Projeto do artista Wagner Malta Tavares à partir da leitura do poema homônimo de Constatinos Kavafis.

Ao longo da parede pequenas lâmpadas de led de cor incandescente são colocadas a cada 50 cm de distância umas das outras formando numa espécie de régua.

A presença das pessoas muda o funcionamento da peça, pois sempre que alguém começar o caminho as luzes se apagam.

Essa mistura de tempos percorridos faz parte do trabalho pois a nossa relação com o correr do tempo também se modifica com a presença dos outros.

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Não se compreende a arte do pós-Segunda Guerra sem a figura incomparável de Piero Manzoni (1933-63) e sua brevíssima trajetória artística. Breve e intensa; ars longa, vita brevis, tal adágio cabe a poucos, como a ele. É o que se percebe hoje, meio século após sua morte. Ao longo de apenas cinco anos, de um lugar até então de pouca influência no contexto artístico europeu, Milão, foi capaz de irradiar, com sua presença e influência, um inédito movimento transformador e inovador. Manzoni não só criou uma obra polêmica, mas também fundou revista e galeria, participou de grupos e movimentos, escreveu manifestos e textos teóricos, cartas para artistas e galeristas, envolvendo uma grande rede de contatos e redesenhando a geografia artística europeia. Revive, assim, o espírito de uma vanguarda pan-europeia radical e experimental. Contra a inércia do passado e as contrafações do presente, pretendia retomar o fio da radicalidade artística europeia, tão desgastada por duas guerras, e reencontrar um solo comum que reunisse as tendências inovadoras que estavam em curso.

Manzoni tem a inventividade e a irreverência de um jovem, coisa ainda rara na Europa daqueles anos. É o típico artista/agitador/agregador das vanguardas históricas do início do século cuja figura retoma, em ação incansável e frenética, característica que manteve até o fim da vida. Foi provavelmente um dos últimos, senão o último, a representar esse papel na vida artística europeia. Seus trabalhos são claros, simples, afirmativos, inequívocos. A começar pela clareza do branco dos Achromes que tudo rejeita; toda ambiguidade e indefinição. Do mesmo modo, são os materiais que viria a usar – até mesmo a merda tem sua clareza. Merda d’Artista (1961) fez a fama de Manzoni. É, para ele, o que Fountain [Fonte] foi para Duchamp. Tornou-se o trabalho “assinatura”, indissociável de sua pessoa, a marca de sua personalidade artística e é, certamente, a obra de arte mais polêmica desde o pós-guerra.

Achrome (1957-63), Linea [Linha] (1959), Uovo [Ovo] (1960), Fiato d’Artista [Sopro de artista] (1960), Merda d’Artista (1961), Scultura vivente [Escultura viva] (1961), Base magica/Scultura vivente [Base mágica/Escultura viva] (1961), Socle du monde [Base do mundo] (1961), obras de sua fase “clássica”, formam uma sucessão lógica, ininterrupta e coerente, radical e poética, que poucos artistas podem reivindicar.

Sua morte precoce, além de transformá-lo em um dos maiores mitos da arte contemporânea, lança uma pergunta: para onde iria, se não tivesse morrido aos 29 anos? Manzoni traz para as novas gerações, antes de tudo, a marca de uma arte de espírito e audácia, com a exuberância e desprendimento da juventude, provocativa, mas feita com o rigor e a coerência de um jovem, que morreu jovem. Quanto mais se pensa a arte como atividade intelectual, como cosa mentale, mas também indissociável de uma prática histórica radical, o nome de Manzoni ressurge e se reafirma como um dos mais originais e influentes do século XX.

Paulo Venâncio Filho
Curador



Como o mundo aparece para nós? Por um lado, as obras de paisagem representam diversos lugares. Por outro, cada artista também se posiciona ao criar uma paisagem, pois figura um local a partir de seu ponto de vista. A paisagem mostra o encontro do artista com o mundo percebido por ele.

Entretanto, as obras de paisagem podem ser consideradas meros reflexos, como se a subjetividade do artista não fizesse parte de sua obra. Nas paisagens em perspectiva, nas fotos e nos filmes, temos a ilusão de ver diretamente a realidade, como se uma janela se abrisse para o mundo: esquecemos o enquadramento artificial e o ponto de vista escolhido.

Para romper com o ilusionismo da paisagem, vários artistas abandonaram as construções em perspectiva e as imagens fotográficas com profundidade visual para explorarem imagens planas. Em vez de janelas, aproximam-se dos mapas, evidenciando a artificialidade das próprias obras. Nesse sentido, os lugares são figurados em primeiro plano, não havendo uma fuga do olhar para o horizonte ao longe: a visão passeia apenas pela superfície opaca.

Reunimos aqui obras da coleção do MAM que exploram a paisagem no primeiro plano, revelando a subjetividade de cada artista na construção de sua visão de mundo. Essas peças se abrem ao mesmo tempo para fora e para dentro, mostrando que olhar o mundo é uma forma de se posicionar nele.

Felipe Chaimovich
Curador


Um dos férteis caminhos para se pensar a formação da arte moderna no Brasil é uma metáfora geológica. Imaginemos um arquipélago em formação, com ilhas de diferentes altitudes, umas mais elevadas, outras menos. Estamos bem antes de um território contínuo, de um continente, como veremos se formar a partir dos anos 1950, com a assimilação das linguagens construtivas do segundo pós-guerra, no qual as linguagens das obras promovem um intenso diálogo entre si, independentemente das relações pessoais entre os artistas.

A ideia do arquipélago vem do caráter idiossincrático das linguagens exploradas, já modernas, que, entretanto, não conversam umas com as outras, cada uma buscando seu próprio caminho. Poderíamos pensar o início da formação desse arquipélago com algumas ilhas já decididamente modernas, por exemplo, Almeida Júnior (1851-1899), Castagneto (1851-1900), Eliseu Visconti (1866-1944), essas ilhas irão se multiplicar com Anita Malfatti (1889-1964), Tarsila do Amaral (1886-1973), Lasar Segall (1891-1957), Goeldi (1895-1961), Di Cavalcanti (1897-1976), Vicente do Rego Monteiro (1899-1970), Ismael Nery (1900-1934), Pancetti (1902-1958), Candido Portinari (1903-1962), Cícero Dias (1907-2003), entre tantos outros. Para o impulso multiplicador, teve papel importante, entre outros fatores, uma vontade de ser moderna, que aflige a cultura brasileira ao longo das primeiras décadas do século passado e se consubstancia na Semana de Arte Moderna de 1922, em São Paulo. Trata-se, agora, não só de experiências modernas isoladas – como os romances de Machado de Assis e Lima Barreto, ou a poesia dos simbolistas Cruz e Sousa e Alphonsus de Guimaraens –, mas também de uma atitude de combate sistemático, conduzida por artistas, escritores e intelectuais, contra os valores acadêmicos que ofereciam obstáculo à modernidade. Entre as ilhas modernas desse arquipélago, encontra-se uma de elevada altitude: a obra de Alberto da Veiga Guignard (Nova Friburgo, RJ, 1896 – Belo Horizonte, MG, 1962).

O lirismo de Guignard é único em nossa modernidade. As paisagens e festas que muitas vezes fazem flutuar – numa atmosfera azul acinzentado, às vezes muito escuro – edificações, casas, igrejas, junto a balões, parecem expor uma fenomenologia do aparecimento, tal como os desenhos e monotipias de Mira Schendel, e as pinturas de Rothko. É como se a arte flagrasse o momento em que as coisas surgem, antes mesmo de encontrarem seu lugar definitivo em um terreno. Os retratos de Guignard, juntamente com as paisagens, são outros capítulos privilegiados da obra do artista.

