O Museu de Arte Moderna de São Paulo recebe a exposição Samson Flexor: além do moderno, a partir do dia 22 de janeiro de 2022. Conhecido como um dos pioneiros da abstração no Brasil, Flexor participou ativamente deste importante movimento de renovação das artes visuais no país na década de 1950. Sua contribuição para a abstração geométrica, tanto em sua atuação como artista quanto como mestre de uma nova geração em seu Ateliê Abstração nos anos 1950, é amplamente reconhecida pela crítica. No entanto, seus desenvolvimentos posteriores, caracterizados pela abstração lírica ou informal e pelo retorno à figuração nos seus últimos cinco anos de vida, permanecem pouco conhecidos pelo público.
Segundo a curadora Kiki Mazzucchelli, “é a primeira exposição que tem como foco o desenvolvimento da obra de Flexor a partir de 1957, quando passa a rejeitar as formas estáticas em pinturas onde gradualmente predominam o gesto, a opacidade e a transparência.” A exposição tem como objetivo trazer à luz a obra tardia de Samson Flexor, que marca sua transição do moderno para o contemporâneo ao confrontar questões éticas e estéticas de seu tempo.
É composta por quase uma centena de obras datadas entre os anos 1922 e 1970. São incluídas pinturas conhecidas na trajetória do artista como Abstração Barroca n.2 (1949), que combina a geometrização da figura e a temática brasileira; Aos pés da cruz (1948), pintura originalmente exposta no MAM São Paulo, em 1950, e que se aproxima de uma abstração total; e Vai e vem diagonal em três quadrados (1954), pintura da fase da abstração pura na qual explora as diagonais cruzadas e cria um movimento acentuado pelos contrastes cromáticos.
A tridimensionalidade une novamente os artistas Jacques Douchez (Macôn, França, 1921 – São Paulo, 2012) e Norberto Nicola (São Paulo, 1930 – 2007) em Os pássaros de fogo levantarão voo novamente. As formas tecidas de Jacques Douchez e Norberto Nicola, em cartaz a partir do dia 16 de dezembro no Museu de Arte Moderna de São Paulo. Estreando oficialmente como curador, assume vivid astro focus (avaf) propõe uma reaproximação póstuma entre os artistas. Além disso, a exposição lança luz sobre importantes sucessores do movimento modernista.
A partir de um conjunto de 26 obras em tapeçaria, 13 de cada artista, é possível um resgate dos laços profissionais e afetivos entre os dois amigos, que mantiveram o Atelier Douchez-Nicola, entre 1959 e 1980, mas que não expuseram mais em conjunto após desfazerem a sociedade. Uma das propostas da mostra é traduzir essa conexão, ao criar uma união emocional e física entre os trabalhos de ambos.
O aspecto tridimensional, característica marcante nas criações, entendidas pelos próprios artistas como “formas tecidas”, é refletido também na expografia, coassinada pelo arquiteto Eduardo Chalabi e avaf. As tapeçarias suspensas no teto e as paredes recobertas de espelhos reforçam esse jogo de dimensões. “Neste espaço átmico, busca-se trazer uma narrativa, sem tratar de ser histórica ou retrospectiva, dedicada a obras tecidas por esses artistas”, declara o curador. Para além disso, ele afirma que a expografia foi pensada de forma que os artistas fossem recontextualizados em um ambiente de arte contemporânea.
Em Os pássaros de fogo levantarão voo novamente. As formas tecidas de Jacques Douchez e Norberto Nicola, o mam amplia as reflexões em relação ao movimento modernista e evidencia, desta vez, os artistas que vieram depois dele. “Dando continuidade às reflexões que promoveu ao longo do ano de 2021 sobre o centenário da Semana de Arte Moderna de São Paulo de 1922, o mam desdobra sua programação, agora discutindo artistas das gerações seguintes, que tiveram atuações significativas. O espaço concebido para a mostra traz espelhos e cores que rompem com o tradicional cubo branco e reinventam o ambiente expositivo”, comenta Cauê Alves, curador da instituição.
Jacques Douchez (Macôn, França, 1921 – São Paulo, 2012) e Norberto Nicola (São Paulo, 1930 – 2007) integraram nos anos 1950 o Atelier-Abstração, de Samson Flexor (1907-1971). O artista romeno, inclusive, influenciou os trabalhos dos dois, com seus ideais estéticos e vanguardistas. Em 1959, criaram juntos o Atelier Douchez-Nicola, mas mantiveram a individualidade e a liberdade criativa de cada um. Nicola realizava obras lírico-oníricas e selváticas, e Douchez produzia obras austeras e ascéticas. Em 1980 foram encerradas as atividades do Atelier, pelo qual nunca mais expuseram em conjunto.
assume vivid astro focus (avaf)
assume vivid astro focus (avaf), um coletivo de artistas fundado em 2001, pode assumir diferentes formações, dependendo dos diferentes projetos em que se envolve. avaf trabalha em uma vasta gama de mídias, incluindo instalações, pintura, tapeçaria, neon, papel de parede, música, etc. Com frequência confronta arraigados códigos culturais, questões de gênero e política, por meio de uma superabundância de cores e formas. O pseudônimo é parte fundamental de seu processo de trabalhar “coletivamente”: o intuito central de seus projetos é sempre a criação de um Gesamtkunstwerk [“obra total de arte”], em que o espectador torna-se um com o trabalho de arte. Ser inclusivo é peça-chave para a realizar suas obras. avaf usa a cor como linguagem universal, com a intenção de garantir a participação e entrega do espectador. O público é sempre a peça central em todos os seus projetos.
Legenda da obra em destaque: Norberto Nicola, detalhe da obra Reflexos, 1986/1987. Lã em tear manual, fibras vegetais e pigmentos, 240 × 140 cm. Coleção Ana Rosa da Silva. Foto: João Musa
A nova unidade do Sesc São Paulo, localizada na cidade de Mogi das Cruzes, abre ao público a partir do dia 6 de novembro com a exposição Ausente Manifesto: ver e imaginar na arte contemporânea. A mostra reúne 35 obras do acervo do MAM São Paulo (Museu de Arte Moderna de São Paulo) e de seu clube de colecionadores, e inaugura uma parceria entre as instituições que deve prosseguir, nos próximos meses, com ações que incluem atividades educativas e outras mostras.
A curadoria de Ausente Manifesto é de Cauê Alves, curador do MAM, e Pedro Nery, museólogo da instituição.
As obras escolhidas são de artistas contemporâneos que transpõem as divisões sedimentadas das linguagens artísticas, trazendo à tona um jogo entre desenho e instalações, vídeo e imagem, fotografia e representação. A ideia é criar uma oportunidade de aproximar o público amplo e diverso do Sesc da arte contemporânea.
Os artistas que integram a mostra são Adriana Varejão, Angela Detanico, Anna Bella Geiger, Antonio Dias, Cao Guimarães, Carlito Carvalhosa, Cinthia Marcelle, Coletivo Garapa, Dora Longo Bahia, Efrain Almeida, Ernesto Neto, Fabrício Lopez, Gabriel Velarde, Gilvan Barreto, Jonathas de Andrade, José Damasceno, José Patrício, Lenora de Barros, Lucia Koch, Marcius Galan, Marepe, Matheus Rocha Pitta, Mídia Ninja, Milton Machado, Milton Marques, Nelson Leirner, Nuno Ramos, Rafael Lain, Regina Silveira, Rivane Neueschwander, Romy Pocztaruk, Sara Ramo, Tadeu Jungle, Thiago Bortolozzo, Thiago Honório e Waltércio Caldas.
A exposição reforça um caráter inusitado, e por vezes irônico, da arte contemporânea em deturpar a lógica de representação dos objetos que são reconhecidos por suas utilidades, estabelecendo, dessa forma, uma ordem diferente entre o que é representar e criar. A arte é produtora do simbólico de nascença, ou seja, quando criada ela não tem uma utilidade prática.
Créditos: Waltercio Caldas (Rio de Janeiro, RJ, 1946), Copo fotografando o copo, 2015. Serigrafia e fotografia sobre papel, 44,5 x 95 cm. Clube de Colecionadores de Fotografia MAM São Paulo. Foto: Estúdio 17
A proximidade das celebrações do centenário da Semana de Arte Moderna induz a novas reflexões sobre os eventos ocorridos no Theatro Municipal de São Paulo em fevereiro de 1922 e sobre o papel desses acontecimentos na instauração do modernismo no Brasil.
