Seis anos depois de o fundador do MAM São Paulo Ciccillo Matarazzo transferir todas as obras da coleção para a Universidade de São Paulo, o museu inventa o Panorama da Arte Brasileira com o intuito de formar um novo acervo.

De 1969 para cá, o Panorama superou sua missão inicial. Esse acervo (cerca de 5.400 obras) cresceu a tal ponto que o MAM não consegue lhe dar visibilidade permanente por causa das limitações do pavilhão onde está instalado abaixo da marquise projetada por Oscar Niemeyer.

O tema desta edição toma como ponto de partida a falta de uma sede construída especificamente para abrigar o MAM São Paulo e convida, além de artistas, arquitetos a pensar onde poderia ficar esse edifício (dentro ou fora do parque) e qual seria a vocação desse programa.

O título do Panorama, Formas únicas da continuidade no espaço, foi tomado emprestado da escultura do artista futurista Umberto Boccioni, cuja peça já pertenceu ao museu, e que completa cem anos. Hoje no MAC USP, esta obra ressalta o caráter especulativo da presente mostra.

Junto com documentos históricos que elucidam a trajetória do MAM, como os referentes à exposição Bahia no Ibirapuera (1959) de Lina Bo Bardi e Martim Gonçalves, o Panorama destaca outros contextos de modernidade no Brasil (Rio de Janeiro, Bahia, Pernambuco, Belo Horizonte e Brasília) e no mundo.

O desenho expográfico recupera o acesso ao museu situado em frente ao edifício da Bienal, assim como as cores da porta e das paredes, e elimina a presença de painéis perpendiculares que dividem o espaço em pequenas salas.

A realidade agora é outra, como apontam os projetos dos escritórios de arquitetura: se o IV Centenário de São Paulo ganhou o parque Ibirapuera em 1954, como imaginar um presente adequado ao espírito de um V Centenário?

Lisette Lagnado
curadora

Ana Maria Maia
curadora-adjunta


Artistas: Amanda Melo | Bárbara Wagner | Benjamin de Búrca | Clara Ianni | Daniel Steegmann | Dominique Gonzalez-Foerster | Federico Herrero | Fernanda Gomes | Montez Magno | Vítor Cesar | Vivian Caccuri | Yuri Firmeza | Cabelo | Ester Grinspum | Jorge Menna Barreto | Lucia Koch | Luiz Braga | Mônica Nador | Pedro Motta



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Acrílica e colagem sobre tela crua

Aproprio-me do corredor que liga a entrada do MAM à Grande Sala não
só física, mas metaforicamente. Tomo da palavra “corredor” alguns de seus
significados, como “trecho que conecta dois espaços”, “aquele que pratica
a ação de correr” e a da lenda portuguesa que diz que o sétimo filho homem
que não for batizado pelo primogênito se tornará um corredor, alguém que
corre à noite e passa por várias metamorfoses.

Artistas colaboradores
Bhagavan David, intervenção sonora
Jan Nehring, intervenção volumétrica

Mitologias por procuração reúne mais de cinquenta obras pertencentes ao acervo do mam e selecionadas pelos 22 artistas participantes, entre elas duas escolhidas pela curadoria. Este projeto partiu da exposição Mitologias, realizada em dezembro de 2011 na Cité Internationale des Arts, em Paris, que incluiu obras deste mesmo grupo de artistas. O projeto, encomendado pelo Itamaraty, buscava refletir sobre o crescente interesse, no âmbito internacional, pela arte contemporânea brasileira, ao mesmo tempo em que reunia práticas que dialogam com alguns dos múltiplos legados culturais característicos de nossa modernidade.

Ao propor uma versão de Mitologias no mam, interessou-nos sobretudo trazer os questionamentos levantados na primeira versão a fim de fazer uma reflexão acerca das obras que formam a coleção do museu. Para tanto, criamos um mecanismo através do qual cada artista presente em Mitologias foi convidado a selecionar uma ou mais obras do acervo para integrar esta exposição. Assim, desta vez, todo o trabalho curatorial foi caracterizado pela incerteza em relação ao formato final da mostra, já que os artistas ficaram completamente livres em suas escolhas. Estabelecido o prazo de seleção, Mitologias por procuração foi se revelando pouco a pouco, na medida em que recebíamos as nomeações. Estas se caracterizam não apenas pela variedade dos meios e estilos selecionados, mas acima de tudo por representarem um conjunto de obras menos conhecidas atualmente pelo público do museu. De fato, é notável a ausência do que se poderia chamar de “peças chave” da coleção do mam: grandes nomes como Geraldo de Barros, Hélio Oiticica, Mira Schendel, entre tantos outros.