Seriam muitos os retratos em que poderíamos nos deter, mas os autorretratos, perseguidamente realizados ao longo de décadas, apontam para o lábio leporino que, segundo seus biógrafos, interferiu decisivamente em sua existência, particularmente, na vida amorosa. Mas, surpreendentemente, não se intrometeu na vida do educador. Guignard foi um grande formador de artistas, utilizando-se de gestos e da voz deformada pela deficiência; era capaz de ensinar e, de suas escolas, saíram grandes artistas, antes no Rio de Janeiro e, particularmente, na experiência desenvolvida em Belo Horizonte, a partir de 1944, convidado pelo prefeito Juscelino Kubitschek. Das lições de Guignard, é preciso lembrar aquelas do desenho, recordadas por um dos nossos maiores artistas, seu discípulo Amilcar de Castro, sobre o uso do lápis duro, o grafite seco que não permitia correções. Errou, tem que assumir. E, segundo Amilcar, do desenho ensinado por Guignard, deriva toda sua obra escultórica. Não é pouco.

Diz-se que sua obra é decorativa; Matisse também foi um grande revolucionário decorativo. Agradar aos olhos, hoje, pode ser um pecado, mas, quando uma grande obra se emancipa na modernidade, trazendo prazer à contemplação, e apresenta, com ela, momentos de reflexão junto com o prazer de olhar, é tudo de que precisamos. Aqui, ela está apresentada, com momentos de alguns de seus contemporâneos. Espera-se que o prazer de olhar seja acompanhado pelo gozo do pensar.

Paulo Sergio Duarte
Curador

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Para ocupar o Projeto Parede do segundo semestre de 2015, o MAM convidou o artista Walmor Corrêa que apresenta a obra Metamorfoses e Heterogonia, feita especialmente para o corredor de acesso entre o saguão de entrada e a Grande Sala do museu.

 Metamorfoses e Heterogonia parte de um estudo de anotações sobre a fauna e flora brasileiras encontradas em cartas escritas pelo padre José de Anchieta (1534-1597), que identificavam espécies de pássaros inexistentes, cuja preciosa descrição refletia o pioneirismo da observação de Anchieta, que era um exímio pesquisador. Ao invés de censurar os equívocos, Walmor Corrêa propõe um desdobramento imersivo, dando a eles sustentação. “Desta forma, crio seres empalhados e dioramas que atestam as descrições do século XVI, com pássaros que se alimentam de orvalho e outros que são ratos com asas”, descreve o artista. A obra constitui um recorte fictício de um museu de história natural e, ao mesmo tempo, dá embasamento sobre a história real dos jesuítas no Brasil ao reproduzir o caminho percorrido por Anchieta no estado de São Paulo.

A produção do artista destaca-se pela profunda pesquisa sobre temas históricos e científicos e envolve o olhar do estrangeiro (através de cartas ou desenhos) sobre o novo mundo. Assim, Walmor aproxima a relação entre arte e ciência e atribui verossimilhança às narrativas fantásticas em solo brasileiro. Com diferentes técnicas e linguagens como desenhos, dioramas, animais empalhados e emulações de enciclopédias, cartazes e documentos, Corrêa recria histórias que vão dos mitos populares brasileiros (como Curupira e sereias) até os relatos dos primeiros naturalistas viajantes dos trópicos.

Para o MAM, o projeto consiste numa interferência arquitetônica que dá acesso a um novo setor fictício dentro do museu sob o termo Setor de Taxidermia. Na sequência, é encontrado um grande diorama que representa o mapa do estado de São Paulo, com destaque para o planalto, a serra e o litoral sul – locais por onde os jesuítas passaram, e que registra, sobretudo, o caminho por onde o Padre José de Anchieta passou e, possivelmente, encontrou os animais descritos e resignificados pelo artista.

O mapa conta com cerca de 15 animais empalhados dispostos sobre as possíveis áreas de localização, confeccionados pelo artista por processo de metamorfose, unindo cabeças de roedores a corpos de aves. É importante frisar que nenhum animal foi sacrificado para a obra. Os corpos dos bichos estrangeiros foram comprados em lojas autorizadas para este fim.

“No mês de outubro, o MAM apresenta o 34º Panorama da Arte Brasileira que dá destaque a artefatos arqueológicos pré-coloniais cujos significados são enigmáticos e referências históricas. Para criar um diálogo maior entre as mostras, o MAM nos pediu a indicação de artistas para ocuparem o corredor. Pensando nisso, é fortuito que tal projeto prepare uma zona indistinta entre ciência e arte, pesquisa e narrativa, história e ficção, e o trabalho do Walmor Corrêa oferece uma relação tênue com a exposição de outubro”, afirma Paulo Miyada, um dos curadores ao lado de Aracy Amaral.


Como dialogar sobre o Panorama da Arte Brasileira de hoje e ontem sem cair, mais uma vez, nos mesmos impasses, nas mesmas relativizações? Como, por outro lado, enfatizar os dias de hoje sem ignorar a parcela da arte que se esfacela pelas urgências de um mundo entregue ao consumo e ao espetáculo imediato? Esta exposição oferece a tais perguntas um novo conjunto de enigmas sobre os quais podemos refletir. E discutir. Ela possui uma dupla missão: primeiro, destacar uma parcela da história brasileira pouco conhecida tanto pelo grande público quanto por artistas e pesquisadores: uma seleção significativa de esculturas em pedra polida, primeiras manifestações tridimensionais de que se tem notícia, produzidas aproximadamente entre 4000 e 1000 a.C., encontradas em território que se estende no que hoje é o sudeste meridional do Brasil até a costa do Uruguai. Depois, apresentar um diálogo/provocação, na medida em que essas peças podem motivar as obras produzidas por artistas contemporâneos convidados a contrapor-se a esse imaginário, de acordo com suas próprias personalidades, pesquisas e meios.

Em meio ao universo caótico de nossa realidade, à parte a violenta história de dominações e colonialismos que vivenciamos, emergem essas poderosas pequenas esculturas cujos sentidos originais se perderam, assim como os povos que as produziram: os chamados povos sambaquieiros, que habitaram a costa de uma parte do território em que hoje vivemos – de uma forma que adivinhamos ter sido mais harmoniosa e perene que a atual. Deixaram como vestígios inúmeros sambaquis (nomeação de origem tupi que significa literalmente “monte de conchas”) que marcam a paisagem e guardam, sob as areias, fragmentos e matérias acumulados ao longo de milhares de anos. Deixaram também essas esculturas, que os arqueólogos interpretam como elementos de alguma sorte de rituais e que nos assombram pela síntese formal, pela inventividade dos volumes e pela beleza simples que aprendemos a enxergar com a arte dos princípios do século XX e também com as curvas abauladas da natureza (o ovo, o seixo rolado, a duna de areia, o ventre grávido).

Tais “brasileiros de antes do Brasil” merecem estar em nossa história da cultura e da arte, seja por sua flagrante atenção pela natureza e pelo que os rodeava, seja pela qualidade única e enigmática de suas esculturas. É neste mistério profundamente enraizado na terra e no território que este Panorama vai se envolver. É isso que compartilhamos com os convidados Berna Reale, Cao Guimarães, Cildo Meireles, Erika Verzutti, Miguel Rio Branco e Pitágoras Lopes – artistas de gerações diferentes, vindos de regiões várias e identificados com pesquisas artísticas contrastantes entre si, que foram instados a produzir novos trabalhos que refletissem o Brasil de hoje, quiçá inspirados no de ontem, no que ele tem de inapreensível enquanto conceito, assim como telúrico enquanto presença.

Trata-se de proposições artísticas fortes, pregnantes, dissonantes até. Cada artista constrói uma ambiência com suas obras, sejam elas vídeos, esculturas, fotos, pinturas, instalações ou projetos. Paralelamente, as esculturas pré-históricas apresentam-se com doses igualmente surpreendentes de coesão e variedade. Tempos e espaços chocam-se, enquanto especificidades locais, e tendências globalizantes se confundem. É um enigma de origens e, ao mesmo tempo, de impacto perante o estado da visualidade de nossos dias. Mas, por que não também uma outra forma de ver o panorama da arte brasileira?

