Wolfgang Tillmans constrói um mapa do mundo contemporâneo. Cada uma de suas imagens mostra a luz em suas diversas formas, desde cenas nítidas e contrastadas até campos monocromáticos. Ele as pendura em paredes brancas como se fossem constelações contra um fundo claro e brilhante, desenhando figuras com a diferença de cores, tamanhos e espaçamentos entre as partes do trabalho. Mas, ao invés de confortar o espectador com a representação de uma realidade reconhecível, a fotografia é usada por ele para cartografar um universo de acaso e incerteza.
Satélites, planetas e cometas sempre despertaram a atenção de Tillmans. Ele consegue identificar com facilidade os personagens mitológicos que nomeiam os grupos de estrelas em suas fotos noturnas, pois tem observado o céu com telescópios desde a infância. Essa familiaridade com a astronomia deu-lhe uma compreensão geométrica da luz. Ele acompanha as linhas formadas pelas sombras projetadas pela Terra na atmosfera enquanto voa pelo mundo, sempre sentando na janela dos aviões para ficar observando. Como Tillmans entende o comportamento das linhas de irradiação luminosa e dos ângulos de reflexão, consegue determinar a composição de suas imagens conforme as leis da luz em si.
Quando Tillmans começou a estudar fotografia, os telescópios deram lugar às câmeras. Ele leva consigo apenas aparelhos portáteis que se aproximem o mais possível da visão humana. Por esse motivo, somente há dois anos substituiu as câmeras analógicas pelas digitais, quando essas passaram a ter sensores do tamanho de um filme de trinta e cinco milímetros, que é o mais similar à visão humana, além de terem se tornado suficientemente pequenas. Para ele, o importante é ter sempre à mão instrumentos ópticos que mostrem o universo visível como imagem bidimensional.
Qual um astrônomo navegando pela noite, Tillmans busca fenômenos luminosos que possam estabelecer a posição relativa dos corpos entre si. Mas não encontra padrão nenhum: algumas fotos são repetidas em tamanhos diferentes e penduradas duas vezes, enquanto outras são dobradas e encapsuladas em molduras de acrílico, ou podem medir seis metros, e um grupo é abstrato, ou talvez nem tanto. Suas séries são embaralhadas por meio da disposição irregular das imagens em revistas, livros e espaços expositivos. Distorções aparentes e pontos de baixa resolução nas fotos evidenciam a artificialidade do meio óptico utilizado.
A diversidade de temas e imagens na produção de Tillmans afirma sua oposição à escola alemã de fotógrafos contemporâneos iniciada com Bernd Becher e Hilla Becher. Durante os anos 1970, o casal Becher desenvolveu a fotografia seriada como uma homenagem à Nova Objetividade da Alemanha dos anos 1920. Eles retomaram a foto tirada em ângulo frontal, característica da imagem de identificação da polícia e da ciência no começo do século XX, a mesma que foi posteriormente explorada pelos geômetras da vanguarda. As séries regulares de imagens, produzidas com uma geometria calculada, induzem a uma experiência de ordem universal. Mas Tillmans aborda uma realidade diferente.
A ciência recente propõe que o real é produzido por sequências de eventos submetidas a mudanças aleatórias. A natureza é catastrófica. Nenhuma série matemática regular pode ser um modelo adequado do universo, apenas uma possibilidade probabilística. Logo, a geometria linear da luz é um fenômeno raro, pois nos dá uma noção fugidia de posição no interior de um universo caótico. Por outro lado, qualquer tentativa de considerar as leis da luz como modelo absoluto para as séries de fatos reais é apenas uma ilusão.
A luz não é um ponto fixo na longa história do universo em expansão, mas pode guiar nossos dias. Nossas imagens formam nossas constelações, porém se metamorfosearão em algo novo nalgum momento imprevisível. Tillmans toma o mundo pelo que ele é.
Felipe Chaimovich, Hans Ulrich Obrist, Julia Peyton e Sophie O’Brien
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