O empenho e a seriedade com que os artistas assumiram sua tarefa revela-se em escolhas que dialogam com suas próprias trajetórias e interesses, abrindo outras vias possíveis de associações entre legados modernos e contemporâneos da arte brasileira que não aquelas propostas pelos críticos, historiadores e curadores. Há, ainda, uma espécie de inversão interessante nesta segunda etapa do projeto: se na mostra Mitologias a curadoria buscou investigar nosso legado histórico a partir de obras contemporâneas, em Mitologias por procuração são obras majoritariamente históricas que apontam para o desenvolvimento da produção contemporânea.

Kiki Mazzuccheli
Curadora

Em 22 de março de 1943, Maria Martins inaugurou sua terceira exposição individual, na Valentine Gallery, em Nova York. Maria: New Sculptures dividia o espaço da galeria com Mondrian: New Paintings. Às límpidas linhas verticais e horizontais, então coloridas e fragmentadas de Mondrian, Maria contrapunha suas escuras formas enredadas. Era a Amazônia que ela buscava figurar nesta mostra, não apenas em imagens, mas também em palavras: para acompanhar a exibição das peças, preparou um catálogo, em inglês, no qual narrava brevemente os mitos que envolviam as oito personagens apresentadas: Amazônia, Cobra Grande, Boiúna, Yara, Yemenjá, Aiokâ, Iacy e Boto.

Este conjunto de esculturas demarca uma mudança decisiva na concepção formal dos trabalhos de Maria Martins. Se antes suas peças tendiam a uma representação mais tradicional da figura humana, com contornos definidos, agora suas personagens, embora ainda reconhecíveis, se fundem a um emaranhado de folhas e galhos que fazem as vezes da floresta tropical. A figura humana começa, a partir de então, a se integrar à natureza, confundindo-se com esta e, em última instância, metamorfoseando-se nela.

Esta exposição busca flagrar as contínuas transformações da forma ao longo do desenvolvimento artístico de Maria Martins, não apenas nas esculturas, mas também nas pinturas, nos desenhos, nas gravuras que com aquelas dialogam. A ideia é mostrar como a desfiguração do humano, nesta obra, é sempre já o início da figuração de outra forma, que se aproxima ora do vegetal, ora do animal. Para tal, dividiu-se a exposição em cinco núcleos – Trópicos, Lianas, Deusas e Monstros, Cantos, Esqueletos − determinados a partir de uma comunicação formal antes que cronológica. Os núcleos não se pretendem estanques, mas, pelo contrário, fluidos (a metamorfose não tem fim). Há obras que se encontram nas passagens de um a outro, que oscilam entre cá e lá.

Pontuam a exposição citações de Euclides da Cunha, Alberto Rangel, Mário de Andrade, Raul Bopp, Flávio de Carvalho e Clarice Lispector. Quer-se, com elas, mostrar como a obra de Maria Martins estava em sintonia com todo um pensamento brasileiro moderno (não só modernista) da forma como formação incessante.

Completando a exibição das esculturas, das pinturas, dos desenhos e das gravuras, apresentam-se uma joia desenhada por Maria Martins e uma série de 17 cerâmicas, que pertenciam à sua casa de Petrópolis. A atividade da artista como escritora também está aqui contemplada, com seus três livros e os artigos publicados por ela no Correio da Manhã, estes últimos praticamente desconhecidos atualmente.

Trópicos
Antes da exposição de 1943, Maria Martins já vinha voltando sua atenção para temas brasileiros, mas ainda moldava seus Samba, Negra, Yara em formas convencionais. Obras como Yemenjá e Iacy, aqui exibidas, já sinalizam o entrelaçamento do elemento humano ao vegetal, embora as figuras representadas sejam ainda claramente discerníveis. Na passagem para o núcleo seguinte, N’oublies pas que je viens des tropiques e Glèbe-ailes, muito parecidas entre si, são variações de um corpo em plena transformação.

Lianas
Neste segundo conjunto de esculturas, há certa concentração nos elementos que eram secundários no primeiro: as formas enredadas que circundavam as figuras principais. Em Comme une liane, é a própria figura feminina que tem seus membros convertidos em algo semelhante a galhos flexíveis ou cipós. Prometheus e Orpheus – que fogem ao tema da floresta, mas não à forma ali ensaiada – se confundem com o entorno emaranhado do qual fazem parte. Na passagem, Hasard hagard e Sûr doute apontam para o estranhamento das formas do núcleo seguinte.