Aracy Amaral
Curadora

Paulo Miyada
Curador adjunto

prof. André Prous
Consultoria especial


Artistas: Berna Reale | Cao Guimarães | Cildo Meireles | Erika Verzutti | Miguel Rio Branco | Pitágoras Lopes



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A mostra Vestígios – memória e registro da performance e do site specific, elaborada pelos alunos do curso Laboratório de Curadoria, ministrada por Tobi Maier, foi composta a partir de obras do acervo do MAM e de sua biblioteca. Sua seleção de obras têm em comum o corpo como suporte.

Os trabalhos selecionados de Alex Vallauri, Amílcar Packer, avaf, Cildo Meireles, Hudinilson Jr., Jarbas Lopes, Jorge Menna Barreto, Laura Lima, Márcia X e Michel Groisman são happenings,  atos performáticos ou ações relacionais com o público.

Originalmente imateriais, estas obras estão materializadas em publicações, documentos, cartazes, vídeos e livros dos artistas colecionados pela biblioteca. O grupo de curadores lança um novo olhar sobre as obras pertencentes à instituição, revisitando-as e estabelecendo diálogos entre diversas mostras e instalações feitas em diferentes épocas no museu.

Caneta hidrográfica e nanquim

O corredor que liga a entrada do museu à Grande Sala se transforma num ateliê até o final do ano. Durante 136 dias, cada um dos 53 artistas do coletivo cadaVer se munirá de canetinhas para desenhar na parede mais extensa do corredor. O coletivo existe desde março e dele participam sete ex-integrantes do coletivo Em Obras, que fez em 2010 uma intervenção na passagem subterrânea da rua da Consolação, na região central de São Paulo.

O nome do coletivo chama atenção. Além de remeter à visão individual, ao olhar particular, o nome cadaVer é uma referência à palavra “cadáver”, aludindo à morte do ego, e ao jogo Le cadavre exquis [O cadáver refinado], inventado pelos artistas surrealistas nos anos 1920. Nesse jogo, cada participante faz um desenho numa folha de papel e a dobra, deixando apenas uma parte do traçado à mostra. Em seguida, outro participante continua o desenho sem ver o que o anterior fez. O jogo termina quando todos os participantes tiverem feito seu desenho. O resultado é sempre uma surpresa.

Diversamente dos surrealistas, os integrantes de cadaVer têm plena consciência do seu processo de trabalho. Eles criam a partir do que seus parceiros fazem, construindo uma obra coletiva diante do público: quem visitar o MAM de terça a domingo, das 10h às 18h, pode encontrar um artista do cadaVer desenhando na parede do corredor.

Tudo que é comunitário precisa de regras para funcionar bem. Isso vale para o cadaVer. Quem está no coletivo participando do Projeto Parede, compromete-se a seguir quatro regras: 1) usar os mesmos materiais; 2) trabalhar sozinho – um artista por dia, pelo tempo que julgar necessário durante o horário de funcionamento do museu; 3) registrar o trabalho realizado em seu dia e enviar o registro para um destinatário que armazenará e organizará o processo inteiro; 4) criar com linguagem própria a partir do que outros artistas fizeram, não acrescentando à obra nada realizado previamente, em ateliê, para a parede do MAM.

Como a canetinha foi o material escolhido pelos 53 artistas para executar o Projeto Parede, o desenho é a principal técnica utilizada na obra. Carola Trimano, uma das integrantes do cadaVer, considera o desenho uma prática fundamental para o artista plástico. Para ela, o desenho “é como uma meditação, um momento de quietude e silêncio necessário ao crescimento, ao desenvolvimento, ao contato com a essência gráfica. É isso que nos possibilita expressar nossa alma com fidelidade e depois revelar ao mundo a nossa mensagem”.

Em 2000, com o intuito de incentivar o colecionismo e incrementar seu acervo com importantes obras da produção fotográfica brasileira, o MAM criou o Clube de Colecionadores de Fotografia. O Clube nasceu num momento de institucionalização do meio fotográfico, que coincidiu com o momento em que a fotografia brasileira ganhou maior destaque no cenário internacional, sendo apreciada em mostras pelo mundo afora.

Foram criadas no Clube de Colecionadores de Fotografia frentes de pesquisa que vão da fotografia documental à experimental, inclusive questionando tais nomenclaturas. As relações da linguagem com o real, suas fronteiras com a ficção, a fotografia como suporte de trabalhos artísticos que dialogam com performance, pintura e gravura, entre outras técnicas, se subdividem em módulos denominados Identidade nacional, Documental imaginário, Limites/ Metalinguagem, Retrato/ Autorretrato e Vanguardas históricas. Essas frentes de investigação servem como parâmetro à curadoria, embora diversos artistas transitem por mais de uma delas, como pode ser observado nesta mostra.

O Clube de Colecionadores de Fotografia existe graças à parceria entre o museu e os artistas, que doam seus trabalhos certos de sua contribuição para um acervo de extrema importância no contexto nacional. Ao fomentar a formação de coleções particulares, o MAM ativa a divulgação da arte brasileira e estimula a produção dos artistas. Dessa forma, evidencia-se a vitalidade da fotografia brasileira por meio de suas mais diversas manifestações, que constituem uma visão plural, humanista e de grande densidade poética da cultura brasileira.

Eder Chiodetto
Curador

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O problema ecológico nasce do consumismo. Nos últimos setenta anos, as mercadorias industrializadas têm durado cada vez menos, degradando-se rapidamente em lixo. O ciclo da compra e descarte compromete os recursos naturais, gera poluição e alimenta a insatisfação constante dos consumidores de mercadorias planejadas para cansar, quebrar e passar de moda.

O problema ecológico exige pensar limites para a sociedade de consumo. Algumas das obras aqui reunidas refletem sobre a sedução fácil das mercadorias descartáveis, jogando poeticamente com formas e cores. Outras propõem uma relação durável com as coisas, alimentando o cotidiano sem a necessidade de inserir incessantemente novidades efêmeras no dia a dia. Um terceiro conjunto convida a práticas comunitárias que superam o lucrativo individualismo.

O problema ecológico é a destruição do cotidiano pela promessa de uma novidade sempre inalcançável, oferecida continuamente pela sedutora publicidade, mas que se revela frustrante a cada compra de mais uma mercadoria descartável. Nesse ciclo de ilusões, vamos esquecendo os laços humanos, consumindo o planeta e nos enterrando em lixo.

Felipe Chaimovich
Curador

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Curadoria: Inti Guerrero
Sala Paulo Figueiredo

Em 1930, o artista e arquiteto paulistano Flávio de Carvalho (1899-1973) propôs a construção de uma nova cidade nos trópicos. Sua proposta, intitulada A cidade do homem nu, idealizava uma metrópole para o homem do futuro, o qual, segundo ele, não teria nem Deus, nem propriedade e nem matrimônio. Em outras palavras, tratava-se de um urbanismo pensado para uma humanidade que teria se despojado (despido) da construção cultural do seu corpo. Ou, tal como descrevia Carvalho, um homem “sem tabus escolásticos”, “livre para raciocinar e pensar”, para começar um contínuo e irrefreável processo de curiosidade, mudança e transformação pessoal.

Flávio de Carvalho imaginava sua utopia urbana como uma constelação de centros e laboratórios localizados em círculos concêntricos: um “centro de ensino”, um “centro de parto”, um “laboratório de erótica”, um “centro religioso” (localizado dentro do laboratório de erótica) e um imenso “centro de pesquisa”, em cujo interior o cidadão poderia “descobrir as maravilhas do universo, o prazer pela vida, o entusiasmo em produzir coisas, o desejo de mudar”. No caso específico do “laboratório de erótica” desta singular cidade, Carvalho idealizava-o como um lugar onde “o homem nu selecionaria ele mesmo suas formas de erótica, onde nenhuma restrição exigir-lhe-ia este ou aquele sacrifício; sua energia cerebral seria suficiente para controlar e selecionar seus desejos […] seria o lugar onde encontraria sua alma antiga, onde projetaria sua energia solta em qualquer direção, sem repressão; onde realizaria seus desejos, descobriria novos desejos”. Ao entender a experiência da sexualidade como uma espécie de libido sem uma perspectiva determinada, isto é, sem um desejo construído, mas justamente como uma experiência contínua, rizomática, que se bifurcaria dentro do “laboratório de erótica” de acordo com a subjetividade do indivíduo, Flávio de Carvalho, já em 1930, parecia propor um “plano diretor” que procurava dissolver qualquer fixação sociocultural na sexualidade e corporalidade do indivíduo.

