O que é o gosto contemporâneo? A humanidade vive hoje o período de maior acesso a variedades de alimento e a tecnologias de conservação e transporte de comida em toda nossa história evolutiva. Por um lado, nossa reação animal à fartura alimentar tem multiplicado enfermidades opostas: obesidade e bulimia; por outro, as desigualdades geopolíticas geram zonas de consumismo desenfreado e desperdício, contrapostas a regiões de fome e seca.

Assim, a investigação sobre o cozinhar e o comer tem ocupado agentes da cultura atentos aos desafios atuais. Mas a economia da alimentação tende a isolar cada um desses agentes culturais por meio da especialização profissional: uns só cuidam do preparo, outros só servem, estes degustam novas receitas, aqueles testam ingredientes e misturas. Apesar de nosso grau de progresso alimentar, a questão do gosto parece se diluir.

O MAM inaugura agora sua linha de arte e gastronomia para criar um espaço para a livre experimentação sobre o gosto contemporâneo. Dez duplas de chefe de cozinha e artista trabalharão aqui, cada uma delas de terça a sábado, durante dez semanas, colaborando numa cozinha especialmente concebida para a Sala Paulo Figueiredo. Cada dupla deixará registradas numa lousa etapas desse processo de trabalho. O público poderá observar ao vivo a interação entre os saberes de chefe e de artista, que a cada sábado culminará numa experiência degustativa livre de regras: não há cardápio predeterminado, nem freguês a atender, ou obra de arte para ser preservada.

Felipe Chaimovich e Laurent Suadenau
Curadores

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Um jogo de projeções no teto do corredor de ligação do MAM apresenta a imagem de uma equilibrista caminhando num cabo de aço. A imagem está na mesma escala que o público, que vê a equilibrista de baixo e tem a nítida impressão de que há alguém passando sobre sua cabeça por toda a extensão do corredor.

Boa parte da ilusão de Por um fio é produzida pela sincronização dos movimentos da equilibrista e do público. A semelhança entre seus passos na projeção e os passos do visitante no corredor cria um jogo entre realidade e virtualidade no qual o observador pode partilhar da sensação de vertigem que o ato de caminhar por um fio provoca em muita gente.

Radicada em São Paulo, Helena Martins-Costa fala sobre Por um fio: “O título evoca a ideia de limite, de situação extrema, onde um frágil equilíbrio sustenta algo que está à beira do abismo. Essa situação sugere um risco enorme. É como se a cada instante fosse preciso interceder para evitar a queda que parece iminente. Para não cair durante a travessia, a equilibrista é convocada a uma dinâmica necessária e vital de compensação, sustentação e harmonização de forças antagônicas, externas e internas, que atuam sobre seu corpo e sua mente”.

No jogo entre o real e o virtual, a imagem da equilibrista é uma alegoria da sua própria condição. Afinal, o que pode cair? Quem caminha na imagem ou a própria imagem do caminhante?

Oswaldo Goeldi, o homem que sempre acreditou em contos de fadas

Após a participação de Oswaldo Goeldi na 2ª Bienal (1953) e na 3ª Bienal (1955) como artista convidado, Goeldi ficou motivado a realizar sua primeira individual no MAM, em 1956. Ele ficou extremamente feliz por apresentar uma retrospectiva de seus trabalhos, mas jamais poderia imaginar que a partir de então surgiriam tantas exposições e homenagens – não apenas ao artista, disciplinado, concentrado e dedicado ao trabalho solitário, mas também ao homem, carismático, com opiniões simples e devaneios poéticos.

Assim era Goeldi

Filho de um dos mais respeitados naturalistas suíços – o prof. dr. Emílio Goeldi, ex-diretor do Museu Paraense (atual Museu Paraense Emilio Goeldi) –, Goeldi optou pela solidão ao lado de sua arte maior, a xilogravura.

Abstraiu-se de tudo para viver num mundo à parte em seu pequeno quarto, onde podia ver o mar, o sol, a chuva e criar personagens a partir de sua visão indagadora e fantástica.

Assim é Goeldi

Presente, atual, contemporâneo, preocupado com as questões sociais, com os excluídos, com a falta de ética e caráter dos homens.

Sua luta incessante para alçar voo por meio de seus personagens soturnos nos faz sempre querer mergulhar fundo na obra deste criador de figuras enigmáticas.

