórica que não existiria fora deste mundo, e tampouco sem sua própria experiência de desterro.
Um dos artistas convidados para a mostra A terra, o fogo, a água e os ventos – Por um Museu da Errância com Édouard Glissant, Tarik é leitor do poeta martinicano, com quem converge na defesa do direito à opacidade da identidade e da linguagem. Sua obra oferece uma oportunidade de ressonância sensível daquilo que em cada um de nós escapa de identidades estanques, relatos de origem coesos e pertencimentos enraizados – tudo aquilo que vibra na presença da diferença e do intraduzível, em um perene processo de transformação para algo ainda não conhecido.
Cauê Alves Curadores
Acessibilidade
Disponibilização de catálogos em versão digital que pode ser processada por sistemas de leitura e ampliação de tela (clique aqui para acessar as publicações); recursos de audioguia com audiodescrição e videoguia em Libras com legendas em português nas exposições;
ferramenta de Libras digital por meio da tecnologia Hand Talk e ferramenta de controle de fonte e cor para pessoas com baixa visão na visita ao site;
utilização de legendas descritivas e texto alternativo nas postagens nas redes sociais, com a hashtag #DescriçãoDoVideo e hashtag #PraTodoMundoVer;
Disponibilização de materiais táteis e multissensoriais das obras do acervo
Além das medidas acima, é possível agendar com o Educativo visitas mediadas gratuitas com educadores para público surdo, com deficiência visual, com deficiência física, intelectual e usuários de equipamentos de saúde mental e em situação de vulnerabilidade social e horários alternativos planejados para atendimento de público dentro do Transtorno do Espectro Autista de acordo com as características distintas de cada sujeito pensadas em relação a: socialização, sensorialidade, comunicabilidade e autonomia. solicitar pelo e-mail educativo@mam.org.br
Intérprete de libras e Audiodescrição ao vivo nas atividades quando solicitado com até 48h de antecedência solicitar pelo e-maileducativo@mam.org.br
Em certas atividades, poderão ser oferecidas medidas adicionais de acessibilidade, que estarão indicadas nos materiais de divulgação.
artista
Tarik Kiswanson
(Halmstad, Suécia, 1986)
Tarik Kiswanson nasceu em Halmstad, Suécia (1986), em uma família palestina exilada. Vive e trabalha em Paris. Formado pela École des Beaux-Arts de Paris e pela Central Saint Martins em Londres, cria formas ovais e objetos suspensos que evocam e tensionam temas como memória e origem. Poeta e artista visual, sua obra investiga noções de errância, desenraizamento e transformação por meio de esculturas, vídeos, poemas e instalações. Seus trabalhos dialogam com a arquitetura e com histórias coloniais e migratórias, criando experiências sensíveis de suspensão e espera. Realizou exposições individuais como A Century, na Kunsthalle Portikus, Frankfurt, Alemanha (2024); Becoming, na Bonniers Konsthall, Estocolmo, Suécia (2023), e Nido, no Museo Tamayo, Cidade do México (2023). Venceu o prestigiado Prêmio Marcel Duchamp, da Association pour la Diffusion Internationale de l’Art Français (2023).
curadoria
Cauê Alves
É mestre e doutor em filosofia pela FFLCH USP. É professor do Departamento de Artes da FAFICLA, PUC-SP, e curador-chefe do Museu de Arte Moderna de São Paulo. É autor de diversos textos sobre arte, entre eles, texto no catálogo da exposição Mira Schendel, Museu de Arte Contemporânea de Serralves, Porto, e Pinacoteca de São Paulo e Tate Modern, Londres. É líder do grupo de pesquisa em História da Arte, Crítica e Curadoria da PUC-SP (CNPq). Entre 2016 e 2020, foi curador-chefe do Museu Brasileiro da Escultura e Ecologia, MuBE. Em 2015, foi curador assistente do Pavilhão Brasileiro da 56ª Bienal de Veneza e, em 2011, foi curador adjunto da 8ª Bienal do Mercosul (2011).
Paulo Miyada
Curador e pesquisador de arte contemporânea, dedica-se a projetos que contribuam tanto com visadas mais amplas e precisas da história da arte quanto com a reflexão crítica e desejante do tempo presente. Comprometido com o diálogo com artistas, preza igualmente pelo amadurecimento das instituições como instâncias de relevância pública e social, assim como pelo acolhimento dos públicos como sujeitos sensíveis e pensantes com interesses que transbordam o juízo de valor. Com graduação e mestrado pela FAU-USP, atua hoje como diretor artístico do Instituto Tomie Ohtake e curador adjunto do Centre Pompidou. Foi curador adjunto da 34ª Bienal de São Paulo (2020-21) e assistente de curadoria da 29ª Bienal de São Paulo (2010), além de ter organizado o livro “Bienal de São Paulo desde 1951” (2022). Entre suas curadorias, destacam-se “AI-5 50 anos – Ainda não terminou de acabar” (2018); “Anna Maria Maiolino – PSSSIIIUUU…” (2022); “Ensaios para o Museu das Origens” (2023); “Mira Schendel – Esperar que a palavra se forme” (2024) e “Sonia Gomes – Barroco, mesmo” (2025). Suas publicações foram indicadas diversas vezes para o prêmio Jabuti, incluindo a premiação na categoria Livro de Arte em 2020. Atualmente organiza a mostra “A TERRA O FOGO A ÁGUA E OS VENTOS – Por um Museu da Errância com Édouard Glissant”.
imagens
Tarik Kiswanson, Limiar, 2025 (projeto da instalação)
Tarik Kiswanson, Limiar, 2025 (projeto da instalação)
Tarik Kiswanson, Limiar, 2025 (projeto da instalação)
Tarik Kiswanson, Limiar, 2025 (projeto da instalação)
Tarik Kiswanson, Limiar, 2025 (projeto da instalação)
Tarik Kiswanson, Limiar, 2025 (projeto da instalação)
Tarik Kiswanson, Limiar, 2025 (projeto da instalação)
Tarik Kiswanson, Limiar, 2025 (projeto da instalação)
serviço
Exposição:
Tarik Kiswanson: Limiar
Local:
Instituto Tomie Ohtake
Curadoria:
Cauê Alves e Paulo Miyada
Período expositivo:
de 3 de setembro a 2 de novembro de 2025
Endereço:
Rua Dos Coropés, 88 – Pinheiros – São Paulo – SP
Entrada gratuita
galeria de imagens
museu de arte moderna de são paulo
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