A exposição A cidade do homem nu parte justamente do espírito transgressor de Flávio de Carvalho, em sua singular formulação para construir uma nova paisagem urbana nos trópicos, uma nova realidade. Tomando principalmente a experiência da sexualidade no “laboratório de erótica”, a mostra reúne obra e artefatos culturais que em vez de “ilustrar” o pensamento de Carvalho através do percurso museográfico, construirão o significado radical e contracultural do seu pensamento, abrindo as possibilidades de imaginar como poderia ser aquele lugar “sem tabus escolásticos”, “livre para raciocinar e pensar”, onde a corporalidade e a energia sexual do indivíduo poderiam se dirigir em “qualquer direção, sem repressão”.

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Flávio de Rezende Carvalho (1899-1973) foi arquiteto, artista plástico, escritor e animador cultural com presença na vida paulistana desde fins dos anos 1920. Além das obras realizadas sobre suporte convencional, introduziu outras cuja existência depende do apoio da mídia impressa, intervenções que se iniciam com os primeiros projetos arquitetônicos discutidos no espaço do jornal e se estendem à Experiência n˚ 2, realizada como provocação a uma procissão de Corpus Christi, ao lançamento do traje de verão e à expedição de primeiro contato com tribos indígenas do Alto Rio Negro.

A mostra procura apresentar sua atuação reunindo documentação relativa a vários momentos: o início de sua formação, sua ligação com o movimento da antropofagia, as atividades do CAM e do Teatro da Experiência, as relações estabelecidas em sua viagem à Europa, sua participação na articulação dos Salões de Maio, as experiências dos anos 1950 e o progressivo reconhecimento da década seguinte. Em registro suplementar, o visitante encontrará também um conjunto de retratos, fotografias e caricaturas de Flávio de Carvalho de autoria de outros artistas, além de uma seleção dos catálogos de suas mostras individuais e coletivas.

Rui Moreira Leite
Curador

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Offset, dimensões variadas

O título do trabalho evoca a peça homônima de Pierre Boulez, composta entre 1957 e 1962. A sonoridade da peça sugeriu ao artista uma sequência fotográfica de flashes emulsionando filmes velados em interferências de luz breves e marcantes. Mello executou a ideia fotografando postes de iluminação em Varsóvia, na Polônia. Observados contra um céu neutro, esses objetos se reduzem a um traço, parecendo desenhos. Ao duplicá-los nas fotos e imprimi-los em lambe-lambes, o artista construiu uma espécie de partitura musical errática, propondo uma modulação de formas com diversos ritmos, como nos painéis de azulejos de Athos Bulcão.

O conjunto das obras adquiridas pelo Núcleo Contemporâneo na última década evidenciou a linha experimental na formação recente da coleção do MAM. Ao trabalhar sempre em sintonia com a curadoria do museu, tanto no planejamento das visitas realizadas como na política de aquisições, o Núcleo definiu sua vocação de engajamento na produção contemporânea, pois seus membros acompanham o trabalho de desenvolvimento das mostras do museu do ponto de vista da própria equipe da instituição. Além disso, a frequentação constante de exposições em fase de montagem, complementada pelo contato direto com artistas e curadores, favorece uma compreensão atenta dos processos envolvidos na criação e exibição da arte contemporânea.

Foram aqui selecionadas trinta obras dentre a centena de peças que compõem a seção do Núcleo dentro da coleção do MAM. A variedade de técnicas abrangidas indica a amplitude de possibilidades na produção atual; nesse sentido, destaca-se a obra Quadris de homem=carne / mulher=carne de Laura Lima, tendo sido o MAM, por intermédio do Núcleo, o primeiro museu brasileiro a adquirir uma performance para integrar a coleção permanente.

O centro da Sala Paulo Figueiredo é dominado por duas obras feitas de materiais escultóricos opostos, jornal inflado de vento e telhado de duas águas, um leve e outro pesado, de Franklin Cassaro e de Marepe. Assim, ao entrar na sala, o espectador já é confrontado com a impossibilidade de sintetizar o contemporâneo, motor central da instigante agenda de visitas do Núcleo, cujos integrantes são apaixonados pelo desafio de explorar as fronteiras da arte. Como contraponto, a adesivagem Volpi disco, de avaf (assume vivid astro focus), chama a atenção para a transparência da única janela do cômodo, criando uma perspectiva que conduz o olhar para além do espaço interno do museu, como se os desafios da arte contemporânea não pudessem ser abarcados numa única coleção.

Finalmente o que é o contemporâneo? A impossibilidade de resolver tal investigação leva o Núcleo adiante.

Felipe Chaimovich
Curador

Gordon Matta-Clark desenvolveu seu projeto de desfazer os espaços da arquitetura moderna encenando intervenções metafóricas em edifícios abandonados ou condenados  com o intuito de questionar a autonomia e a lógica econômica pós-1950 nas quais os edifícios foram rapidamente lançados em detrimento de sua função pública. O artista, através desses projetos, apontou para o desaparecimento de capítulos não documentados da memória coletiva e, conseqüentemente, da história e da vida desses lugares.

De 1971 a 1978, Matta-Clark realizadou cortes estruturais e retirou elementos de tijolos e argamassa, pisos e fachadas de casas e edifícios em Santiago, Nova Jersey, Nova York, Niagara, Gênova, Milão, Paris, Antuérpia e Chicago. O processo foi registrado em fotografias e em filme e vídeo.  Tais intervenções, cuja maioria foi conduzida em áreas periféricas, exigiu um esforço físico gigantesco e estavam em lugares onde o acesso era difícil ou que, devido à sua história, foram transformados em mitos. Elas agora pertencem a um corpo de trabalho ainda mais amplo do artista, que também se ramificou em experiências culinárias, estudos alquímicos, dança, performance, desenho e fotografia.

Matta-Clark era uma figura proeminente na comunidade emergente de músicos, escultores, filmmakers, video-makers, cenógrafos e dançarinos na vizinhança nova-iorquina do Soho, após do minimalismo, da arte conceitual e da land art. A partir de sua interação com essas pessoas, Matta-Clark concebeu a ideia e a prática da “anarquitetura”, transmutando a energia criativa individual em ritual compartilhado. Estes artistas ocuparam instalações industriais não utilizadas e as transformou em espaços participativos, não-hierárquicos, gerando um circuito alternativo de inserção das práticas consideradas experimentais à época.

O trabalho central de Gordon Matta-Clark, tal como de Robert Smithson e parte de Hélio Oiticica, é mantido vivo atualmente através de fragmentos e a memória partical e incompleta de documentos fotográficos e audiovisuais. No entanto, seu valor residual e de natureza dispersa retira-se da lógica do monumento e a situa em um tempo mítico, que dialoga fortemente com o presente.

Tatiana Cuevas e Gabriela Rangel
Curadoras

Este polêmico Panorama da Arte Brasileira organizado com artistas estrangeiros atesta a importância da cultura brasileira para um número significativo de artistas não brasileiros. O fenômeno está relacionado ao crescente reconhecimento internacional da arte de Lygia Clark, Hélio Oiticica e Lygia Pape, da arquitetura de Lina Bo Bardi, Oscar Niemeyer e Paulo Mendes da Rocha, da bossa nova ou da tropicália. Se com a antropofagia, celebrada por Oswald de Andrade no “Manifesto antropófago” de 1928, nosso intelectual moderno apropriava-se da cultura europeia para digeri-la e produzir algo próprio, agora é a própria cultura brasileira que é canibalizada pelo estrangeiro.