Deusas e Monstros
“Sei que minhas Deusas e sei que meus Monstros / sempre te parecerão sensuais e bárbaros”, escreve Maria Martins no poema Explication, que integra a tiragem especial do catálogo da mostra de 1946, aqui exibido. Ao longo de sua carreira, Maria produziu uma série de deusas e monstros, nos quais a figura humana aparece transformada. Em Impossible, a escultura mais célebre deste núcleo, o caráter erótico da metamorfose se explicita: dois corpos, um feminino e um masculino, são impedidos de se aproximar totalmente em função das estranhas formas pontiagudas de suas cabeças, ao mesmo tempo em que parecem magneticamente – amorosamente – ligados para sempre. Na passagem, as bocas abertas de A tue-tête, O galo e Chanson en suspens antecipam os cantos mudos do próximo núcleo.

Cantos
Em seu livro sobre Nietzsche, Maria Martins demonstra especial admiração pelos cantos de Zaratustra. Em O canto da noite (título que ela toma emprestado para uma de suas esculturas), Nietzsche escreve: “Uma sede está em mim, insaciada e insaciável, que busca erguer a voz”. Em O canto do mar e na escultura sem título, as formas se tornam mais arredondadas, mais indefinidas, mais abstratas, numa possível tentativa de dar forma ao que não é palpável, como a voz. Calendário da eternidade e Très avide, por sua vez, sugerem as aberturas do corpo, pontos de dissolução da forma nos mistérios da profundeza informe: talvez bocas, talvez vulvas.

Esqueletos
De uma maneira geral, a obra de Maria Martins se voltou sobretudo para as formas orgânicas. No entanto, há um conjunto de trabalhos que tendem à forma do esqueleto, ou seja, que se concentram naquilo que, no organismo, bordeja o inorgânico. Brouillard noir e Tamba-tajá perdem corporalidade, se comparadas com outras esculturas suas, e se reduzem a ossaturas. Pourquoi toujours, que pode lembrar a forma de uma planta, é toda pontuada por pequenas caveiras. É como se Maria, barrocamente (e ironicamente), nos recordasse que o que resta do humano, ao fim das metamorfoses, são os ossos. Somente a eles corresponde talvez a utopia de uma forma final.

Veronica Stigger
Curadora

No início da década de 1980, Andy Warhol e eu resolvemos fazer uma colaboração conjunta em um projeto. Havia um entendimento perfeito entre nós. Reprimidos sexualmente por uma educação católica muito preconceituosa, nós dois encarávamos a vida e o mundo da mesma maneira, e ambos nos beneficiamos de nosso relacionamento.

Andy e eu também adorávamos Duchamp, Dalí e Man Ray, todos surrealistas. Eu sabia que algumas pessoas consideravam Andy um dadaísta de tempos posteriores, e eu enxerguei com clareza que devia tomar como ponto de partida a famosa fotografia de 1921 em que Man Ray retratou Duchamp usando chapéu de mulher e vestido. Eles chamaram essa colaboração de Rrose Selavy.

Ficou claro que qualquer colaboração teria que explorar as nossas próprias referências culturais e não apenas expressar uma cópia do trabalho Rrose Selavy, de sessenta anos antes. Fiquei imaginando como lidar com esse limite tênue entre o “roubo” da citação e a “criatividade” de encontrar inspiração no trabalho de outrem.

Resolvemos fotografar o rosto e o cabelo e manter o uniforme comum de Andy na época: jeans, camisa social, gravata quadriculada e bota de caubói. Tínhamos certeza de que a maquiagem facial e a peruca fariam um bom contraste com a gravata e o jeans, que por sua vez iriam amenizar a caricatura feminina. Ficou claro que precisávamos de perucas novas, e Andy obviamente sabia onde encontrá-las.

O primeiro dia da sessão de fotos chegou, e só então percebemos como um pouco de maquiagem e uma expressão calculada não seriam suficientes para transformar um homem em referência de mulher. Por isso, decidimos fazer duas sessões distintas: na primeira, Andy chegou maquiado à mesma maneira das mulheres que ele retratava por encomenda. Nessas fotos, ele tem as mesmas expressões perdidas das senhoras ricas que sempre fotografava. Depois fizemos as sessões glamorosas. Com a ajuda de um maquiador profissional de teatro, Andy se transformou em uma extraordinária Altered Image [imagem alterada].

Oito perucas, dois dias de poses, dezesseis folhas de contato, 349 imagens. Nós tínhamos juntado e misturado elementos estilísticos para expressar uma sexualidade ambígua, dando atenção à confusão de gêneros sexuais e aos estilos de vida alternativos e não conformistas que estavam começando a surgir em Nova York no final da década de 1970.