Mais que propor uma apreciação assertiva, a exposição Moderno onde? Moderno quando? retoma o tema, evitando respostas prontas, cristalizadas pela voz corrente.
Será que a Semana de 22 foi um divisor de águas entre o velho e o novo, entre o “passadismo” e o “modernismo”? Se nos debruçarmos sobre a produção artística, musical, arquitetônica e literária que antecede a Semana – também em outras localidades além de São Paulo –, encontraremos incontáveis evidências de que a Semana faz parte de um amplo e descontínuo processo que a extrapola, tanto temporal como territorialmente.
Assim, esta mostra reúne um conjunto de pinturas, esculturas, desenhos e fotografias que expressam uma intenção inovadora – na composição, na fatura ou no tema tratado –, independentemente da data e do local de produção. Moderno onde? Moderno quando? visa a apresentar artistas e obras participantes do evento no Theatro Municipal – nem sempre tão modernos quanto se imaginaria –, assim como trabalhos realizados por artistas que os precederam e/ou sucederam, em meio à sempre complexa conjunção político-cultural do Brasil.
Aracy A. Amaral Regina Teixeira de Barros Curadoras
Artistas: Abigail de Andrade, Alberto da Veiga Guignard, Alfredo Volpi, Almeida Júnior, Alvim Corrêa, Anita Malfatti, Antonio Garcia Moya, Antonio Gomide, Antonio Paim Vieira, Artur Timótheo da Costa, Candido Portinari, Carlos Oswald, Cícero Dias, Eliseu d’Angelo Visconti, Emiliano Di Cavalcanti, Estevão Silva, Flavio de Carvalho, Gregori Warchavchik, Ignácio da Costa Ferreira (Ferrignac), Ismael Nery, Joaquim do Rego Monteiro, John Graz, Lasar Segall, Lívio Abramo, Manoel Santiago, Oswaldo Goeldi, Raimundo Cela, Regina Gomide Graz, Rodolfo Chambelland, Tarsila do Amaral, Valério Vieira, Vicente do Rego Monteiro, Victor Brecheret, Victor Dubugras, Wilheim Haarberg e Zina Aita.
Contam os mais velhos do povo Makuxi que, nos tempos antigos, Surarî’ foi abandonado no mato por um caçador. Ao sentir saudades dele, Surarî’ virou gente e decidiu subir aos céus atrás de seu dono. Para isso, pediu ajuda a um pequeno gavião que o levou nas costas. Quando chegou lá, Surarî’ se transformou novamente, ganhando corpo de estrela. Tornou-se responsável por trazer as chuvas e lembrar que, depois do tempo da seca, haverá ainda um outro tempo possível, o das águas.
Surarî’ é a palavra na língua makuxi que designa o moquém, jirau usado para desidratar e defumar carne. A técnica de moquear, uma forma de conservar o alimento e facilitar o seu transporte dos locais de caça e pesca até as aldeias, é boa para pensar o trânsito de provimentos e de saberes que atravessam não só diferentes espaços, mas também diferentes mundos. São trânsitos como estes que constituem os movimentos da arte indígena contemporânea. A chuva provocada por Surarî’ é uma maneira de conceber os fazeres dos artistas indígenas como veículo entre distintas temporalidades e um modo de produzir e atualizar relações.
Moquém_Surarî: arte indígena contemporânea apresenta trabalhos de 34 artistas indígenas que corporificam transformações, traduções visuais de suas cosmologias e narrativas, presentificando a profundidade temporal que fundamenta suas práticas. As obras atestam que o tempo da arte indígena contemporânea não é refém do passado. A ancestralidade é mobilizada no agora, reconfigurando posições enunciativas e relações de poder para produzir outras formas de encontro entre mundos não fundamentadas nos extrativismos coloniais.
Jaider Esbell curador Paula Berbert assistente de curadoria Pedro de Niemeyer Cesarino consultor
A exposição é uma correalização entre MAM e Fundação Bienal de São Paulo e integra a rede de parcerias da 34ª Bienal.
Programação
Além da exposição na sede do MAM, a mostra contará com uma série de depoimentos inéditos em vídeo de sete artistas de Roraima, que serão divulgados ao longo do período expositivo nos canais digitais do museu, como também ampla programação educativa, que contará com oficinas e lives com os artistas sobre assuntos como arte e xamanismo, povos indígenas e a história da arte no Brasil e a força das mulheres indígenas nas artes.
Catálogo
Próximo do encerramento da exposição, será lançado um catálogo que reúne textos críticos e ensaios de artistas.
Lista completa de artistas
Ailton Krenak | Amazoner Arawak | Antonio Brasil Marubo | Arissana Pataxó | Armando Mariano Marubo | Bartô | Bernaldina José Pedro | Bu’ú Kennedy | Carlos Papá | Carmézia Emiliano | Charles Gabriel | Daiara Tukano | Dalzira Xakriabá | Davi Kopenawa | Denilson Baniwa | Diogo Lima | Elisclésio Makuxi | Fanor Xirixana | Gustavo Caboco | Isael Maxakali | Isaiais Miliano | Jaider Esbell | Joseca Yanomami | Luiz Matheus | MAHKU | Mario Flores Taurepang | Nei Leite Xakriabá | Paulino Joaquim Marubo | Rita Sales Huni Kuin | Rivaldo Tapyrapé | Sueli Maxakali | Vernon Foster | Yaka Huni Kuin | Yermollay Caripoune
Zona da Mata corresponde geograficamente à faixa litorânea da região nordeste do Brasil, paralela ao Oceano Atlântico, que se estende do Rio Grande do Norte até a Bahia. Trecho da Mata Atlântica original, hoje quase extinta na região, foi solo fértil explorado de modo predatório. Porta de entrada para a colonização, é historicamente um território de conflito, instaurado no modo de invasão e ocupação, matriz de destituição dos povos originários e da diáspora afro no país.
Essa exposição adota o termo Zona da Mata como metáfora simbólica, não apenas no sentido da geografia física, no enfrentamento necessário do desafio de tratarmos da violenta constituição de nosso território. Frente à exploração predatória de pessoas e lugares, como restituir dignidade ao que precisamos reconhecer como nossa morada? É incontornável repactuar nossa condição humana na indissociável relação entre cultura e natureza.
Diante do Brasil em febril convulsão, violentamente retrógrado, Zona da Mata é hoje todo o País. Alinhados ao desafio mundial, precisamos mais do que nunca nos reposicionarmos frente ao nosso pacto de país e sociedade, a começar por reconhecer saberes ancestrais que não soubemos acalentar, sem aprisioná-los em um passado histórico, mas como parte fundamental de nosso desejável presente.
A exposição se organiza em quatro partes em diferentes espaços e com distintas temporalidades. Por isso, nunca estamos diante da totalidade da mostra, mas apenas de fragmentos. Ocorre no MAC USP (5o. andar ala B e térreo) durante toda a extensão de tempo e no MAM (na sala de vidro em dois tempos). Usufrui da condição de necessário atravessamento, mais ágil no percurso feito a pé do que motorizado, para articular os dois pontos avizinhados, desconectados a posteriori do projeto de transformação do Ibirapuera em 1954, onde originalmente se encontrava uma mata alagadiça – “mata que já foi mata” em Tupi Guarani. Intenta um ir-e-vir aderente ao chão da cidade, endereçada ao presente e ao porvir, no pacto indissociável de uma paisagem compartilhada e simultaneamente desviada, a partir da singularidade vibrante de cada obra convidada e do acervo de ambas as instituições que integram essa mostra-paisagem.
Ana Magalhães Cauê Alves Marta Bogéa Curadores
Legenda: Rodrigo Bueno (Campinas, SP, 1967). Origem e Destino, 2021. Foto: Karina Bacci.
Quando a canonização do movimento modernista tende a se fechar em torno de um número restrito de seus expoentes, é hora de alargar o campo de investigação e enveredar por sendas menos exploradas, em busca de artistas e modalidades diversos daqueles já consagrados.
Entre tantos aspectos da revolução cultural das primeiras décadas do século XX, aqui nos interessa a arte que informa o cotidiano e põe a vida doméstica em sintonia com a grande onda de modernização da sociedade. Vale lembrar que a criação de ambientes e objetos de linhas “modernas” iniciada nesse período está na origem do que hoje entendemos como “design de produtos”.