A exposição reúne obras brasileiras de artistas estrangeiros – arte brasileira é aqui compreendida como aquela que estabelece fortes referências a conteúdos brasileiros. Um segundo grupo de artistas foi convidado a realizar residências em São Paulo, numa parceira com a Fundação Armando Álvares Penteado, para que tivessem a oportunidade de estabelecer uma relação com a cultura brasileira. Oito artistas residentes passam por São Paulo não para realizarem uma obra para o Panorama, mas para iniciarem uma história por aqui. O resultado é uma mostra composta por obras brasileiras feitas por estrangeiros nem tanto com elementos exóticos, mas por meio de uma forte presença da abstração geométrica, na qual a grade é muitas vezes subvertida por elementos orgânicos, sinalizando um legado do neoconcretismo.

O título Mamõyguara opá mamõ pupé é emprestado de uma obra do coletivo de artistas Claire Fontaine, baseado em Paris. Trata-se da tradução para o tupi antigo da expressão foreigners everywhere, e é parte de uma série de esculturas em neon apresentada em diferentes línguas. Num Panorama que desde o anúncio de seu projeto acendeu discussões sobre nacionalismo, territorialidade e xenofobia no campo da prática artística, a expressão numa língua nativa, que em realidade poucos cidadãos brasileiros compreendem, pode soar amarga: estrangeiros em todo lugar.

Adriano Pedrosa
Curador


Artistas: Adrián Villar Rojas | Alessandro Balteo Yazbeck (com Eugenio Espinoza) | Armando Andrade Tudela | Carlos Garaicoa | Cerith Wyn Evans | Claire Fontaine | Damián Ortega | Dominique Gonzalez-Foerster | Franz Ackermann | Gabriel Sierra | Jennifer Allora & Guillermo Calzadilla | Jorge Macchi | Jorge Pedro Núñez | José Dávila | Juan Araujo | Juan Pérez Agirregoikoa | Julião Sarmento | Luisa Lambri | Marjetica Potrc | Mateo López | Mauricio Lupini | Nicolás Guagnini (com Carla Zaccagnini) | Nicolás Robbio | Pablo Siquier | Valdirlei Dias Nunes | Pedro Reyes | Runo Lagomarsino | Sandra Gamarra | Sean Snyder | Simon Evans | Superflex | Tamar Guimarães | Tove Storch



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Fotografias p&b, dimensões variáveis

Com a queda do Muro de Berlim, em 1989, o mundo assistiu ao fim de uma barreira que separava as pessoas física, social e ideologicamente. Ao longo de vinte anos, muitos outros muros têm sido erguidos em vários países para separar e isolar pessoas. A instalação comenta os efeitos desses muros na sociedade contemporânea.

Como montar uma exposição? Os museus geralmente convidam profissionais do próprio meio para selecionar obras e relacioná-las, arrumando-as no espaço expositivo, segundo visões da história da arte.

Entretanto, o MAM convidou os irmãos Campana, consagrados designers industriais brasileiros, para mergulharem na coleção do museu. O resultado é Jardim de infância, uma mostra com obras da coleção do MAM, cujo foco são as formas inusitadas das obras, vistas pelo olhar de dois criadores de objetos utilitários.

Por outro lado, os irmãos Campana convivem regularmente com a produção artística, sobretudo em São Paulo. Assim, artistas referenciais para o processo criativo de ambos também estão aqui representados sob a forma de retratos fotográficos.

Jardim de infância cria um percurso inusitado pelas obras do MAM, em um ambiente colorido que envolve o público numa experiência com a visão, audição e olfato, distanciando-se do ambiente museológico tradicional.

Fernando e Humberto Campana
Curadores

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A exposição celebra um século de nascimento do paisagista Roberto Burle Marx. Este evento é particularmente importante, pois São Paulo foi o berço natal de Burle Marx e o parque do Ibirapuera, embora apenas parcialmente executado, um de seus projetos mais relevantes.

Pintor, desenhista, gravador, escultor, ceramista, cenógrafo, músico, joalheiro e, claro, paisagista, Burle Marx era um artista “total”. Nesse versátil humanista prevaleciam, porém, o pintor e o paisagista. A condição de pintor ajudou-o a transplantar formas da vanguarda artística para os jardins, aplicando na natureza princípios do cubismo e do abstracionismo. Pôde, assim, dar aos jardins uma estética singular e moderna.

O primeiro segmento da exposição abriga a obra plástica de Burle Marx. O conjunto dos trabalhos oferece uma oportunidade única de conhecer uma produção eclipsada pelo retumbante sucesso de Burle Marx como paisagista. As obras evidenciam o grande artista plástico que ele também foi.

O segundo setor é dedicado à obra paisagística. Na definição de Roberto, fazer paisagismo é criar a permanência do instável, vencendo o desafio de obter uma composição perene a partir de elementos instáveis com diferentes ciclos de vida. Para Burle Marx, o jardim planejado deve estabelecer com a paisagem relações de harmonia ou de contraste, ao criar um ambiente bucólico, lúdico ou de refúgio. Concebendo os jardins como microclimas, Burle Marx executou centenas de projetos públicos e residenciais que podem ser vistos nesta seção.

A última sala apresenta retratos a óleo de sua família, uma série de desenhos eróticos e outra da agonia do escritor Lúcio Cardoso, inéditas até esta mostra; fotos do sítio em Guaratiba, Rio de Janeiro, onde morou desde 1972 e cultivou as inúmeras espécies de plantas colhidas em suas expedições. Além de seu potente legado artístico, Roberto Burle Marx, pioneiro na luta por uma política de ecologia e profundo conhecedor de botânica, é uma permanente inspiração na luta pela inserção de uma agenda que inclua a qualidade do meio ambiente no processo de desenvolvimento do Brasil.

Lauro Cavalcanti
Curador

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O início do século XXI assinala um momento especialmente rico do design brasileiro, virada em que o que era desejo e potencial se torna realidade. O design passou a ser praticado nos quatro cantos do país e efetivamente alcançou produtos e serviços em todos os segmentos. O alargamento da fronteira interna se dá com uma força e um vigor extraordinários. No cenário internacional, o país deixa a posição de coadjuvante para ser visto como protagonista.

Sem a pretensão de fazer um ranking dos melhores, muito menos de traçar um panorama exaustivo de uma produção que é vasta e plural, esta exposição faz uma leitura transversal deste momento, com o objetivo de pontuar alguns exemplos reveladores da capacidade criativa dos brasileiros, pinçados de vários campos de atuação do design.

A abrangência da atividade é enorme. Afinal, tudo o que não é natureza é projetado pelo homem, tenhamos consciência disso ou não. O olhar curatorial procurou incentivar a percepção consciente por parte do público em geral sobre a presença do design em seu dia a dia, aumentando a compreensão de seu papel e alcance.

Dentro desse propósito mais amplo, como escolher o que seria apresentado? Nosso primeiro recorte é o temporal: estão aqui apenas projetos realizados de 2000 para cá. Seus autores são designers que vivem no Brasil, o que inclui estrangeiros que adotaram nosso país como sua pátria e trabalhos feitos por brasileiros mundo afora, refletindo o intenso intercâmbio entre nacionalidades que atualmente caracteriza as profissões criativas.

O segundo recorte é o da diversificação. Tivemos a preocupação deliberada de incluir participantes de várias regiões do país e de diferentes gerações, começando por veteranos que já passaram da casa dos 80 anos de idade, como é o caso de Sérgio Rodrigues, na área de móveis, e de Alexandre Wollner, no design gráfico, até chegar a jovens na faixa dos vinte anos, que apenas começaram, mas já mostram seu valor. A diversificação se faz notar também na inclusão de diferentes especialidades do design – móveis, objetos, equipamentos, veículos, acessórios, livros, embalagens, luminárias, vinhetas para tevê e cinema etc. –, que nem sempre convivem nas mesmas salas expositivas e nas mesmas publicações.