Lani Goeldi e Paulo Venancio Filho
Curadores

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Sombriamente iluminado é o mundo de Oswaldo Goeldi. É o mundo brasileiro – o éden tropical – entrevisto pelo avesso, invertido, iluminado pelo subterrâneo. Goeldi é a nota dissonante ao modernismo solar de 1922, ao populismo de Portinari, ao sensualismo lasso de Di Cavalcanti, seus contemporâneos. Antes, muito antes, do surgimento entre nós de uma linguagem abstrato-geométrica, Goeldi já havia estabelecido uma poética sucinta, exata, lúcida, avessa ao prolixo, distante dos clichês e lugares-comuns. Suas xilogravuras e desenhos nunca apresentam o fato consumado, mas a interrogação, a iminência do que vai acontecer. No entanto, especialmente as xilogravuras nos atingem de imediato, como flashes fotográficos. Provocam um sobressalto incômodo. As ruas desertas, os casarões, os transeuntes solitários, os pescadores, os urubus povoam anonimamente suas obras, habitam um espaço incerto, interrogativo, entre parênteses. Parece distante, mas é muito próximo. Os indivíduos vagam um tanto sem destino, acossados pelo destino de todos: vida e morte. Não há solidariedade entre os homens, apenas entre eles e uns poucos animais. A natureza ainda atemoriza, uma tempestade está sempre presente, ameaçando – ainda hoje – a desamparada cidade brasileira que foi o habitat de Goeldi, o Rio de Janeiro.

“Irmão” de Edvard Munch nos trópicos, amigo e correspondente de Alfred Kubin, Goeldi foi artística e existencialmente um autêntico expressionista – não há expressionista que não seja autêntico. Inseparáveis são a vocação e o destino. Como expressionista, ele também é implacável: há o mundo do trabalho, do contato e da compreensão da natureza que é o dos pescadores, e o mundo da angústia urbana da cidade inacabada e ameaçadora. Há uma frase de Sérgio Buarque de Holanda em Raízes do Brasil que se aplica com perfeição à obra de Goeldi: “A transição do convívio das coisas elementares da natureza para a existência mais regular e abstrata das cidades deve ter estimulado, em nossos homens, uma crise subterrânea, voraz”. Pois a obra de Goeldi fala dessa “crise voraz” ainda presente, ainda sentida em nosso dia a dia. Ela está aí para lembrar que aqui, especialmente aqui, o Sol também lança uma sombra.

Oswaldo Goeldi nasceu em 31 de outubro de 1895 no Rio de Janeiro, cidade em que viveu sua vida de artista, indissociável de sua obra. Seu pai foi o naturalista suíço Emílio Goeldi, que se estabeleceu no Brasil a serviço do imperador d. Pedro II. Aos seis anos, mudou-se com a família para a Suíça, onde estudou e serviu como sentinela durante a Primeira Guerra Mundial. Em 1919, retornou ao Brasil. Em 1951, recebeu o Prêmio de Gravura Nacional na 1ª Bienal de São Paulo. Morreu em 15 de fevereiro de 1961.

Paulo Venâncio Filho e Lani Goeldi
Curadores

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Em 1952, German Lorca fez sua primeira individual no MAM. Sessenta anos depois, no mesmo museu, a exposição German Lorca fotografias: acontece ou faz acontecer? celebra a sua trajetória.

A mostra se baseia no lema de Lorca: “a fotografia acontece para o fotógrafo e ele a faz acontecer”. Esta seleção de 120 fotografias – 87 do seu acervo pessoal e 33 da coleção do MAM – interrelaciona diferentes momentos da sua produção fotográfica. A reflexão sobre o que acontece para o fotógrafo, aquilo que ele flagra e o que ele faz acontecer para fotografar, ou seja, o que constrói, permeia toda a obra de Lorca e o presente recorte.

Com um rico panorama que abrange da fase inicial à consagração de uma trajetória de 65 anos de fotografia, apresenta-se aqui uma celebração à proximidade dos noventa anos de vida de German Lorca.

Daniela Maura Ribeiro
curador

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Wolfgang Tillmans constrói um mapa do mundo contemporâneo. Cada uma de suas imagens mostra a luz em suas diversas formas, desde cenas nítidas e contrastadas até campos monocromáticos. Ele as pendura em paredes brancas como se fossem constelações contra um fundo claro e brilhante, desenhando figuras com a diferença de cores, tamanhos e espaçamentos entre as partes do trabalho. Mas, ao invés de confortar o espectador com a representação de uma realidade reconhecível, a fotografia é usada por ele para cartografar um universo de acaso e incerteza.