Levando em conta o estado emocional da cultura por todo o mundo em 2009, as imagens Mistaken Identity, criadas em 1981, continuam falando com eloquência ao observador contemporâneo. Para mim, elas continuam me lembrando Man Ray, minha maior inspiração, e Andy Warhol, meu maior modelo e amigo.

Christopher Makos
Curador

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Com vivacidade, humor e alegria, Alex Vallauri acrescentou formas, cores e imagens inovadoras, que revolucionaram a maneira de se ver e de se fazer arte no Brasil, aos valores estéticos convencionais do desenho, da gravura e da pintura.

O artista percebeu que a obra de arte só poderia ser realmente entendida se o autor se preocupasse também com os anseios e as aspirações das pessoas. Por isso substituiu as técnicas gráficas tradicionais, executadas entre as quatro paredes de seu ateliê, por grandes matrizes que estampava à surdina nos muros e paredes da cidade; criou, assim, signos imediatamente identificados, amados pela multidão anônima que diariamente passava por aqueles lugares. Uma atitude corajosa de um audacioso artista que, desvinculado de falsas vanguardas, almejava a comunicação e a fruição estética: apenas arte, por meio da qual o humor, a ironia, a crítica e o prazer de viver eram magistralmente transmitidos para a população.

Depois de uma fase inicial expressionista, Alex Vallauri encontra na pop art a sua principal inspiração. No final dos anos 1970, o kitsch, símbolo estandardizado da indústria de sonhos típica das grandes cidades, disseminado em São Paulo, Nova York, Chicago e nas principais metrópoles, foi percebido e anexado ludicamente em suas obras. Um jogo no qual a fantasia se misturava com a realidade confusa do cotidiano: uma reinvenção pessoal de Alex Vallauri da pop art nos trópicos…

Em 1978, o artista dá início à sua faceta mais conhecida, a de grafiteiro. Assim a sua Bota preta inicia seu percurso em São Paulo. No começo, timidamente, para em seguida, num voo mais amplo, chegar aos Estados Unidos e se transformar em cartão postal de Nova York.

Da mesma forma que os artistas da pop art Andy Warhol, Claes Oldenburg, Tom Wesselmann, Jasper Johns, Robert Rauschenberg, Roy Lichtenstein, James Rosenquist e George Segal, entre outros, que acreditavam que os objetos e materiais funcionavam como coautores da obra, Vallauri confirmou essa nova maneira de fazer arte ao idealizar a instalação A festa na casa da Rainha do Frango Assado para a 18ª Bienal Internacional de São Paulo. Os objetos da obra expressam intrinsecamente o essencial, instalam uma certa verdade inalcançável à arte por outros meios, testam os limites sacralizados da pintura – mais uma tradução particular, convincente e arrojada deste artista para a pop art latino-americana.

Uma cosmogonia visual que ampliava as discussões sobre a própria criação artística e cuja meta era alcançar um diálogo singular com diferentes técnicas, objetos e/ou materiais.

Assim como os artistas da arte pop almejaram transformar suas obras em múltiplos assinados e numerados para a democratização e o acesso de um número maior de usufruidores/colecionadores, Alex Vallauri, também conseguiu, em parte, popularizar suas criações no Brasil. Elas foram instaladas primeiro nos muros e nas paredes de São Paulo, e posteriormente em Nova York, onde se transformaram em cartões-postais. Por serem diferenciados, foram impressos como símbolos vivos de Nova York. Seus grafites coloridos, diversificados e instalados em pontos incomuns daquela cidade – Soho, Greenwich Village e até na Broadway – foram depois registrados fotograficamente pelo próprio Vallauri, que os transformou em uma edição limitada de fotocópias coloridas, assinadas e datadas pelo autor e agora apresentados nesta exposição.

Desenhista, gravador, pintor e designer, Alex Vallauri foi respeitado em todas as suas atividades artísticas. Apenas o sucesso comercial lhe foi negado, o que jamais o impediu de continuar a criar arte – apenas arte, na qual o humor, a ironia, a crítica e o prazer de viver eram passados para a população sem retoques ou arrependimentos. Um artista transformador, perfeitamente engajado no seu tempo e no seu espaço. Uma carreira desenvolvida num curto intervalo cronológico: entre 1967 e 1987.