Todos os projetos selecionados têm uma função utilitária, foram feitos para atender a determinado propósito e atingir um público específico. Todos eles, ainda, pressupõem a reprodução em série, que pode se dar de várias maneiras, da industrial à artesanal e à digital, passando por várias gradações entre uma e outra, e em várias direções. No entanto, alguns têm a feição de uma obra de arte, enquanto, na outra ponta, outros se pautam sobretudo por requisitos tecnológicos e dialogam com a engenharia. Para dar conta dessa multiplicidade, o critério que “amarrou” os anteriores foi o das fronteiras – vistas menos como separação e mais como interseção.

Adélia Borges
curadora

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Texto é a principal matéria prima da artista americana Jenny Holzer. Ela iniciou sua pesquisa conceitual no final dos anos 1970, explorando o espaço público como suporte para seu trabalho, quase inteiramente composto de palavras e ideias.

A estreia de Holzer aconteceu com os lambe-lambes da série Truisms, de 1977-9. Nesses cartazes, Holzer imprimiu frases como “Você precisa saber onde você acaba e o mundo começa” ou “A revolução começa com mudanças no indivíduo”. Essas frases são exatamente aquilo que o título da série indica: verdades óbvias. No entanto, essas verdades só se tornam realmente potentes quando escancaradas na rua e colocadas, literalmente, na boca do povo.

Das frases de Truisms, Jenny Holzer partiu para os textos de Inflammatory Essays, de 1979-82. Indignação, fúria, ímpeto são alguns dos sentimentos que animam o discurso social da artista. Mais do que inflamados, esses textos são explosivos. Quem passar pelo Projeto Parede de Jenny Holzer que se cuide: corre o risco de se queimar.

Truisms, Inflammatory Essays

Marcel Duchamp: uma obra que não é uma obra “de arte” empresta seu nome de uma questão que Marcel Duchamp anotou em 1913: “Pode alguém fazer obras que não sejam ‘de arte’?”. A questão sinalizou o início de sua desobediência às formas de arte tradicionais e lançou as bases do que o tornaria o artista mais influente dos séculos XX e XXI. Seu repensar insistente da obra “de arte” é o foco desta primeira exposição individual de Duchamp realizada na América Latina, apresentando mais de 120 peças de cada tipo de mídia em que o artista trabalhou de 1913 até o final de sua vida.

A exposição começa com o momento em que Duchamp propõe sua famosa questão, que coincide com o período em que ele começa a conceber os objetos ready-made produzidos em massa como obras de arte em potencial. No entanto, a invenção do ready-made não foi o único gesto inovador de Duchamp desse período: entre outras atividades, ele inventou um novo sistema de medidas, ao declarar a “arte” um experimento; criou várias cópias fotográficas de suas anotações; usou o acaso para fazer música e foi o primeiro a usar a fotografia e a perspectiva para redefinir a pintura – tudo isso entre 1913 e 1914.

Durante anos, Duchamp continuou seus diversos experimentos, muitos dos quais estão representados nesta exposição. As peças estão organizadas em grupos que enfatizam as ligações e a recorrência de preocupações aparentemente diversas em sua obra. As ideias recorrentes de desejo e percepção aparecem numa série de monitores que permitem que o visitante “espie” os diferentes espaços de exibição que Duchamp preparou durante a vida: do posicionamento dos objetos no apartamento de 1910 a seu projeto final, Etant donnés: 1. La chute d’eau/ 2. Le gaz d’éclairage [Sendo dados: 1. A cascata/ 2. O gás de iluminação].

Marcel Duchamp: um trabalho que não é um trabalho “de arte” traz para a América Latina muitas obras raras e excepcionais, num acontecimento histórico que se tornou possível graças aos empréstimos de grandes museus e coleções particulares, incluindo o Philadelphia Museum of Art, o Moderna Museet de Estocolmo e a Sucession Duchamp, na França.

Elena Filipovic
Curadora

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O título desta exposição não se refere à “vida” no sentido de existência biológica. Significa, em vez disso, assumir um novo olhar e fazer descobertas através do simples processo de viver a própria vida.

As culturas do Japão e do Brasil desenvolveram-se sob a influência do modernismo, ainda que tenham se mantido enraizadas em seu meio tradicional e em sua história. O hibridismo também foi comum a ambos os países, que sempre tiveram grande habilidade para abraçar outras culturas. Ainda que seja uma nação marcada por uma mistura de raças, o Brasil continuou a incorporar culturas estrangeiras. O Japão é uma nação insular e quase completamente homogênea do ponto de vista racial, mas isso não o impediu de abraçar ativamente diferentes culturas e — em um processo único — criar formas especificamente japonesas.

Há inúmeras maneiras de aproximar as diferenças entre Japão e Brasil no século XXI. Se o século XX pode ser entendido em três palavras-chave — homem, dinheiro e materialismo (que representam o individualismo, o materialismo e o capitalismo) —, a estas se seguem, no século XXI, três outras palavras-chave — coexistência, inteligência coletiva e consciência. Esses termos refletem uma nova relação entre o indivíduo e a coletividade neste mundo interligado no qual a relação entre indivíduos, meio ambiente e sociedade está em mutação.

As forças por trás do caráter de improvisação da cultura brasileira e da estética do mitate [retrato] e do hibridismo no Japão continuam a produzir obras de alta qualidade, que representam a coexistência entre intelecto, intuição e sensibilidade. Se a improvisação se refere ao sentido de ritmo latente no corpo físico — que pode ser visto na dança e na música —, o mitate representa a derivação ou o retrato de algo distinto daquilo que o objeto parece ser em sua superfície. É um tipo de jogo de palavras ou de metáforas que expressa um outro aspecto do objeto e é abundantemente encontrado em culturas marcadas por um sistema de sofisticados significados e representações. Tanto a improvisação como o mitate caracterizam-se por elementos como “corpo físico”, “meio” e “jogo”, que se desenvolveram a partir da relação com um meio cultural e natural específico.

Em qualquer cultura, existem complexos sistemas de símbolos em que significado e implicação podem se perder com a tradução. É porque derivam de estilos de vida diferentes e vívidos que todos eles permanecem totalmente distintos um dos outros. É a expressão desses variados aspectos da vida como forma que torna possível a conservação de sua complexa riqueza.

Yuko Hasegawa
Curadora

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Intervenção sobre espelhos

Um amigo me disse que houve um tempo em que os espelhos começaram a substituir as pinturas.

Não durou muito tempo.

Hoje, ao contrário, a ideia desses espelhos seria natural nesse corredor, se ele não levasse ao museu. É uma dessas coisas que a gente vê em elevadores, consultórios e outros espaços de passagem. Por isso achei que os espelhos caberiam aqui. Um lugar ao mesmo tempo comum e vulgar, excessivo e límpido.

Notei que não conseguiria resolver a dúvida entre pintar ou não o espelho, e não hesitei mais. Não o fazer seria como jogar fora uma chance única. Já me perguntaram onde está essa pintura. A melhor resposta é de um outro amigo, que olhou o espelho bem de perto e disse: “Este trabalho é a minha cara”.

Na mostra que abre simultaneamente na Sala Paulo Figueiredo no dia 31/1, Ricardo Resende atua como o coordenador da curadoria coletiva junto com a equipe curatorial do MAM-SP. A exposição é resultado do workshop de curadoria ministrado por Resende em agosto do ano passado. Diante do desafio de criar uma exposição baseada nas cerca de 5 mil obras do acervo, os alunos do workshop se dividiram em três grupos: Moderno, Contemporâneo e Moderno/Contemporâneo, que são os diferentes núcleos da mostra.


Ricardo Resende
curador


Capa do catálogo da exposição Panorama
dos Panoramas (2008)

O Panorama da Arte Brasileira é hoje uma das exposições mais tradicionais do país. Sua primeira edição aconteceu em 1969, por ocasião da reinauguração do MAM. Depois de ter permanecido fechado por cerca de sete anos, quando seu acervo foi transferido para a Universidade de São Paulo, o museu criou com esta mostra a possibilidade de formar um novo acervo por meio de premiações e doações dos artistas que participaram de suas edições.