A partir do sucesso da Exposição de Artes Decorativas de Paris, em 1925, o art déco ganha repercussão internacional e chega ao Brasil. Antonio Gomide, sua irmã Regina e o marido dela, John Graz, seriam os arautos dessa tendência em São Paulo. Com obras taxadas de “decorativas”, os protagonistas dessa vertente do modernismo são vistos, muitas vezes, como artistas “menores”. No entanto, os três são modernistas de primeira geração. Graz participa da Semana de Arte Moderna a convite de Oswald de Andrade, entusiasmado com as telas que vê na mostra do pintor suíço recém-chegado a São Paulo. Na mesma exposição, as criações têxteis de Regina não chegam a impressionar o crítico. Essa indiferença revela a incompreensão da importância que a fusão de arte e artesanato teria na Europa do entreguerras. Por seu turno, Antonio Gomide, residente em Paris, traz, em 1926, um conjunto de pinturas de sua autoria para expor na capital paulista, provando ser um pintor maduro e familiarizado com o cubismo e a Escola de Paris.
Formados na Escola de Belas Artes de Genebra e com larga vivência da cultura europeia, eles se fixam em São Paulo, numa época em que a cidade passa por grandes transformações, sob o impacto da industrialização e da massa de imigrantes que aqui busca “fazer a América”. Diante de um mercado de arte restrito e conservador, Graz logo vê que não daria para viver de pintura. Procura então introduzir ambientes modernos em moradias da alta burguesia. Bem-sucedido, pauta seu trabalho pelo conceito de “arte total”. Em busca da unidade formal, tudo é desenhado por ele. No mobiliário, sobressai a dominância de formas geométricas, a adoção de materiais industrializados, como os tubos metálicos e a madeira folheada. Não se trata de produção em série, mas de fatura artesanal e exclusiva. Regina participa de seus projetos, com tapetes, tapeçarias, cortinas e almofadas. Versátil em várias técnicas, não é simples colaboradora – dá aulas em seu ateliê e funda a fábrica Tapetes Regina. Antonio Gomide também atua em várias frentes. Transita da pintura a óleo ao afresco, dos vitrais aos biombos e objetos decorativos, sempre com competência e buscando alguma estabilidade financeira.
A modernidade do trabalho desses artistas vem da dissolução de fronteiras e hierarquias entre modalidades artísticas e da atividade projetual dedicada à criação de murais, vitrais e tapeçarias, em diálogo com a arquitetura. Seu público: a elite simpatizante do modernismo, viajada e culta, de cafeicultores em decadência e industriais em ascensão.
Maria Alice Milliet Curadora
Quando o Museu de Arte Moderna de São Paulo havia recém conquistado sua nova sede no Parque Ibirapuera, Diná Lopes Coelho, organizou em 1971 o catálogo e a mostra retrospectiva de Emiliano Di Cavalcanti (1897-1976). Tratava-se de uma exposição que celebrava 50 anos de trajetória do idealizador da Semana de 22.
A exposição 50 anos de Arte: Di Cavalcanti ficou em cartaz de 28 de outubro a 5 de dezembro de 1971 e apresentou trabalhos em pintura, caricatura, desenho, gravura, publicações, tapeçaria e joias trazidas de instituições de diversas cidades do Brasil e da Europa. Trata-se de uma mostra significativa e de grande repercussão para a compreensão de seu trabalho. Apesar de um pintor versátil, a obra de Di Cavalcanti possui unidade que não pode compreendida apenas por fases cronológicas. O artista retomou ao longo de toda a sua trajetória temas como pescadores, paisagens, músicos, o samba, o carnaval e, principalmente, figuras femininas e curvilíneas.
A presente mostra foi realizada apenas com o acervo bibliográfico e audiovisual da Biblioteca Paulo Mendes de Almeida, que guarda e memória institucional do MAM e é referência para a pesquisa sobre arte moderna e contemporânea. A exposição é constituída por catálogo, pôster, convite, recorte do jornal Diário do Povo e filme de época sobre a exposição retrospectiva de Di Cavalcanti. Realizada meio século depois da mostra de 1971, Di Cavalcanti no MAM: 50 anos x 2 é uma homenagem a um dos protagonistas da arte moderna brasileira e contribui para os estudos sobre a história das exposições no Brasil.
Cauê Alves Curador
Como o próprio título indica, a obra tem relação com um pedido de socorro. A sigla SOS está escrita em braile, o que envolveria o tato para decodificar os pontos em relevo. A artista se vale de círculos de metal usados em sinalizações de pisos para alertar pessoas com deficiência visual sobre obstáculos. A mudança de escala dos sinais, num tamanho muito maior que o nosso corpo alcança, impede que a leitura ocorra completamente e, assim, é como se as palavras jamais pudessem ser compreendidas.
A inversão das coordenadas de orientação no espaço, ao colocar na vertical o piso tátil projetado para superfícies horizontais, pode gerar vertigem. E de fato o ambiente espelhado envolve e captura os espectadores que atravessam o corredor do museu. Nosso olhar é levado em movimentos espiralados para o interior de espaços imaginários e atordoantes.
As imagens reúnem uma espécie de paisagem construída com fotografias de minerais que se mesclam com grades e fragmentos de arquiteturas labirínticas. A partir da manipulação de imagens digitais é como se sobrevoássemos paisagens convertidas em fósseis que condensam tempos diferentes. Como se avistássemos do alto um território em ruínas, um mundo devastado. As linhas da pedra fotografada trazem a ideia de fratura, de colapso da natureza e da cultura.
As montagens fotográficas emolduradas são opacas, contrastam com o brilho do fundo, mas se integram ao conjunto distópico. Os elementos que apontam para a ideia de futuro são tratados pela artista como algo já sedimentado, como resto petrificado do passado. Em vez de promessa de felicidade, de crença num mundo melhor, a obra parece tratar da falência e da impossibilidade de salvação.
Cauê Alves Curador
Além do Jardim de Esculturas, o Museu de Arte Moderna de São Paulo possui uma coleção de obras tridimensionais de grande relevância histórica e cultural. Nas obras do acervo do mam aqui em destaque, é possível perceber duas tradições contrastantes: de um lado a escultura figurativa, em que o artista representa corpos humanos com linhas curvas; e de outro peças geométricas, mais racionais, construídas a partir de planos, retas e círculos.
As obras de Alfredo Ceschiatti, realizadas em bronze fundido nas décadas de 1950 e 1960, com predominância de personagens femininos, deixam evidente a simplificação tanto da figura humana, com formas orgânicas, quanto das vestimentas com efeitos que insinuam movimento ao conjunto.
Já as esculturas de Sérvulo Esmeraldo e Joaquim Tenreiro, ambas feitas de ferro nas décadas de 1970 e 1980, são abstrações formadas por volumes e vazios. Essas obras se afastam da noção de representação e se organizam a partir do equilíbrio de placas e barras soldadas.
Esse pequeno conjunto pode ser compreendido como uma extensão do Jardim de Esculturas do mam. O espaço envidraçado, pela sua transparência, permite um diálogo mais evidente com a marquise e o entorno. O acervo em destaque pode plenamente ser visto do lado de fora, é um modo de o museu se abrir para o Parque Ibirapuera e trazer os mais diversos públicos para perto. Seja bem-vindo!
Cauê Alves Curador
“Past/Future/Present:Contemporary Brazilian Art from the Museum of Modern Art, São Paulo” Curadoria Vanessa Davidson e Cauê Alves Onde: Phoenix Art Museum, Texas, EUA Visitação 01 de setembro a 17 de dezembro de 2017
Cássio Vasconcellos (São Paulo, 1965), Uma vista (A Perspective), 2002. Col. mam
Ao falecer, em agosto de 2018, Antonio Dias havia reunido uma coleção das próprias obras que recobria toda sua trajetória artística. O conjunto compunha-se tanto de peças de que ele nunca havia se separado, como de outras recompradas de terceiros para quem tinham sido vendidas. Tratava-se, pois, de uma representação de si mesmo intencionalmente construída, mantida e guardada.
A atitude de colecionar-se manifesta um aspecto essencial do artista: Antonio Dias cultivou uma ética do trabalho que permite compreender seu percurso a partir de posicionamentos claramente formulados por ele. Assim, a escolha dos componentes desta coleção testemunha atenção para com princípios que acompanharam o artista ao longo de sua vida e que deviam ser mantidos próximos a si.