Ele intuitivamente pressentiu essa brevidade temporal. Tinha pressa de entender, captar e vivenciar o pouco tempo que a vida lhe destinara; pesquisava e produzia sem parar, nunca se acomodava. Ele queria mais, precisava de mais. O tempo foi demasiadamente curto para uma produção artística tão farta e boa.

João Spinelli
Curador

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O português Rodrigo Oliveira é o autor do primeiro Projeto Parede de 2013, que faz parte do calendário do Ano de Portugal no Brasil

Boa vizinha (Aquarela do Brasil) explora plasticidade da cor em pintura que recorre ao muralismo e à arquitetura para remeter à relaçãoentre ex-colônia e e ex-metrópole

O Projeto Parede do MAM-SP, que convida dois artistas por ano para ocupar com uma obra o corredor de acesso entre o saguão de entrada e a Grande Sala do museu, traz em sua primeira edição de 2013 o artista português Rodrigo Oliveira, cuja participação integra a programação do Ano de Portugal no Brasil com a obra Boa vizinha (Aquarela do Brasil). A abertura acontece paralelamente à da mostra Circuitos cruzados, no dia 22 de janeiro (terça-feira), a partir das 20h.

O artista cria uma pintura formada pela água de chuva que ele mesmo borrifa em pequenos recipientes em que estão pastilhas de aquarela, presos em pequenos godês junto ao teto. De efeito sutil e colorido, a obra aparentemente alegre remete a conteúdos mais profundos e críticos que partem da Política de Boa Vizinhança levada a cabo pelos Estados Unidos durante o governo Roosevelt, (1933-1945), para enfocar a assimilação por Portugal de um ideário brasileiro exótico comunicado principalmente pelas telenovelas exportadas pela ex-colônia para a ex-metrópole ibérica.

Apropriando-se do muralismo e da arquitetura em sua constituição, a obra parte da canção Aquarela do Brasil, de Ary Barroso, tanto em sua execução quanto em sua temática. Assim como a música foi composta em um dia de chuva, também a pintura é formada pela água pluvial e por aquarela.

Assim como dá título à obra, a música serve de tema ao desenho animado Alô, amigos (1942), dos estúdios Disney, grande sucesso criado com o intuito de aproximar as culturas norte-americana e latina. Nele, o que se vê é um Brasil estilizado, colorido e exótico, como nas novelas brasileiras, que firmam esse mesmo ideário em Portugal. O que aparentemente é uma pintura delicada e colorida remete a questões políticas que conferem um caráter melancólico à obra.

A exposição Circuitos Cruzados: o Centre Pompidou encontra o MAM é a reunião de duas coleções relativamente diferentes: a do Centre Pompidou, que cobre todos os estilos artísticos e obras oriundas de diversas culturas – principalmente a ocidental, mas também a asiática, a sul-americana, a africana – e abrange dois séculos; e a coleção do MAM São Paulo que aborda a cena moderna e contemporânea brasileira.

Para esta exposição, foram selecionadas cinco instalações icônicas dos anos 1960-70 que fazem parte da coleção do Centre Pompidou, a maioria funcionando em circuito fechado, a tecnologia de vídeo dos sistemas de vigilância contemporâneos. Estas instalações colocam o espectador diante de alguns desafios nos planos sensorial e intelectual.

Cada uma das seis seções que compõem a mostra baseia-se em uma instalação – de Vito Acconci, Peter Campus, Dan Graham, Bruce Nauman e Nam June Paik, além da obra encomendada a Tony Oursler –, e estabelece uma relação com obras contemporâneas da coleção do MAM dos anos 1970 até hoje; todos os campos e suportes são combinados.

Cada seção está cercada por uma nuvem de palavras-chave que funciona como língua comum de intercomunicação entre os trabalhos. A escolha desse sistema para estabelecer conexões entre as coleções permite-nos ampliar o espectro de reflexão e diluir as fronteiras entre as mídias incluídas na exposição. Ao longo do circuito da mostra, o espectador vai encontrar essas palavras inscritas nas paredes, e a partir delas poderá tecer suas próprias redes de relações.

Esta exposição é o resultado de um intenso diálogo entre duas curadoras. Em Paris, Christine Van Assche, curadora-chefe do Centre Pompidou; em São Paulo, Paula Alzugaray, curadora independente e editora. Desde o início dessa dinâmica, há mais de dois anos, vimos a necessidade de promover uma reunião das coleções, reconhecendo suas particularidades, suas afinidades, suas diferenças. A dimensão política de Circuitos Cruzados consiste no diálogo – entre instituições, países, artistas, mídias e gerações – e no compartilhamento de estratégias e políticas culturais.

Paula Alzugaray e Christine Van Assche
Curadoras

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