Ao serem apresentados cerca de cem trabalhos que entraram para a coleção do MAM graças ao Panorama, percebe-se o quanto os critérios eram pontuais em suas épocas, evidenciando as transformações dos instrumentos analíticos da história da arte nas últimas quatro décadas. O que era considerado uma grande obra em 1969, hoje não tem o seu valor devidamente reconhecido.

Muitos dos trabalhos expostos estão sendo apresentados pela primeira vez depois que entraram para a coleção. Pode-se especular sobre os possíveis motivos de alguns trabalhos estarem relegados a permanecerem guardados. O espaço físico do museu não permite uma exposição permanente do acervo, por exemplo. Ou talvez falte conexão entre um trabalho específico e a política de formação do acervo que compõem a coleção atual.

Neste sentindo, a exposição poderia se tornar um instrumento para colocar lado a lado nomes desconhecidos na atualidade e consagrados pela mesma história da arte. História que, distante da grande maioria do público, não se abre verdadeiramente para uma compreensão de seus critérios de inclusão e exclusão do que se considera arte ou não, de quais trabalhos são bons ou ruins e se são representativos ou não de uma época.

RICARDO RESENDE
Curador


Artistas: Rubens Mano | Alex Cerveny | Eliane Prolik | Paulo Brusky | Rochelle Costi | Tomie Ohtake | Jac Leirner | Nelson Leirner | Rosana Paulino | Alfredo Volpi | Mauro Restiffe | Tunga | Paulo Buennoz | Oudi Maia Rosa | Wanda Pimentel | Amilcar de Castro | Maria Bonomi | Abraham Palatnik | Alcindo Moreira Filho | Anna Letycia Quadros | Arcângelo Ianelli | Arlindo Daibert | Arnaldo Battaglini | Arthur Luiz Piza | Ascânio MMM | Avatar Moraes | Caetano de Almeida | Cao Guimarães | Carlos Fajardo | Carlos Wladimirsky | Chico Amaral | Cleber Gouveia | Danúbio Gonçalves | Dudi Maia Rosa | Edgard de Souza | Emanoel Araújo | Ernesto Neto | Ester Grinspum | Fernando Velloso | Gilvan Samico | Hermelindo Fiaminghi | Flávio Shiró | Hisao Ohara | Franklin Cassaro | Iran do Espírito Santo | Franz Weissmann | Genilson Soares | Ivald Granato | Joaquim Tenreiro | José Alberto Nemer | José Resende | Juarez Magno | João Loureiro | Lídia Sano | Ada Yamagishi | Luiz Paulo Baravelli | Maria Tomaselli | Marcello Grassmann | Mário Cravo Neto | Marcello Nitsche | Marlene Hori | Nazareth Pacheco | Mary Vieira | Mauro Fuke | Nicolas Vlavianos | Paulatrope | Milton Machado | Paulo Lima Buennoz | Renina Katz | Paulo Pasta | Roberto Bethônico | Pazé | Rodrigo Andrade | Sérgio Sister | Takashi Fukushima | Rubem Valentim | Tomoshige Kusuno | Sérgio Porto | Tuneu | Valquíria Chiarion | Vera Chaves Barcellos | Wilma Martins | Wilson Will Alves | Yiftah Peled | Yutaka Toyota



A arte de mobilizar

Cento e quarenta toques, 140 obras, vinte curadores, um coordenador, número de seguidores desconhecido. Esse é o saldo de um ano de trabalho realizado no Laboratório de curadoria do MAM

A ideia de desvendar os mistérios da curadoria de uma exposição partiu da iniciativa conjunta do Departamento de Curadoria e do Setor Educativo do MAM. Inédito em um museu, o curso foi ministrado pelo próprio curador do MAM, Felipe Chaimovich, que desenvolveu para ele um método baseado no estruturalismo de Claude Lévi-Strauss, no legado curatorial de Harald Szeemann e no princípio dialético do pensamento por opostos.

Segundo Felipe Chaimovich, ao propor uma experiência prática, o curso se diferenciou de outros cursos de curadoria expositivos e historicizantes. Adotado como ferramenta pedagógica, o método dialético permitiu que o processo fosse concluído com a realização de uma curadoria efetivamente coletiva.

Trabalhando individualmente e em grupo, os vinte alunos do Laboratório de curadoria escreveram e reescreveram textos até conseguirem expressar claramente seu desejo comum: organizar uma exposição com obras na coleção do MAM que incitassem a reflexão sobre a mobilização política por meio de redes sociais.

A mostra 140 caracteres surgiu desse desejo coletivo e da participação do grupo em todas as etapas do processo de realização, da pesquisa no acervo à concepção da museografia, da ação educativa à captação de recursos, da produção de legendas às estratégias de marketing. Inserindo-se nos diversos setores do MAM, os alunos do Laboratório aprenderam na prática como se faz uma exposição.

As 140 obras estão dispostas nas duas salas expositivas. Na Grande Sala, quatro módulos da Máquina curatorial do argentino Nicolás Guagnini servem de suporte a retratos e máscaras produzidas por diversos artistas da coleção do MAM, numa clara alusão às formas de representação adotadas em manifestações públicas recentes. Instalações de grandes dimensões, como Uma vista, de Cassio Vasconcellos, ou O telhado, de Marepe, dividem o espaço formando uma espécie de paisagem urbana.

Na Sala Paulo Figueiredo, o cenário é mais político. Um painel com imagens do tempo da ditadura e a piscina de cachaça e entulho que compõe a Transestatal, de Marcelo Cidade, criam o ambiente perfeito para o público tirar fotos na obra Problemas nacionales, de Jonathas de Andrade (ver Perfil contemporâneo).

No saguão do MAM, mais exatamente no novo balcão, está funcionando o Café educativo de Jorge Menna Barreto, obra em que o visitante pode fazer uma pausa para tomar café, folhear uma revista e, principalmente, conversar sobre arte com o educador do MAM que estiver por perto. Afinal, se a ideia é discutir mobilização, nada melhor do que fazer isso num lugar concebido especialmente para promover a integração.

Felipe Chaimovich analisa o resultado: “Após a decisão sobre a curadoria da exposição e a escolha das 140 obras, os alunos puderam trabalhar pela exposição nos setores no museu. Isso diferencia o Laboratório de curadoria de outros cursos similares, além de desafiar os profissionais desses setores do MAM a se integrarem num curso do museu”.

Patrocínio Itaú

O MAM recebe a mostra de fotografia poder provisório, com 86 obras do acervo do museu, na sala Paulo Figueiredo. poder provisório visa discutir a instância do poder em diferentes esferas da vida social, através de imagens documentais e obras conceituais, em sua maioria de cunho político, que utilizam a fotografia como suporte. A curadoria é de Eder Chiodetto, que também é o curador do Clube de Colecionadores de Fotografia do museu.

A mostra é composta por obras realizadas nos últimos cinquenta anos, e busca provocar uma reflexão acerca das esferas de poder em contraponto aos problemas sociais históricos do Brasil. O recorte inclui registros como a queda das Torres Gêmeas – vistos como uma metáfora da intolerância entre culturas diversas e um ápice da crise do capitalismo –, do fotojornalista brasileiro Alcir da Silva, radicado nos EUA; uma extensa série de fotografias realizadas da década de 1970 a 1990, de Orlando Brito, que vão de imagens que revelam a ascensão de Lula, então metalúrgico, a imagens do presidente João Figueiredo no poder, da guerrilha do Araguaia e da votação das Diretas-já.

Também há fotos de Mauro Restiffe durante a posse de Lula no primeiro mandato, em 2003; e até mesmo as manifestações do ano passado, registradas pelo coletivo Mídia Ninja. Permeando esses registros, há xerografias de Bené Fonteles (O dedo do metalúrgico e Corte), offset de Paulo Bruscky (Limpos e desinfetados), fotografias de Claudia Andujar (Yanomami, da série A casa), objetos de Iran do Espírito Santo (Ato único I e Ato único III), apenas para citar algumas obras.