Reunimos aqui parte dessa coleção única. Além de contar com peças emblemáticas, como Nota sobre a morte acidental e Anywhere Is My Land, o conjunto vai desde as primeiras obras abstratas do início dos anos 1960 até a última tela pintada por Antonio Dias. A mostra divide-se cronologicamente. Inicia-se com as obras mais recentes, onde o uso de pigmentos minerais condutores de eletricidade importava ao artista pela presença do material carregado de carga física. A segunda seção reúne obras com o uso de palavras, frequentemente em inglês, em composições áridas em preto, branco e cinza, que parecem colocar em questão seu próprio sentido como arte, pois negam qualquer prazer ao público. O terceiro conjunto é composto por peças dos anos 1960, cujas figuras fragmentadas remetem à violência do Brasil ditatorial, ao sexo e a vísceras extirpadas. Ao longo do percurso, há também obras singulares, como as abstrações do jovem artista feitas logo após seu estudo inicial com o gravurista Oswaldo Goeldi, os filmes realizados em Nova York entre 1971 e 1972, e as diversas representações do corpo. Pontuando todo o percurso, diferentes autorretratos registram o amadurecimento do autor.
A obra, apesar de múltipla, apresenta um aspecto comum: é impossível a experiência de uma compreensão total de cada peça; ao contrário, o público é confrontado com uma construção incapaz de apresentar-se íntegra. Com o método que gera objetos para os quais sempre falta o sentido total, emerge a dimensão ética da obra de Antonio Dias: a incompletude da existência humana. A constância dos temas existenciais garante um sentido testemunhal à obra de Antonio Dias. Portanto, a coleção que ele formou de si mesmo é uma síntese única, tanto pelo percurso que organiza ao longo das várias fases, como pela declaração dos valores éticos norteadores de sua arte.
A oportunidade de exibir parte da coleção nesta mostra, ainda durante período de luto pelo artista, só foi possível graças à generosidade da família; a ela é dedicada a exposição.
Felipe Chaimovich curador
A exposição integra a 34ª Bienal de São Paulo.
Mini doc exposição Antonio Dias: derrotas e vitórias
Esta obra reveste o corredor do mam com paredes de pau a pique. A técnica de construção usa uma trama quadriculada de galhos e bambus entrelaçados de forma regular, gerando uma estrutura oca posteriormente preenchida com barro. Esse procedimento tem sido empregado no Brasil, desde o período colonial. Sua ampla presença em edificações para diferentes classes sociais, ao longo da história evidencia uma continuidade material entre os prédios ostentosos, como a igreja barroca, e as moradias populares, como a casa da roça. Parte dos galhos aqui utilizados veio do parque do Ibirapuera; somados à terra aparente, trazem um cheiro orgânico ao corredor. Ao construir com elementos vivos do entorno, o artista aproxima museu e natureza por meio de um saber que nos une a um Brasil profundo.
*Este título vem do poema e do livro “Roça barroca” da poeta e tradutora Josely Vianna Baptista.
Thiago Honório, “Estudos para roçabarroca“, 2018/2020, Lápis de cor e grafite sobre papel, 42 x 60 cm. Foto: Edouard Fraipont
Colecionar arte é a possibilidade de olhar por um viés fascinante para a diversidade humana. É colocar em perspectiva pontos de vista que se descolam da obviedade aparente e nos fazem refletir em profundidade sobre os mais distintos aspectos da vida em sociedade. Logo, os museus e suas coleções são espaços democráticos que fomentam a reflexão, a convivência das diferenças, o debate sem dogmas, a formação de repertório.
O Clube de Colecionadores de Fotografia do Museu de Arte Moderna de São Paulo, tendo este foco, foi criado em 2000. Ao completar agora 20 anos e 21 edições, reúne obras de 107 artistas que passaram a integrar o acervo do museu e também as coleções particulares de centenas de pessoas que fazem ou fizeram parte do Clube nessas duas décadas. Esta exposição é uma homenagem a esses colecionadores que impulsionam o circuito de arte, incentivam os artistas e ratificam a importância do papel social de instituições culturais como o MAM.
Para esta exposição comemorativa, tivemos a curiosidade de entender como as escolhas curatoriais do Clube impactaram a vida e as coleções de seus sócios. Visitamos a casa de uma dezena deles para observar como as obras adquiridas por meio do Clube são acolhidas, exibidas e guardadas. As fotografias que mostram as obras nas residências surgem nessa exposição em meio às obras do Clube que integram o acervo do MAM. São como janelas pelas quais podemos entrar na casa dos sócios e sentir um pouco da forma como eles convivem com as criações dos artistas.
No diálogo com os sócios, notamos que os princípios que nortearam a criação do Clube, 20 anos atrás, estão se cumprindo plenamente. Muitos deles começaram timidamente suas coleções a partir das obras do Clube. Incentivados por essas aquisições, acabaram por pesquisar os artistas, a história da arte e da fotografia, e hoje possuem amplas coleções.
A existência do Clube de Colecionadores de Fotografia do MAM só é possível graças à parceria entre o museu que organiza as ações, os artistas que doam suas obras e os sócios que incentivam a produção artística e a existência do próprio museu. Dessa forma, tanto o MAM quanto os colecionadores seguem construindo, ano após ano, um acervo perene de extrema importância, por meio do qual podemos refletir sobre a cultura brasileira, nossa mestiçagem, nossos dramas sociais, nossa identidade, nossa capacidade de nos reinventarmos à revelia dos desmandos do poder hierárquico.
A arte é e sempre será a trincheira na qual nos abrigamos e nos conectamos com o outro para ativar uma percepção sensível sobre nosso entorno, a partir da qual criamos uma visão menos dogmática, mais libertária e humanista. Aos sócios do Clube de Colecionadores de Fotografia do MAM de hoje, de ontem e de sempre, e a vocês que frequentam o museu, nossos mais sinceros agradecimentos por fazer com que sigamos acreditando em nossos sonhos.
Eder Chiodetto Curador do Clube de Colecionadores de Fotografia do MAM
Até quando dura a vida? Estas obras de Laura Vinci mostram o ciclo da perda das folhas pelas árvores, em esculturas de metal. O revestimento brilhante das peças refletirá a mudança de luz, conforme a primavera for se tornando verão no parque Ibirapuera; à noite, uma iluminação artificial projeta sombras sobre a parede de fundo, criando um desenho permanente que contrasta com a variação diurna. Ao brilharem dessa maneira, as folhas parecerão sobreviver a seu desprendimento do galho, como se mantivessem em suspensão o estado de decomposição anunciado por sua queda. O uso do banho de ouro transforma esse momento efêmero da vegetação numa relíquia, como se criasse uma lembrança preciosa para as gerações futuras que enfrentarão enormes desafios perante as transformações da natureza. Assim, o MAM apresenta uma nova ocasião de refletir sobre arte-ecologia durante a visita do público ao Ibirapuera, principal parque de nossa cidade.
Felipe Chaimovich Curador
Esta instalação é composta pelo registro de postes, em diversas posições, observados contra um céu neutro que os reduz a um simples traço-desenho.
A tradução do título é dobra sobre dobra, e a obra evoca a peça homônima do compositor e maestro francês Pierre Boulez, composta entre 1957 e 1962 para soprano e orquestra.
A sonoridade da peça sugeriu a Vicente de Mello uma sequência fotográfica que dialoga com o movimento de notas musicais sobre uma partitura, um grande móbile que se dobra sobre sua dobra, mudando o sentido e a ordem, uma desconstrução visual com a própria música que ressoa no ambiente do MAM, criando uma insólita e errática interpretação de modulação e ritmo, como de breves flashes marcantes sobre um filme velado.
Pli Selon Pli foi criada em 2008, na residência artística Open Projects, em Varsóvia. Sua primeira versão foi apresentada no Projeto Parede/MAM, em 2010, e, em seguida, na Cidade das Artes, em 2016, em impressão lambe-lambe. Em 2017, a proposta de desdobrou em um painel de azulejo de 65 m², comissionado pelo Sesc 24 de Maio. Esta proposição retorna ao Projeto Parede, em 2019, em uma apresentação distinta: agora as imagens dos postes se amalgamaram à textura da parede por uma fina película, destituindo a presença do papel, criando uma única superfície imagética.
Felipe Chaimovich Curador
Os livros de artista floresceram nos últimos cinquenta anos. Embora certos livros já tivessem sido impressos com a colaboração de artistas, desde o século XVIII, a busca por formatos alternativos de obra de arte incentivou o uso do livro para multiplicar exemplares de uma produção que buscava circular por fora de instituições consagradas, como museus e galerias. Assim, um número crescente de artistas passou a criar obras tecnicamente estruturadas como um livro, mas que desafiavam nossas expectativas sobre tal objeto.