Satélites, planetas e cometas sempre despertaram a atenção de Tillmans. Ele consegue identificar com facilidade os personagens mitológicos que nomeiam os grupos de estrelas em suas fotos noturnas, pois tem observado o céu com telescópios desde a infância. Essa familiaridade com a astronomia deu-lhe uma compreensão geométrica da luz. Ele acompanha as linhas formadas pelas sombras projetadas pela Terra na atmosfera enquanto voa pelo mundo, sempre sentando na janela dos aviões para ficar observando. Como Tillmans entende o comportamento das linhas de irradiação luminosa e dos ângulos de reflexão, consegue determinar a composição de suas imagens conforme as leis da luz em si.

Quando Tillmans começou a estudar fotografia, os telescópios deram lugar às câmeras. Ele leva consigo apenas aparelhos portáteis que se aproximem o mais possível da visão humana. Por esse motivo, somente há dois anos substituiu as câmeras analógicas pelas digitais, quando essas passaram a ter sensores do tamanho de um filme de trinta e cinco milímetros, que é o mais similar à visão humana, além de terem se tornado suficientemente pequenas. Para ele, o importante é ter sempre à mão instrumentos ópticos que mostrem o universo visível como imagem bidimensional.

Qual um astrônomo navegando pela noite, Tillmans busca fenômenos luminosos que possam estabelecer a posição relativa dos corpos entre si. Mas não encontra padrão nenhum: algumas fotos são repetidas em tamanhos diferentes e penduradas duas vezes, enquanto outras são dobradas e encapsuladas em molduras de acrílico, ou podem medir seis metros, e um grupo é abstrato, ou talvez nem tanto. Suas séries são embaralhadas por meio da disposição irregular das imagens em revistas, livros e espaços expositivos. Distorções aparentes e pontos de baixa resolução nas fotos evidenciam a artificialidade do meio óptico utilizado.

A diversidade de temas e imagens na produção de Tillmans afirma sua oposição à escola alemã de fotógrafos contemporâneos iniciada com Bernd Becher e Hilla Becher. Durante os anos 1970, o casal Becher desenvolveu a fotografia seriada como uma homenagem à Nova Objetividade da Alemanha dos anos 1920. Eles retomaram a foto tirada em ângulo frontal, característica da imagem de identificação da polícia e da ciência no começo do século XX, a mesma que foi posteriormente explorada pelos geômetras da vanguarda. As séries regulares de imagens, produzidas com uma geometria calculada, induzem a uma experiência de ordem universal. Mas Tillmans aborda uma realidade diferente.

A ciência recente propõe que o real é produzido por sequências de eventos submetidas a mudanças aleatórias. A natureza é catastrófica. Nenhuma série matemática regular pode ser um modelo adequado do universo, apenas uma possibilidade probabilística. Logo, a geometria linear da luz é um fenômeno raro, pois nos dá uma noção fugidia de posição no interior de um universo caótico. Por outro lado, qualquer tentativa de considerar as leis da luz como modelo absoluto para as séries de fatos reais é apenas uma ilusão.

A luz não é um ponto fixo na longa história do universo em expansão, mas pode guiar nossos dias. Nossas imagens formam nossas constelações, porém se metamorfosearão em algo novo nalgum momento imprevisível. Tillmans toma o mundo pelo que ele é.

Felipe Chaimovich, Hans Ulrich Obrist, Julia Peyton e Sophie O’Brien
Curadores

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Pó de bronze sobre folhas de papel croquis

Ao colar papéis pintados no corredor ocupado pelo Projeto Parede, a artista paulista Flávia Ribeiro aproveita o movimento dos passantes para ativar a obra por meio do deslocamento de ar causado pelo trânsito do público. A tinta densa aplicada em ambos os lados de papéis diáfanos cria superfícies opacas que, ao serem sopradas pelo movimento dos transeuntes, se mostram ora coloridas, ora metalizadas.

Os trabalhos de Adriana Varejão resgatam e cruzam diferentes histórias, tecendo múltiplas narrativas e referências – da história da arte à arte religiosa, da azulejaria à cerâmica, da China ao Brasil, da iconografia colonial às imagens produzidas pelos viajantes europeus e à arte acadêmica do século XIX, da geometrização dos espaços arquitetônicos à abstração geométrica e à grade modernista, das paisagens e marinhas aos mapas.