Com projeto expográfico de Marta Bogéa, poder provisório é esteticamente inspirada no poema construtivo “Cidade/City/Cité, de Augusto de Campos. Assim como no poema de Campos, as obras estarão dispostas numa linha contínua (não cronológica), sem espaços entre uma e outra, e com grande alternância de temas, séries e autores, colocando todas as obras e artistas em pé de igualdade. “É como uma ladainha. Uma aparente sucessão que na verdade é uma repetição enfadonha e um tanto sombria”, conta Chiodetto.

Para ver a mostra, o visitante deverá passar por um portal que dá espaço a um zigue-zague, diferente da concepção da sala original, dando lugar a outra arquitetura que convida a seguir a linha de fotos apresentadas, “reforçando a ideia de convulsão e entropia que salta das obras e se manifesta no espaço expositivo”, diz o curador. A partir do portal, o ciclo abre e fecha com duas imagens de Alcir da Silva sobre a queda das Torres Gêmeas, em 11 de setembro de 2001, nos Estados Unidos.

Uma das novidades do acervo do museu apresentadas na mostra são três fotos das manifestações realizadas em São Paulo, em 2013, registradas pelo coletivo Mídia Ninja, cuja atuação é uma alternativa à imprensa tradicional. As transmissões do grupo são realizadas em tempo real pela internet, por meio das redes sociais, apresentando uma cobertura que leva à reflexão sobre a idoneidade da mídia tradicional.

“Um museu tem que estar atento a receber novos meios e reflexões sobre a circulação da imagem”, diz Chiodetto.

No texto de curadoria, que estará disposto abaixo das imagens, acompanhando a linha contínua das fotografias, Chiodetto parte das questões de poder levantadas para interpelar várias outras instâncias de poder: “Quem diz o que pode e o que não pode entrar no acervo do museu? Quem tem o poder de legitimar o que é ou não é arte? Quanto o mercado de arte pode lucrar com uma exposição que pontua doenças crônicas do capital? Quão legítima pode ser a crítica de um curador ao poder, se a própria curadoria é também um exercício de poder? Os bastidores da política podem ser fotografados até que ponto? Se o poder da representação se escora em pontos de vistas subjetivos, quem narra a história oficial?”.

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Obras de Hélio Oiticica, Lygia Clark, Anita Malfatti, Tarsila do Amaral, Amilcar de Castro, Di Cavalcanti, Alfredo Volpi, entre outros grandes nomes da arte nacional, todas pertencentes ao acervo de cerca de três mil obras da Coleção Hecilda e Sergio Fadel estão reunidas na mostra Vontade Construtiva na Coleção Fadel, que o Museu de Arte Moderna de São Paulo abre dia 31 de março, numa nova leitura do curador Paulo Herkenhoff, e fica em cartaz até 15 de junho, com patrocínio da EDF Norte Fluminense.

Depois de inaugurar em 2013 o Museu de Arte do Rio (MAR), Vontade Construtiva na Coleção Fadel chega a São Paulo em nova versão, com 216 obras, algumas compradas exclusivamente para esta edição, como o conjunto de sete peças de serigrafia de Mary Vieira; uma tela de Judith Lauand; tela do português naturalizado brasileiro Alberto Teixeira; uma peça do vanguardista Raul Porto; um óleo sobre tela de Leopoldo Raimo e duas obras do concretista Maurício Nogueira Lima.

A exposição revela como a coligação entre os movimentos modernos e pós-modernos resultaram na edificação cultural do país, além de apresentar ao público a concepção, em sintonia com a famosa frase de Hélio Oiticica, de que existe na arte brasileira “uma vontade construtiva geral”. A frase inspirou o curador a montar a exposição de uma forma ampliada do conceito construtivo, incluindo outros nomes famosos como Iberê Camargo, Ivan Serpa, Waldemar Cordeiro, Waltércio Caldas e Abraham Palatnik.

A vontade construtiva pode ser exemplificada por obras como Maternidade em círculos (1908), de Belmiro de Almeida – anterior à Semana de Arte Moderna de 1922. Também pode ser notado o construtivismo da geração modernista nos retratos de Mário de Andrade e Oswald de Andrade, feitos por Anita Malfatti; e na obras A Boneca (1928) de Tarsila do Amaral, e Roda de Samba (1929) de Di Cavalcanti.

Ao expor o movimento construtivo no Brasil, seja por experiências individuais ou movimentos coletivos, a mostra proporciona a experiência do público tanto com as primeiras aproximações das vanguardas artísticas europeias do início do século XX – quando a geometria era utilizada como indício da razão humana e modo de ordenação da realidade -, como com os desdobramentos entre os anos 1960 e 1980, quando o experimentalismo congregou questões sociopolíticas, além do conceitualismo e a revisão do modernismo.

Os movimentos concretista e neoconcretista conhecidos, respectivamente, pelo racionalismo artístico e reação à objetividade excessiva ganham vida por meio de indivíduos e coletivos, com destaque a dois núcleos distintos, criados nos anos 1950. Do paulista Ruptura, formado por artistas ligados ao concretismo, há obras de Waldemar Cordeiro, Lothar Charoux e Anatol Wladislaw. Já o carioca grupo Frente, usuário da abstração geométrica, ostenta trabalhos de Ivan Serpa e Lygia Pape e obras-primas como a série Bicho (1960), de Lygia Clark; Relevo espacial, de Hélio Oiticica; e Preto Branco, de Aluísio Carvão, ambos de 1959.

Até a Segunda Guerra Mundial, o modernismo brasileiro seguia as vanguardas europeias, que giravam em torno da geometria, que ainda se mantinha como modo de ordenação da realidade e de representação do mundo. A transformação aconteceu após o fim da guerra, com a adesão de artistas, críticos e instituições à ideia da arte abstrata na vertente geométrica. A criação dos Museus de Arte Moderna do Rio de Janeiro e de São Paulo, do MASP e da Bienal de São Paulo acelerou o diálogo internacional dos artistas brasileiros

O início da década de 1950 passou por um processo de extensos embates estéticos. A resistência de modernistas como Mário de Andrade e Di Cavalcanti, por exemplo, à arte abstrata ganhou a aliança do Partido Comunista. No campo da arte abstrata, Waldemar Cordeiro e outros geométricos opunham-se aos informais pela falta de rigor e pelo excesso de individualismo. Os artistas abstrato-geométricos também disputavam entre si, reivindicando princípios diferentes para a organização. Esses conflitos transformaram essa década na mais complexa disputa intelectual da arte brasileira no século XX.

Do período de 1960 a 1980, que engloba a segunda geração construtiva, a mostra conta com obras influenciadas pelo contexto social, econômico e político pelo qual passavam o Brasil e a América Latina neste período, o que abrange a cultura de massa, a ditadura militar e a emancipação da mulher. Com produções inovadoras e diversificadas, artistas como Mira Schendel, Sergio Camargo, Ascânio MMM e Waltércio Caldas evidenciam a consagração do movimento construtivo na cultura brasileira.

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Performance, vídeo e poesia são os meios mais explorados por Luísa Nóbrega. A artista nascida em São Paulo e graduada em filosofia dedica-se a desenvolver trabalhos que envolvem uma vivência radical. Ela optou por não ter domicílio fixo e morar na casa de amigos ou nos espaços que lhe forem oferecidos por algum programa de residência artística, no Brasil ou em qualquer lugar do mundo.

Luísa Nóbrega ocupa o corredor de ligação do MAM com a audioinstalação dias úteis. A obra é fruto da edição de arquivos de áudio que a artista gravou ao longo de cinco dias, cada qual passado dentro de uma linha do metrô paulistano, da hora da abertura à do encerramento das atividades.

Camadas de sons se sobrepõem, tendo como fundo o ruído contínuo do deslizar do trem sobre os trilhos. Na massa sonora da cidade, que as pessoas parecem não ouvir, Luísa Nóbrega colhe momentos de poesia que surpreendem o público do Projeto Parede.

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