Nas décadas de 1960 e 70, os livros de artista utilizaram a escrita impressa e o desenho gráfico como ferramentas para veicular obras de arte mais próximas da teoria. Tratava-se de uma estratégia para gerar reflexão no público, chamando atenção para temas políticos, como a própria indústria de comunicação de massa, da qual as gráficas que imprimem livros fazem parte.
A partir dos anos 1980, houve um interesse crescente pela materialidade do livro. Além das propriedades dos papéis, as tintas e encadernações tornaram-se matéria-prima para experiências diversas com carimbos, colagens e diversos expedientes técnicos que singularizavam a produção do livro de artista. Logo, cada peça poderia ser única, aproximando-se novamente da obra de arte original. Desde então, os artistas têm transitado entre livros mais conceituais ou mais plásticos.
O experimentalismo do livro de artista foi identificado pelas bibliotecas de arte, antes mesmo de os museus prestarem atenção a tal inovação. Foi assim que a Biblioteca do mam formou uma coleção de livros, que agora trazemos ao público. Reunimos aqui livros de artista que não foram produto de editoras comerciais, enfatizando o trabalho singular de certas tiragens. O pioneirismo da Biblioteca do mam fomentou também importantes doações, levando à constituição de uma das coleções mais relevantes de livros de artista do país.
Felipe Chaimovich Curador
Glossário
Livro: coleção de folhas em branco e/ou que portam imagens, usualmente fixadas juntas por uma das bordas e refiladas nas outras para formar uma única sucessão de folhas uniformes.
Livro de arte: livro em que a arte ou o/a artista é o assunto.
Livro de artista: livro em que um/uma artista é o/a autor/autora.
Arte do livro: arte que emprega a forma do livro.
Livro-obra: obra de arte dependente da estrutura de um livro.
Livro-objeto: objeto de arte que alude à forma de um livro.
(Classificação da Sociedade de Bibliotecas de Arte da América do Norte, de 1982, em Paulo Silveira. A página violada. Porto Alegre: Ed. da UFRGS, 2008, 2ª ed., p. 47.)
Detalhe da obra de Paulo Bruscky, 3X4 Show. Foto: Karina Bacci
Nascido em Fortaleza no dia 26 de maio de 1922, Antonio Bandeira logrou trilhar um caminho incomum no âmbito da arte brasileira. Artista independente em meio às influências locais de seu tempo – mesmo que extremamente ativo em seu ambiente social – não foi em busca dos regionalismos estilísticos e geográficos que por vezes alimentaram artistas de sua geração. Permaneceu à margem de escolas e estilos, jamais emprestando seu nome às declarações de fé estética tão em voga naquele momento.
Exigente e metódico, definido por seus pares como artista sério, lacônico e de uma “casmurrice monacal”, trabalhou diligentemente durante toda a vida, legando-nos uma produção surpreendente não só pela qualidade e sensibilidade, mas também pelo volume. Para além disso, dedicou especial atenção à sua própria persona, ao alimentar mitos e narrativas acerca de sua biografia e cultivar sua imagem, criando assim um personagem que muitas vezes suscitou tanto interesse quanto sua obra.
Traços, cores, tramas, manchas e respingos aparentemente abstratos efetivamente estampam, nas palavras do artista, “paisagens, marinhas, árvores, portos marítimos, cidades, enfim, apontamentos de viagem. Parto do realismo e, depois, vou aparando a ramaria até chegar ao ponto que minha sensibilidade exige. […] A natureza foi e será, sempre, o meu celeiro”. Esse compromisso alegre com a vida pautou sua aproximação e assimilação da linguagem internacional da arte abstrata. Como resumiria Ferreira Gullar, Bandeira “valeu-se das possibilidades da nova linguagem para expressar sua relação amorosa com a realidade que vivia e a realidade que vivera”.
A presente mostra reúne um conjunto de cerca de 70 obras – telas, guaches e aquarelas –, abarcando diferentes momentos de sua produção artística, das primeiras pinturas figurativas às grandes telas de densas tramas e gotejamentos dos últimos anos, e tem sua gênese na mostra Antonio Bandeira: um abstracionista amigo da vida, realizada no Espaço Cultural Unifor, Fortaleza, de agosto a dezembro de 2017.
Regina Teixeira de Barros e Giancarlo Hannud Curadores
Serviço: Antonio Bandeira Abertura: terça-feira, 10 de dezembro de 2019, às 20h Visitação: 11 de dezembro de 2019 a 01 de março de 2020 Local: Museu de Arte Moderna de São Paulo Endereço: Parque Ibirapuera (av. Pedro Álvares Cabral, s/nº – Portões 1 e 3) Horários: terça a domingo, das 10h às 17h30 (com permanência até as 18h) Telefone: (11) 5085-1300
Ingresso: R$ 10,00. Gratuidade aos sábados. Meia-entrada para estudantes e professores, mediante identificação.
Gratuidade para menores de 10 e maiores de 60 anos, pessoas com deficiência, sócios e alunos do MAM, funcionários das empresas parceiras e museus, membros do ICOM, AICA e ABCA com identificação, agentes ambientais, da CET, GCM, PM, Metrô e funcionários da linha amarela do Metrô, CPTM, Polícia Civil, cobradores e motoristas de ônibus, motoristas de ônibus fretados, funcionários da SPTuris, vendedores ambulantes do Parque Ibirapuera, frentistas e taxistas com identificação e até 4 acompanhantes.
Agendamento gratuito de visitas em grupo pelo tel. 5085-1313 e e-mail educativo@mam.org.br atendimento@mam.org.br
www.mam.org.br @MAMoficial
Estacionamento no local (Zona Azul: R$ 5,00 por 2h) Acesso para pessoas com deficiência Restaurante / café Ar condicionado
Antonio Bandeira, Sem título, 1957, Óleo sobre tela, 92,0 x 92,0 cm, Coleção Orandi Momesso, São Paulo. IAB-1112 / apoio Instituto Antonio Bandeira
Fernando Lemos emigrou de Portugal para o Brasil em 1953, fixando-se em São Paulo. Ao chegar, já era fotógrafo e ilustrador gráfico. Assim, passou a colaborar com o jornal O Estado de São Paulo, produzindo imagens que acompanhavam peças literárias.
Reunimos aqui desenhos originais do artista que ilustraram poemas e contos impressos naquele jornal, na década de 1950. Em cada peça, há menção às obras literárias e a seus autores. Os traços geométricos utilizados eram sinal de modernidade, pois a arte abstrata acabara de chegar ao Brasil, e o MAM foi uma das instituições responsáveis por sua promoção. Assim, é possível revisitar um período de nossa cultura em que as artes gráficas e a literatura mantiveram uma relação criativa e potente.
Felipe Chaimovich Curador
A imagem da seca é compreendida como parte da identidade da região Nordeste do Brasil, algo que supostamente não diz respeito apenas ao clima, e que cria narrativas, imaginários coletivos, políticas públicas e grandes obras. Esta representação está diretamente ligada, por exemplo, à criação de programas, campanhas e instituições como o DNOCS (Departamento Nacional de Obras Contra as Secas).
Açudes, canais, represas, barreiras, paredes são consequência de parte destas narrativas da seca e produzem uma alteração na paisagem natural. Sua justificativa geralmente se dá pela diminuição das desigualdades, embora muitas vezes ampliem a noção de injustiça.
Como compreender que alguém não possa ter acesso à água de um canal construído com o discurso de levar água para esse alguém? Ao mesmo tempo, como podemos intervir e pensar uma política hídrica sustentável considerando a concentração de pessoas em grandes cidades?
*Como parte deste trabalho será publicado na Wikipédia o verbete “injustiça hídrica” durante o período da exposição.
Vitor Cesar e Enrico Rocha Artistas
Sertão é palavra de origem desconhecida. Na língua portuguesa, há registros de sua existência desde o século XV. Quando aqui aportaram, os colonizadores já trouxeram consigo o termo, usando-o para designar o território vasto e interior, que não podia ser percebido da costa. Desde então, a esse vocábulo atribuem-se diversos sentidos, sem nunca ser fixado numa ideia pacificada. É constituído, inclusive, por oposições: pode referir-se à floresta e ao descampado, ao lugar deserto e também ao povoado, àquilo que é próximo e ermo. Qualifica o visível e o desconhecido, trata da aridez e da fertilidade, do inculto e do cultivado.