Nesse repertório híbrido e polifônico, um elemento atravessa toda a obra de Varejão: o corpo, seja rasgado, cortado, dilacerado, esquartejado, seja em fragmentos, em pedaços. O corpo é revelado enquanto pele e carne da pintura, habitando os interiores da arquitetura e descoberto em suas ruínas; é, por fim, representado nas saunas, por metonímia

Se o corpo é o tema recorrente da obra, seu espírito é o barroco, cheio de curvas e dobras, excessos e ornamentações, exuberância e drama. Entretanto, o pensamento é mestiço – não é à toa que, em seus autorretratos, Varejão aparece como chinesa, moura e índia.

Há, sobretudo, uma preocupação em expor e conectar histórias marginais, agregando referências pessoais, literárias e ficcionais. História pode referir-se à ficção e não ficção, o que lança a pintura nos rumos da literatura. As histórias marginais são aquelas quase esquecidas ou colocadas de lado pela história tradicional, histórias profundas ou íntimas, mas também histórias contra a corrente, contadas às margens, histórias pós-coloniais, subalternas, fora do centro, histórias no Sul que, nesse sentido, ganham uma dimensão política.

Como a primeira exposição panorâmica de Varejão, a seleção dos trabalhos foi pensada para oferecer os melhores exemplos de todas as séries de trabalhos que Varejão produziu – Terra incógnita, Proposta para uma catequese, Acadêmicos, Irezumis, Línguas e Incisões, Ruínas de charque, Mares e Azulejos, Saunas, e Pratos.

Adriano Pedroso
Curador

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O projeto DJ Residente cria trilhas sonoras para os espaços do Museu de Arte Moderna de São Paulo, conectando a música de vanguarda, eletrônica e experimental com a arte moderna. Em 2012, o projeto está sob curadoria do Circuito Fora do Eixo, uma rede de coletivos que trabalha com cultura independente no Brasil e na América Latina. Assim, a cada exposição, novos artistas são convidados a participar de um processo colaborativo, trocando conteúdo e conhecimento, que resultam em sonoridades originais para os espaços expositivos e as diversas áreas do museu.

Nessa edição, os convidados foram: Vivian Caccuri, Loop B e o Lavoura.

O retorno da coleção Tamagni: até as estrelas por caminhos difíceis

Que museu é este? O Museu de Arte Moderna de São Paulo, fundado em 1948, veio para a marquise do Ibirapuera em 1969, após a doação de todo seu patrimônio à Universidade de São Paulo, em 1963.

Depois da doação do patrimônio, o MAM vagou por diversos endereços, onde se reuniam membros da associação de amigos do MAM que teimaram em acreditar na sobrevivência de seu espírito, que de próprio guardara apenas o nome: Museu de Arte Moderna de São Paulo. Era um museu sem corpo.

Um desses amigos falecendo deixou a própria coleção para o MAM: Carlo Tamagni. Assim, em 1967, um conjunto de 81 pinturas, gravuras e desenhos transformou o MAM novamente em um museu com patrimônio artístico. Ainda sem casa, o museu mostrou a Coleção Tamagni em um saguão emprestado no Conjunto Nacional, na avenida Paulista. A exposição em que o MAM ressurgiu foi seguida do oferecimento deste pavilhão público na marquise do Ibirapuera, onde você está agora.

Desde então, o MAM compôs uma nova coleção, que hoje é de mais de cinco mil obras. Como um sobrevivente, o MAM pode arriscar-se até a incorporar obras que transformam a própria natureza do museu num lugar de encontro com o inesperado.

Esta exposição reúne documentos do período em que o MAM vagou por São Paulo em busca do próprio retorno, a Coleção Tamagni na íntegra e obras contemporâneas que desafiam o museu a renovar-se continuamente.

Felipe Chaimovich e Fernando Oliva
Curadores

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DJ Residente

O projeto DJ Residente cria trilhas sonoras para os espaços do Museu de Arte Moderna de São Paulo, conectando a música de vanguarda, eletrônica e experimental com a arte moderna. Em 2012, o projeto está sob curadoria do Circuito Fora do Eixo, uma rede de coletivos que trabalha com cultura independente no Brasil e na América Latina. Assim, a cada exposição, novos artistas são convidados a participar de um processo colaborativo, trocando conteúdo e conhecimento, que resultam em sonoridades originais para os espaços expositivos e as diversas áreas do museu.

Nessa edição, os convidados foram: DJ’s Tudo, Noisy Loops e La Golden Acapulco