Ainda que tenha chegado ao Brasil na caravela, sertão não cessa de se insurgir contra o colonialismo e de escapar de seus desígnios. Mantém sua potência de invenção, não se rende aos monopólios dos saberes patriarcais, exige novos pactos sociais, desierarquiza sua relação com a natureza, reverencia o mistério, festeja. Sertão é, antes e depois de tudo, experimentação e resistência, qualidades fundamentais para viver a arte e que nos trazem a este 36º Panorama da Arte Brasileira.
No Brasil que pleiteava sua modernização, no início do século XX, sertão passou a referir-se, sobretudo, à região do Nordeste de clima semiárido, ilustrada por sua vegetação de caatinga, em oposição ao litoral. Nesse momento, reforça-se o projeto de um lugar seco, primitivo, rude, propagandeando um outro na iminência do flagelo. Forja-se, dessa maneira, uma condição de submissão que justificaria políticas assistencialistas, mas sobretudo a atualização de medidas de exploração. Suas imagens estão presentes por toda a cultura brasileira, ainda que nenhuma delas dê conta de tudo o que pode significar.
Contrariando determinismos, e sob a luz de uma certa produção de arte do Brasil, Sertão é modo de pensar e de agir. Termo evocativo, traz consigo afetos transformadores, formas políticas, ideais de criação, memórias de luta, rituais de cura, ficções de futuro. Esta arte-sertão que aqui se apresenta está no deslizar das linguagens. Mais que um lugar, essa condição sertão é a travessia. Espalha-se Brasil afora, está no manejo do roçado, supera-se na viela da favela, desce pelo leito do rio, está escrita nos muros da cidade e presente na terra retomada. Manifesta-se nos encontros e nos conflitos.
No 36º Panorama da Arte Brasileira, 29 artistas e coletivos reúnem-se para compartilhar estratégias de resistência e modelos de experimentação, a partir de suas histórias. Se sertão está no limite do que se pode apreender, por definição, a ideia de panorama é complementar na forma de sua contradição. A importância de juntar essas instâncias e acolher essas oposições, no entanto, se dá pela necessidade cada dia mais atual de defender existências não hegemônicas e de compartilhar outros modos de vida. Enquanto a arte puder afirmar sua condição sertão, vai ter sempre luta, vai haver sempre a diferença, vai existir sempre o novo.
Júlia Rebouças Curadora
50 anos de Panorama
O Panorama da Arte Brasileira teve sua primeira edição em 1969 e foi idealizado como forma de o museu recompor seu acervo e voltar a participar ativamente do circuito artístico contemporâneo. A princípio evento anual, o Panorama passou a ser realizado a cada dois anos a partir de 1995, contando até o momento 35 edições.
Parcerias
O 36º Panorama da Arte Brasileira: Sertão procurou ampliar seu tempo e espaço de atuação por meio de parcerias estratégicas: com a Festa Literária Internacional de Paraty, serão promovidas duas mesas de debate convidando um participante da Flip e um participante do Panorama, com a mediação de Júlia Rebouças e Fernanda Diamant, curadora da 17ª edição da Flip; com o Auditório Ibirapuera, vizinho do museu, foi organizada uma programação musical a partir dos conceitos trabalhados no Panorama para o dia 18/08, dia seguinte à abertura no MAM; e, com a Sociedade Brasileira de Psicanálise de São Paulo, novos debates acontecerão em setembro e outubro, promovendo o encontro entre artistas, psicanalistas e o público.
Irmãos Campana na loja mam
O estúdio Campana, dos irmãos Fernando e Humberto Campana, que celebra em 2019 seus 35 anos de trabalho, ficará a cargo da curadoria da loja mam durante o período do Panorama, com o patrocínio do Iguatemi São Paulo. O trabalho dos Campana incorpora a ideia da transformação, reinvenção e integração entre o artesanato e a produção em massa, oferecendo um design com identidade própria, mixando a individualidade dos materiais à preciosidade das características comuns no cotidiano brasileiro, como as cores, as misturas, o caos criativo. A partir do olhar único dos irmãos Campana, que contam com um extenso trabalho de pesquisa da cultura vernacular nordestina presente em suas coleções, os visitantes poderão vivenciar um novo espaço da loja mam e encontrar peças cuidadosamente selecionadas que trabalham com o conceito expandido de sertão.
AMA: levando água potável ao semiárido brasileiro
Colocar o sertão em foco possibilitou que o 36º Panorama da Arte Brasileira firmasse parcerias com propósitos que vão muito além do simples apoio financeiro. Um dos patrocinadores, a Água AMA, água mineral da Cervejaria Ambev, tem 100% de seu lucro revertido para projetos de acesso à água potável no semiárido brasileiro. A mostra é uma oportunidade para que o público conheça um produto que, aos poucos, está ajudando a transformar a realidade de muitos brasileiros vivendo no semiárido – clima presente em regiões comumente associadas ao tradicional imaginário de sertão. Já são mais de 26 mil pessoas beneficiadas pelos projetos que AMA financia, em todos os nove estados que compõem o semiárido no Brasil. Este ano, a marca atingiu R$ 4 milhões de lucro, recurso integralmente revertido para iniciativas de acesso à água potável. Iniciativas como o patrocínio ao Panorama da Arte Brasileira permitirão um crescimento ainda maior desses números.
Apoio ao Panorama e ao público de fora de São Paulo
A agência de viagens Flytour, além de ter se tornado agência apoiadora do Panorama, habilitou para o MAM um portal em que os interessados em adquirir passagens e pacotes de hospedagem para viajar a São Paulo e conferir pessoalmente o 36º Panorama da Arte Brasileira: Sertão contarão com descontos especiais.
Esta obra da artista Lenora de Barros pertence à coleção do Museu de Arte Moderna de São Paulo. Ela mostra diferentes autorretratos da autora, com penteados variados e uma cara de foto de documento. O resultado se assemelha aos anúncios de pessoas desaparecidas, tão comuns nas estações de metrô e demais transportes públicos.
Mas, ao invés de estar em busca de outra pessoa, Lenora procura a si mesma. Em meio à multidão, nos esquecemos de nós, sobretudo no fluxo diário do ir e vir. A artista nos convida a lembrarmos que mudamos o tempo todo e às vezes nem percebemos: conhece-te a ti mesmo ou a ti mesma.
Felipe Chaimovich Curador
Confira aqui as obras da artista Lenora de Barros que fazem parte da coleção do MAM.
Lenora de Barros, Procuro-me, 2002. Impressão offset sobre papel. 28,5 x 24,5 cm. Coleção MAM, doação Milú Villela
Reunimos aqui obras da coleção do Museu de Arte Moderna de São Paulo para mostrar alguns caminhos da experiência de se pintar com densas camadas de tinta, no Brasil, a partir dos anos 1930. O MAM foi fundado em 1948 e tem acompanhado essa história desde então.
A pintura é feita de tinta, e sua história tem sido modificada pelo acesso inédito à matéria-prima nos últimos dois séculos. É a partir da Revolução Industrial, iniciada na Europa, que o preço da tinta diminui consideravelmente. Desde então, pintar se tornou mais barato para artistas que usassem produtos industrializados.
No Brasil e no mundo, pintores começaram a experimentar o uso de camadas grossas de tinta industrializada como sinal de modernidade. As pinceladas poderiam ser grandes manchas de cor, usadas para figurar desde as coisas mais passageiras, como uma paisagem iluminada pelo pôr-do-sol, até as mais universais, como a guerra. As tintas também podiam ser trabalhadas como pura matéria, sem formar imagem alguma.
O conjunto de pinturas aqui reunidas mostra a pluralidade de obras representadas na coleção do MAM. O crescente acesso a matérias industriais, como as tintas, continua a possibilitar a livre experimentação artística.
Felipe Chaimovich Curador
Detalhe da obra de Rodrigo Andrade, Sem título, 1985
O que é o bom gosto? Neste painel, Leda Catunda reúne diversos materiais e imagens associados ao aprazível: paisagens sinuosas, curvas ondulantes, gatinhos, tecidos estampados, cores intensas. Tais elementos são aproximados do público pelo fazer brejeiro da artista, pois o traço dos desenhos parece infantil e espontâneo, assim como os recortes que delimitam as várias peças. A estratégia para aproximar o público da obra passa pelo reconhecimento dos diversos aspectos familiares nela contidos. Porém, sua presença num museu traz um problema: por que ela é considerada arte, enquanto um desenho amador bonito não seria? Ao conseguir despertar essa reflexão no público, a artista questiona os parâmetros de gosto, de arte, de banalidade e de erudição: mexendo assim com nossos valores presentes, a paisagem se torna moderna.
Felipe Chaimovich Curador
Leda Catunda (São Paulo, SP, 1961) Paisagem moderna, 2019 Colagem de papel e de tecidos e pintura-objeto Coleção da artista
A busca por uma proposição que pudesse ampliar os olhares sobre o conjunto de obras que constituem o acervo do MAM possibilitou focar na produção da década de 1960, período marcado por convulsões políticas e sociais que transformaram nosso país em um antropofágico caldeirão cultural, varrendo a terra brasilis sem deixar escapar qualquer rincão, sertão ou veredas.
Propor uma crônica daquele momento, estabelecendo um diálogo com o presente, foi o caminho escolhido para esta mostra, não de forma oportunisticamente comemorativa, muito menos laudatória, mas sim na busca por captar o espírito da época na coleção do MAM, o que acabou por contaminar-se do presente, no passado.
Uma geração inteira, unida por ideais e comportamentos, consciente de seu papel e de seu compromisso clama por liberdade, liberdade! Tudo está sob contestação, mas, acima de tudo, a autoridade: “É proibido proibir!” Esse, como outros slogans, se torna palavra de ordem, lema, grito de guerra, senha para abrir fogo contra a trincheira autoritária familiar, escolar, governamental, e atinge diretamente o sistema capitalista de consumo desenfreado.
Ao debruçar-me sobre as obras, literalmente entrando nas entranhas do Museu – as reservas técnicas –, minha ação de curador foi impregnada da perspectiva pessoal, na qual afloraram as lembranças, envoltas na névoa das reminiscências do garoto que viveu no seu cotidiano aqueles momentos.
Retomar as construções da memória nos proporciona a oportunidade de inserir, nesse complexo contexto, a reestruturação do MAM que, em 1969, teve sua nova sede inaugurada aqui, no antigo pavilhão Bahia, na marquise do Ibirapuera, com a primeira edição do Panorama da Arte Atual Brasileira e, assim, o Museu, sua coleção, projetos, ações e atividades resistem aos tempos e sobrevivem aos contratempos até os dias de hoje. Afinal, quem sabe faz a hora e não espera acontecer.
Um conjunto de cinquenta imagens evoca um momento de febril desassossego e que conduz a caminhos na busca por fazer valer a esperança na conscientização política, na diversidade da vida traduzida em ações poéticas e de comprometimentos éticos, produzindo inserções em um meio, mesmo que ele se apresente totalmente adverso. Resistência, resiliência, rebeldia e solidariedade atravessam, de mãos dadas, os tempos em que vivemos em perigo.
Marcos Moraes Curador
Marcello Nitsche, Eu quero você, 1966. Foto: Romulo Fialdini
Reunimos aqui uma seleção das máscaras produzidas para os três Bailes de Máscaras do MAM, realizados entre 2000 e 2002 por iniciativa do Núcleo Contemporâneo, em benefício do museu. Os artistas convidados a criá-las colaboraram com o MAM ao conceberem adereços que transformavam os mascarados em obras de arte vivas.
A promoção da arte moderna em São Paulo por meio de festas à fantasia começou na década de 1930. Em 32, fundou-se a Sociedade Pró-Arte Moderna, ou SPAM, que promoveu bailes de carnaval nos dois anos seguintes. Para tal, colaboraram artistas como Anita Malfatti, John Graz, Lasar Segall e Rossi Osir.
Aproveitamos o período em torno do carnaval deste ano para continuar a celebração dos setenta anos do MAM recordando que a manutenção da arte experimental também pode ser feita com festejos criativos e extravasamento de fantasias.
Felipe Chaimovich Curador
O Museu de Arte Moderna de São Paulo celebra os seus setenta anos com uma exposição que destaca os valores fundamentais da instituição. Desde o início, o MAM buscou formar uma coleção por meio de mostras prospectivas, desenvolver uma prática pedagógica, expandir o campo da fotografia como arte e antecipar os rumos das tendências artísticas futuras. Agora, revisitamos esses quatro princípios para olharmos adiante, a partir de uma história já consolidada no Brasil e no exterior.
A trajetória do MAM evidencia também a fertilidade de suas bases, que deram origem a instituições como o Museu de Arte Contemporânea da Universidade de São Paulo. Fundado em 1963, o MAC USP recebeu a coleção formada no MAM e manteve os seus valores seminais. Assim, unimos ambos os museus nesta exposição comemorativa, indicando uma irmandade entre as instituições e o compartilhamento de uma mesma origem.
A mostra está organizada em duas partes. Na Sala Paulo Figueiredo estão obras colecionadas durante o período inicial do MAM, entre 1949 e 1963. Na Grande Sala, encontram-se obras das coleções do MAM e do MAC USP adquiridas após essa data. Conectando ambas as salas, uma linha do tempo circunstancia essa história.
Em cada uma das salas, os mesmos quatro valores norteiam os núcleos expositivos:
1- Formação de coleção a partir de mostras prospectivas A Sala Paulo Figueiredo mostra obras adquiridas por ocasião das Bienais de São Paulo, evento criado pelo MAM em 1951; na Grande Sala estão dispostas obras provenientes dos Panoramas da Arte Brasileira do MAM e, da parte do MAC USP, obras provenientes da Jovem Gravura Nacional, do Jovem Desenho Nacional, da Jovem Arte Contemporânea e de programas recentes de aquisição.
2- Missão pedagógica Na Sala Paulo Figueiredo são exibidas reproduções coloridas utilizadas em mostras didáticas realizadas na Biblioteca Municipal de São Paulo em colaboração com o MAM, entre o final dos anos 1940 e a década de 1950; na fachada do MAM está exposta a obra O museu é uma escola, de Luis Camnitzer, adquirida por ocasião da mostra comemorativa dos vinte anos do setor educativo do museu, em 2016.
3- Expansão da fotografia como arte A Sala Paulo Figueiredo traz registros da exposição de Thomaz Farkas, de 1949, a primeira dedicada à fotografia moderna num museu brasileiro, enquanto na Sala Milú Villela estão reunidas obras fotográficas de ambos os museus, com destaque para o Clube de Colecionadores de Fotografia do MAM.
4- Desafio do contemporâneo A Sala Paulo Figueiredo apresenta obras que participaram da mostra inaugural do MAM, Do figurativismo ao abstracionismo, que propunha um diagnóstico do desenvolvimento da arte moderna rumo à abstração; na Sala Milú Villela estão obras das exposições Multimedia, realizadas pelo MAC USP em 1976, que tiveram um papel pioneiro no acolhimento de produções experimentais em museus brasileiros, seguidas por obras da mostra Ecológica, realizada pelo MAM em 2010, que explicita a linha que o museu vem desenvolvendo nos últimos dez anos para enfrentar os desafios da relação entre arte e ecologia, pois entendemos ser essa uma área de fronteira que traz desafios mundiais urgentes para a cultura contemporânea.
E que venham os próximos setenta!
Ana Magalhães (MAC USP) Felipe Chaimovich (MAM) Helouise Costa (MAC USP) Curadores
Esta é uma mostra de arte contemporânea feita por artistas brasileiros. Mas, se a internacionalização da arte tem dissolvido as diferenças regionais, como distinguir a produção contemporânea brasileira daquela de outras partes do mundo?
Como se sabe, a noção de “brasilidade” não pode ser definida apenas a partir de uma essência homogênea ligada à geografia. O que aproxima certos artistas de uma tradição brasileira, além de um campo simbólico com o qual dialogam, são referências recorrentes a experiências compartilhadas, momentos históricos, normas sociais e transgressões. Ainda assim, os artistas frequentemente se confrontam e se envolvem com histórias da arte de diferentes regiões do globo. O título Passado/Futuro/Presente refere-se a relações entre o passado e o futuro, feitas por trabalhos de arte enraizados num presente caracterizado pela diversidade sem precedentes e pelo constante intercâmbio de ideias em escala internacional.
Incluindo pintura, escultura, instalação, fotografia, vídeo e performance, esta exposição apresenta um olhar sobre a prática de artistas reconhecidos como pioneiros da sua geração. A mostra traz trabalhos de artistas seminais, bem como várias âncoras históricas da década de 1970 que ilustram continuidades e rupturas conceituais entre passado e presente. Cinco núcleos estruturam a exposição com limites porosos, permitindo aos visitantes traçar seus próprios caminhos.
Fruto de uma colaboração entre o Phoenix Art Museum (Arizona, EUA) e o Museu de Arte Moderna de São Paulo, uma outra versão desta exposição foi exibida em Phoenix, em 2017. Foi a primeira exposição panorâmica de arte contemporânea brasileira no sudoeste americano, assim como a primeira mostra do acervo do Museu de Arte Moderna de São Paulo nos Estados Unidos. Por apresentar uma das mais importantes coleções de arte brasileira do mundo, esta exposição pretende contribuir para a continuidade do debate sobre o que é e pode ser a arte brasileira, a partir do acervo do MAM.
Vanessa K. Davidson Cauê Alves Curadores
Esta mostra apresenta uma seleção das obras adquiridas pelo Museu de Arte Moderna de São Paulo nos últimos cinco anos. As aquisições foram feitas por meio de doações de particulares, várias das quais mediadas pelo programa de associados do museu chamado Núcleo Contemporâneo. Assim, iniciamos 2019 agradecendo aos colaboradores do MAM, ao trazer ao público parte dos resultados dessa colaboração.
As obras aqui reunidas indicam linhas de força da coleção do MAM. A relação histórica do museu com a abstração geométrica no Brasil está representada pelo desenho de Lothar Charoux, de 1958, a peça mais antiga da mostra. A posterior politização do rigor geométrico durante a década de 1960 evidencia-se no projeto de livro de artista de Julio Plaza, pois o público é convidado a abandonar a posição de espectador passivo de uma ordem única para virar livremente as páginas coloridas. Por outro lado, o uso mais lírico da geometria também subsiste até os anos 1980, como testemunha a tapeçaria de Jacques Douchez.
Além de pensar a própria história, o museu deve também refletir sobre os mitos do país. Nossa capital, Brasília, é a mais monumental obra do desenho geométrico abstrato aplicado à arquitetura e ao urbanismo, aparecendo como cenário do velório de Oscar Niemeyer, na foto de Mauro Restiffe: a utopia do empreendimento mítico que iria mudar o Brasil e a finitude de Brasília encontram-se num momento único. Outra invenção do imaginário brasileiro aparece nas palavras de Gilberto Freyre, criador do mito da democracia racial brasileira: Jonathas de Andrade organiza geometricamente as expressões de Freyre, entre fotos estereotipadas da preguiça do trabalhador negro. Mas o encontro positivo entre a geometria abstrata e a materialidade simbólica da mitologia afro-brasileira afirma-se na obra de Mestre Didi.
A relação entre geometria e poder continua pelo núcleo de poetas visuais dos anos 1970: Almandrade e Ridyas. Num mundo cada vez mais interligado pela indústria da comunicação de massa, ambos buscam frestas de liberdade entre linhas e colunas.
A paisagem é também um aspecto relevante da coleção. Estando no parque Ibirapuera, o MAM relaciona-se de modo privilegiado com o paisagismo moderno. Nas paisagens aqui reunidas, a racionalidade característica da geometria manifesta-se, seja em formas que se repetem, como nas fotos de Marcelo Moscheta, seja por meio da escolha ponderada dos materiais de pintura, como no quadro de Rodrigo Andrade, seja na composição de quadriláteros que se reforçam, como no céu de Sandra Cinto.
Por outro lado, a coleção inclui obras que se opõem à racionalidade. O quadro de avaf usa os elementos da geometria e a sobriedade do vermelho com preto para chegar a uma construção anárquica. O painel de Laura Lima registra a destruição da malha geométrica, pois é desfiado aleatoriamente e amarrado grosseiramente à própria estrutura. A composição de imagens de João Castilho mobiliza retângulos predominantemente azuis para criar uma narrativa fragmentada. A cidade de Montez Magno usa a aleatoriedade dos dados para desafiar o planejamento urbano. A foto de Erika Verzutti e Luiz Roque cria um desconcertante jogo de cheios e vazios, no qual sombras tomam o lugar de pessoas e uma enorme jaca ocupa o lugar do intervalo que as separa. A série O jardim, de Pedro David, mostra um mundo árido, onde os vestígios de queimadas e de construções inúteis sobrevivem aos esforços de dominação humana.
O engajamento artístico na história política do Brasil, por sua vez, é representado pelo quadro Luta, de José Roberto Aguilar, feito em 1967, e pela série de fotos do coletivo 3NÓS3 intitulada Ensacamento, registrando ações de cobrir estátuas públicas com sacos que simulam a tortura, realizadas em 1979.
Felipe Chaimovich Curador
Detalhe da obra de Mauro Restiffe, Oscar#20b, 2012, que integra a mostra.
O Museu de Arte Moderna de São Paulo celebra os seus setenta anos com uma exposição que destaca os valores fundamentais da instituição. Desde o início, o MAM buscou formar uma coleção por meio de mostras prospectivas, desenvolver uma prática pedagógica, expandir o campo da fotografia como arte e antecipar os rumos das tendências artísticas futuras. Agora, revisitamos esses quatro princípios para olharmos adiante, a partir de uma história já consolidada no Brasil e no exterior.
A trajetória do MAM evidencia também a fertilidade de suas bases, que deram origem a instituições como o Museu de Arte Contemporânea da Universidade de São Paulo. Fundado em 1963, o MAC USP recebeu a coleção formada no MAM e manteve os seus valores seminais. Assim, unimos ambos os museus nesta exposição comemorativa, indicando uma irmandade entre as instituições e o compartilhamento de uma mesma origem.
A mostra está organizada em duas partes. Na Sala Paulo Figueiredo estão obras colecionadas durante o período inicial do MAM, entre 1949 e 1963. Na Grande Sala, encontram-se obras das coleções do MAM e do MAC USP adquiridas após essa data. Conectando ambas as salas, uma linha do tempo circunstancia essa história.
Em cada uma das salas, os mesmos quatro valores norteiam os núcleos expositivos:
1- Formação de coleção a partir de mostras prospectivas A Sala Paulo Figueiredo mostra obras adquiridas por ocasião das Bienais de São Paulo, evento criado pelo MAM em 1951; na Grande Sala estão dispostas obras provenientes dos Panoramas da Arte Brasileira do MAM e, da parte do MAC USP, obras provenientes da Jovem Gravura Nacional, do Jovem Desenho Nacional, da Jovem Arte Contemporânea e de programas recentes de aquisição.
2- Missão pedagógica Na Sala Paulo Figueiredo são exibidas reproduções coloridas utilizadas em mostras didáticas realizadas na Biblioteca Municipal de São Paulo em colaboração com o MAM, entre o final dos anos 1940 e a década de 1950; na fachada do MAM está exposta a obra O museu é uma escola, de Luis Camnitzer, adquirida por ocasião da mostra comemorativa dos vinte anos do setor educativo do museu, em 2016.
3- Expansão da fotografia como arte A Sala Paulo Figueiredo traz registros da exposição de Thomaz Farkas, de 1949, a primeira dedicada à fotografia moderna num museu brasileiro, enquanto na Sala Milú Villela estão reunidas obras fotográficas de ambos os museus, com destaque para o Clube de Colecionadores de Fotografia do MAM.
4- Desafio do contemporâneo A Sala Paulo Figueiredo apresenta obras que participaram da mostra inaugural do MAM, Do figurativismo ao abstracionismo, que propunha um diagnóstico do desenvolvimento da arte moderna rumo à abstração; na Sala Milú Villela estão obras das exposições Multimedia, realizadas pelo MAC USP em 1976, que tiveram um papel pioneiro no acolhimento de produções experimentais em museus brasileiros, seguidas por obras da mostra Ecológica, realizada pelo MAM em 2010, que explicita a linha que o museu vem desenvolvendo nos últimos dez anos para enfrentar os desafios da relação entre arte e ecologia, pois entendemos ser essa uma área de fronteira que traz desafios mundiais urgentes para a cultura contemporânea.
E que venham os próximos setenta!
Ana Magalhães (MAC USP) Felipe Chaimovich (MAM) Helouise Costa (MAC USP) Curadores
museu de arte moderna de são paulo
A sede do MAM está temporariamente fechada em virtude da reforma da marquise do Parque Ibirapuera.
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